- Um reduto plural. Para Heteros, LGBTs, assexuados. Temperados com bebidas, rock´roll, punk, MPB, a velha Música Popular Brasileira
- Liberté é uma referência à liberdade, expõe o diretor artístico do casarão histórico da vanguarda estética de Goiânia, Heitor Vilela, jornalista
- Mix’ de ateliê Rabiscos e Escarros, Escultura Produções Editorias, Site Metamorfose, barbearia Mulher Barbada e Aurora Estúdio de tatuagem
U m ‘mix’ de ateliê Rabiscos e Escarros, Escultura Produções Editorias, Site Metamorfose, barbearia Mulher Barbada e Aurora Estúdio de tatuagem. Temperados com bebidas, rock´roll, punk, MPB. Um reduto plural. Para Héteros, LGBTs, assexuados. Assim é a Casa Liberté. Sob a gerência de Heitor Vilela.
Nada mais, nada menos do que o sobrinho rouge de Paulino Vilela, o presidente do Vila Nova Futebol Clube, a maior paixão do Centro-Oeste do Brasil, campeão brasileiro em 1996 e da Taça Maguito Vilela em 1997. Um jornalista da área cultural. Homem underground. Anarquista. Leitor de Mikhail Bakunin.
Não custa lembrar: o teórico russo adversário ideológico do velho barbudo Karl Marx. Proprietário de longas madeixas, óculos contemporâneos da modernidade, adepto do amor livre, Heitor Vilela foi editor do DMRevista, o caderno de cultura do Diário da Manhã. De raro talento, nas letras, desenhos, ilustrações e edição, fez história.
Liberté é uma referência à liberdade, expõe o diretor artístico do casarão histórico da vanguarda estética de Goiânia. Liberdade de expressão, de manifestação e de existência, pontua. Liberdade hoje e ao longo da história, sublinha Heitor Vilela. Em relação direta e com a resistência, atira. Resistir para existir, fuzila o ‘enfant terrible anticapitalista’.
LEIA A ÍNTEGRA DA ENTREVISTA
DM Revista - Qual o nome da nova e underground casa de espetáculos e da noite, em Goiânia?
Heitor Vilela - Casa Liberté.
DM - Liberté é uma referência ao lema de 1789, na França, Liberté, Igualité e Fraternité?
Heitor Vilela - Liberté é uma referência a liberdade como um todo. Liberdade de expressão, de manifestação e liberdade de existência. Liberdade hoje e ao longo da história tem relação direta e objetiva a necessidade de resistência. Resistir para existir. Isso em todos aspectos da vida em sociedade. Trazendo para o contexto cultural, a ideia é promover a resistência cultural em suas mais diversas formas de manifestação e expressão artísticas. Exposições de artes visuais, música, poesia, dança, teatro e performances. O nome em si, grafado na língua francesa, é uma referência direta ao berço dos movimentos libertários, tanto sobre a revolução burguesa de 1789, mas sobretudo e principalmente as insurreições de Maio de 68' em Paris, que neste ano completaram 50 anos e que até hoje influenciam movimentos culturais e políticos em todo o mundo. Liberté, pichado em muros da capital francesa e agora a nível de memória nesse novo espaço contracultural em Goiânia.
DM - Data, horário e local da inauguração?
Heitor Vilela - A inauguração está marcada para hoje a partir das 16 horas. A Casa Liberté fica na Rua 19, número 400, setor Central.
DM - Preço da entrada?
Heitor Vilela - Na inauguração não vai ser cobrada entrada, apenas uma contribuição voluntária para os artistas que vão se apresentar. No caso a programação do dia vai ter: discotecagem em vinil feita e selecionada por mim, shows de Cacau Mila e Projeto 8 Cordas e discotecagem também em vinil do projeto Tropikaos.
DM - O que terá a Liberté? A sua programação diária?
Heitor Vilela - A Liberté é um espaço cultural diverso, com espaço para exposições de artistas independentes, shows musicais, debates, rodas de conversa e todas formas de manifestações artísticas possíveis dentro do casarão. É também um espaço de trabalho coletivo, no andar superior temos a barbearia Mulher Barbada, comandada por duas mulheres, o Aurora estúdio de tatuagem com cinco artistas, o site Metamorfose que é um coletivo de comunicação e jornalismo independente, o ateliê Rabiscos e Escarros e a editora libertária Escultura Produções Editoriais. Dando liga a tudo isso, essencialmente e em todos os dias vai estar funcionando um bar bem completo, com cardápio amplo e variado, com cervejas, chopp, drinks, doses e comidas de todo tipo.
