Tom Carlos
Da mesma forma que a fita cassete, o videocassete e o DVD regravável provocaram profunda mudança no comportamento humano, incentivando colecionismos, tentativas de apreender o máximo de informação (mesmo que não a utilize), a chegada das impressoras 3D tende a mudar a consciência das pessoas – além do próprio comportamento.
A prova disso é o que ocorre agora com a divulgação das impressoras moderníssimas. Existe um movimento otimista de que elas serão a solução para inúmeras dificuldades humanas – como a falta de acesso a objetos e produtos.
Mesmo sem resolvermos as dificuldades inerentes às próprias impressoras tradicionais, que não duram nem três meses de uso a um custo altíssimo para a recarga das tintas, elas começam a encantar a todos.
As impressoras de 3D podem fazer praticamente qualquer objeto: casas, armas, instrumentos musicais, roupas, brinquedos, etc. Na China, a companhia WinSun já é reconhecida no mercado na construção de casas com peças impressas em 3D.
Um exemplo: a impressora 3D montada pelo Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos, já foi usada para construir um drone e peças robóticas. E até mesmo outra impressora 3D.
Mas não é apenas a USP a usar a impressora. A impressão tridimensional também chama a atenção dos estudantes da Universidade Federal de Goiás (UFG). Doada à Escola de Engenharia Elétrica, Mecânica e de Computação (EMC/UFG) por ex-alunos do curso de Engenharia de Computação, a peça pode ajudar na modelagem 3D. Em síntese, consegue dar forma a imagens que estavam apenas no papel ou no computador.
Os veículos aéreos não tripulados (drones) também podem sair da impressora, que chega a custar R$ 30 mil, dependendo do modelo. Braços robóticos e sensores de sinais biológicos também são algumas das possibilidades já testadas em Goiás.
Apesar da complexidade do produto, e do custo quando retirado de uma loja ou importado, estudantes de robótica da Organização Não Governamental (ONG) Programando o Futuro, que desenvolve projetos sociais em Valparaíso de Goiás, criaram uma impressora 3D por meio de lixo.
A usina que recicla eletrônicos gastou R$ 500 para construir o primeiro equipamento no começo desde ano. Os jovens de Valparaíso já colocaram em prática a impressora, o que demonstra que aos poucos ela começa a chegar em ambientes mais distantes das academias e universidades.
USP
Ao adquirir a impressora, o objetivo inicial do ICMC, em São Paulo, era construir peças para montagem de robôs. “Primeiramente, buscamos atender às nossas necessidades e dar oportunidade para os estudantes aprenderem. Hoje, temos a liberdade de montar a peça que quisermos sem ter que encomendá-las a outros laboratórios”, conta a coordenadora do Laboratório de Aprendizado de Robôs (LAR) do Instituto, Roseli Romero. Algumas das peças produzidas pela impressora foram usadas na Competição Latino-americana de Robótica (Larc) 2014.
Os pesquisadores afirmam que o drone já voa de forma autônoma, possui uma câmera acoplada e chega a atingir 200 metros de altura e sua bateria dura, em média, 30 minutos. O doutorando disse que é possível incorporar novos atributos ao aparelho. “Diversos sensores podem ser acoplados e o quadrirrotor pode ser utilizado em diversas aplicações”.
A variedade de aplicações oferecidas pela impressora deu margem para o desenvolvimento de peças que podem ser usadas em outros objetos. Um quadrirrotor, ou drone, foi construído através da impressão das partes de sua estrutura. Quem desenvolveu o projeto foi o aluno de doutorado do ICMC Eduardo Fraccaroli, orientado pela professora Roseli: “Tentei utilizar um projeto open source disponível na internet, mas não atendeu todas as nossas necessidades. Então, tive que iniciar o processo de criação do zero e desenhar todo o quadrirrotor. Hoje, ele está 100% funcional”, explica o estudante.
Embrapa pretende usar quadrirrotor nas plantações de laranja
Por meio de uma parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), estuda-se o emprego do quadrirrotor na agricultura. Roseli explica que a ideia é usá-lo para a captura de imagens das plantações de laranja, a fim de identificar, de forma precoce, a clorose variegada dos citros (CVC), doença popularmente conhecida como amarelinho, uma das pragas que mais afetam a cultura dos citros. “Com o quadrirrotor, vamos conseguir chegar mais perto das plantas e trabalhar na prevenção da doença”, diz a professora.
Outra aplicação do equipamento que já está sendo estudada é sua utilização para fazer tracking de veículos. Roseli explica que, nesse caso, o drone pode ser empregado para monitorar e encontrar veículos, como, por exemplo, em situações de perseguição policial, quando as autoridades precisam alcançar um carro em fuga.
Além disso, um desafio que também tem mobilizado os pesquisadores é a popularização do uso de impressoras 3D. “A meta é fazer com que a impressora 3D possa quebrar o paradigma atual do mercado, a partir dela todos terão a possibilidade de criar objetos personalizados”, conclui Fraccaroli. Nesse sentido, outro campo de pesquisa é o desenvolvimento de software livre para impressoras 3D, em conjunto com pesquisadores do Núcleo de Apoio à Pesquisa em Software Livre (NAPSol), sediado no ICMC.
Apesar da velocidade de impressão de uma impressora 3D ser considerada baixa (em média 30 minutos para imprimir uma peça comum), o mercado já está incorporando seu uso em algumas áreas. Indústrias fabricantes de automóveis, por exemplo, usam a impressão 3D para produzir peças para os veículos, com isso, as empresas que desenvolvem essas impressoras estão começando a lucrar.
Sustentabilidade
A impressora 3D do ICMC também já construiu outra impressora do gênero. Para a impressão, as máquinas fazem uso de diversas matérias-primas, tais como ABS, Nylon e borracha. Porém, a sobra de material utilizado após as impressões ainda é um problema. Esse cenário levou os pesquisadores a buscarem alternativas mais sustentáveis, como a utilização do plástico produzido com ácido polilático (PLA), que é 100% biodegradável.
“Nossa ideia é reduzir as sobras. Hoje, não consigo reutilizar 100% do material empregado, tenho que adicionar uma porcentagem de material virgem. Por isso, estamos pesquisando novas possibilidades e a meta é encontrar matérias-primas baseadas em fontes renováveis e que sejam biodegradáveis”, relata o estudante.
As pesquisas realizadas no LAR são financiadas pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ). “Agradecemos a essas agências de fomento que nos ajudam a comprar o material necessário e concedem bolsas aos nossos alunos”, diz Roseli. Ela adianta que, em breve, submeterá um projeto à Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) para a aquisição de uma impressora 3D que imprime usando metal. A proposta será realizada em conjunto pelo ICMC e pela Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), via Pró-Reitoria de Pesquisa da USP. (Agência USP).