Beto Silva,Da editoria de Cidades
Dois dos mais determinados promotores de Justiça de Goiás, acostumados a investigarem improbidade administrativa, instauraram inquérito civil público com o objetivo de apurar a legalidade da decisão do governo de Goiás em quitar a folha de pagamento dos servidores públicos de modo parcelado.
A atitude inédita do governo de Goiás chamou atenção de Fernando Krebs e Villis Marra, que atuam na defesa do patrimônio público.
Eles não são os primeiros a notarem o comportamento financeiro do governo. Ontem, em reportagem publicada no Diário da Manhã, o desembargador Carlos Alberto França, do Tribunal de Justiça, disse que é preocupante a realidade econômico-financeira do Estado. Para ele, os atuais gestores, antes de tomarem posse pela quarta vez, em janeiro, alardearam situação de equilíbrio financeiro do Estado. Daí a confusão: o Estado teria condições ou não de pagar corretamente os servidores daqui para frente?
A portaria, que institui o inquérito civil, já traz em seu conteúdo a informação de que a estratégia de parcelamento foi utilizada por outros dois Estados, mas todos foram considerados ilegais.
Os servidores públicos alegam que nem mesmo o governo federal, que enfrenta rombo orçamentário, sofre com tamanha dificuldade para pagar servidores. “Ainda mais tendo a informação de que o governo de Goiás demitiu 3 mil funcionários em janeiro”, diz um dos servidores do TJ-GO.
A estratégia dos gestores goianos pode não ter vida longa. O Poder Judiciário do Distrito Federal e Rio Grande do Sul tratou o parcelamento como inconstitucional. No caso de Goiás, a situação é ainda mais diferente. Em Brasília, o governo já tem enfrentado problemas com outras normas consideradas ilegais, caso a que estabelece o Simve – e que foi cassada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
ATRASO
Promotores e Poder Judiciário temem uma situação ainda pior: o atraso dos salários após o dia 10, como já ocorreu com a gestão do ex-governador Alcides Rodrigues. Neste caso de atraso, existe vedação expressa na Constituição Estadual. Segundo observam os promotores na portaria de abertura da investigação, o artigo 96 da Constituição do Estado determina que o pagamento da folha de pessoal seja realizado até o dia 10 do mês subsequente.
Krebs e Villis notam, entretanto, que a lei não autoriza adiamento ou parcelamento: “presumindo-se, pois, que o pagamento deve ser feito em parcela única”.
Os promotores apontam ainda que, conforme entrevistas dos gestores goianos, Goiás teve aumento significativo na arrecadação de tributos neste ano: “Assim, em tese, não haveria substrato fático para sacrificar os servidores públicos com o parcelamento de suas remunerações e proventos”.
Para os promotores, desde 1999 o atual gestor têm realizado o pagamento da folha de pessoal no último dia útil do mês trabalhado. Eles afirmam ainda que Marconi Perillo manteve este “compromisso na campanha eleitoral de 2014”.
Conforme os investigadores, “criou-se o costume de os servidores públicos receberem no último dia útil do mês, razão pela qual essa prática não poderia ser alterada sem justificativa razoável”.
Os dois promotores requerem que o governo de Goiás, com urgência, repasse informações, como a cópia do ato formal que determinou o parcelamento da folha de pessoal do Estado e informações pormenorizadas, de 2011 até hoje, sobre a arrecadação de tributos, evolução da folha de pagamento, crescimento ou diminuição da dívida pública, quantidade de Termos de Acordo de Regime Especial (Tare) firmados no período e os valores envolvidos, bem como outros dados que forem considerados relevantes.
INDICATIVO
Na decisão em pedido liminar dos servidores do Poder Judiciário, o magistrado Carlos Alberto França disse que é ainda momento para o governo se explicar. “Não obstante a diferença entre o que se falava antes e o que se propaga agora sobre as finanças do Estado de Goiás e, compreendendo a preocupação e pretensão do sindicato impetrante, não vejo presentes os requisitos exigidos para concessão da liminar postulada”, observou. O magistrado, entretanto, alertou: “O pagamento do vencimento mensal do funcionalismo estadual no último dia do mês laborado já fazia parte do planejamento econômico-financeiro de todos e a abrupta modificação desta prática causa inegáveis dissabores aos servidores e seus familiares”.