DM - Qual a fonte de inspiração para instalá-la?
Heitor Vilela - Minha principal inspiração é trazer de volta ao centro da capital um espaço de efervescência cultural, política e estética. Enquanto jornalista cultural, ao longo dos últimos cinco anos conheci muita gente forte e interessante, que tem uma produção de fato interessante e às vezes não encontra um local para desaguar essas expressões. A nível de lazer, a inspiração é um bar onde as pessoas se sintam seguras e confortáveis, e quem não tem respeito ao próximo, quem tem pensamentos e atitudes machistas, racistas, homofóbicas e fascistas no geral se sintam desconfortáveis em agir dessa maneira dentro do espaço. Basicamente um lugar para beber boas bebidas, comer bons petiscos e ter uma vivência cultural diferenciada e ativa. Acredito que nós somos a voz de nosso tempo, temos que gritar se necessário for. Ser ativos e fazer acontecer novos espaços e experiências, nunca se acomodar.
DM - É sua ou de um coletivo?
Heitor Vilela - Essencialmente eu quem estou organizando a casa. Porém de forma coletiva, todos vão contribuir para a gestão e ocupação cultural do espaço.
DM - Quais os nomes?
Heitor Vilela - A Casa Liberté é: ateliê Rabiscos e Escarros, Escultura Produções Editorias, Site Metamorfose, barbearia Mulher Barbada e Aurora Estúdio de tatuagem.
DM - Quais os seus projetos para a Liberté?
Heitor Vilela - A ideia é ter sempre exposições de artistas independentes, que também vão colocar à venda suas produções dentro da casa, onde vai funcionar uma galeria rotativa. Além da parte de artes visuais, semanalmente vamos ter shows, festas temáticas e discussões diversas.
DM - Por que em frente ao Lyceu?
Heitor Vilela - O casarão em si foi um achado. Uma casa histórica do começo dos anos 50 que tem o espaço perfeito para a proposta de ocupação do local. O fato de estar em frente ao colégio Lyceu é uma ótima coincidência. O colégio que é um dos mais antigos do estado é palco de grandes momentos da militância na capital goiana, um dos mais intensos deles foram as ocupações de secundaristas contra a privatização do ensino público via Organizações Sociais. O colégio Lyceu respira resistência, arquitetônica, cultural e de luta, desde a época da ditadura militar, passando pelas jornadas de Junho de 2013 até os dias de hoje, é um ponto central e ápice de borbulha social da juventude.
DM - Irish será homenageado?
Heitor Vilela - O camarada Guilherme Irish estará certamente presente em sua memória. Irish e todos que padeceram por suas convicções são a maior força motora de inspiração para os que continuam lutando. A ideia que a figura e memória dele representa é muito forte para nossa geração. Irish está presente! Não só Irish, como Marighella e sua ocupação incendiária da rádio nacional, capitão Lamarca e sua perseverança, Bakunin e seus sonhos poéticos de liberdade e emancipação, Durruti e sua bravura combativa junto de todas as mulheres ponta de lança contra o fascismo espanhol, Nestor Makhno e sua guerra heróica junto do exército negro ucraniano, os anarquistas insurrecionais e regicidas do final do século XIX, em especial a memória de Ravachol, os Black Blocks anticapitalistas contemporâneos a nossa época, os curdos que lutam contra o fascismo na Síria e as mulheres que lutam contra o fascismo no Brasil. Toda energia de resistência histórica se torna referência e força para a resistência de hoje e de amanhã.
DM - O anarquismo é uma possibilidade histórica no século 21?
Heitor Vilela - Temos exemplos claros que dentro da democracia burguesa e a competição pela retomada do estado, o povo que trabalha e luta, jamais alcançará nenhuma emancipação e tampouco liberdade. Ter a tomada do estado e não a sua destruição como objetivo de luta, é uma contradição e erro histórico. Enquanto um homem continuar a ter o poder institucional sobre o outro, e sobretudo ter a força armada para garantir esse poder, ele é um possível tirano e certamente vai continuar a massacrar e se opor a liberdade plena do trabalhador. Apostar nas eleições dominadas pela burguesia é outro erro clássico da esquerda, o assassinato de Salvador Allende no Chile, é a prova viva que o capitalismo jamais deixará que nenhuma mudança estrutural aconteça só porque o povo assim deseja e votou. O caminho mais claro para mim é a cooperação mútua e a federalização das lutas locais de trabalhadores, um novo e grande sindicato independente e descentralizado. O anarquismo é ordem e organização, sociedade sem líderes ou ninguém acima de outro, só olhando todos da mesma altura poderemos viver em verdadeira igualdade.