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O porquê de termos um queixo

Arthur  da Paz Diretor de Redação do Diário da Manhã

Se olhar para um primata ou para a caixa craniana de um Neandertal e compará-la com a de um moderno ser humano notará que algo está faltando. Temos uma característica que eles e demais humanos arcaicos (de qualquer espécie) não possuem: o queixo. "De alguma forma, parece trivial, mas a razão pela qual os queixos são tão interessantes é que nós somos os únicos a possuí-lo", afirma Nathan Holton, que estuda característica mecânico e craniofaciais na Universidade de Iowa (UI). "É único para nós".
Na sua mais recente pesquisa, Holton e seus colegas da UI postularam que os queixos não foram criados pela ação natural das forças mecânicas, como mascar ou dilacerar alimentos, mas, em vez disso, é o resultado de uma adequação evolutiva envolvendo o tamanho e o formato do rosto, possivelmente relacionada aos níveis hormonais já que nos tornamos uma sociedade mais domesticada.
A descoberta, se for verdade, pode ajudar a resolver um debate que se passou de forma intermitente por mais de um século do porquê o homem moderno possui queixos e como eles vieram a ser o que são hoje.

Procedimento
Usando biomecânica facial e craniana avançada, cerca de 40 pessoas tiveram suas medidas plotadas em um computador, desde quando crianças até a fase adulta, o que permitiu a conclusão da equipe de pesquisadores de Iowa, de que forças mecânicas, em especial a mastigação, foram incapazes de produzir resistência suficiente para a "deformação" no osso aparecer na mandíbula inferior, ou mandíbula de área.
Ao contrário, no artigo que eles publicaram no Jornal de Anatomia (Journal of Anatomy), o surgimento do queixo veio de uma geometria mais simples: como nossos rostos ficaram menor desde os humanos mais antigos até os atuais, 15% menor do que o rosto dos neandertais, o queixo virou esta proeminência óssea, sendo apenas uma adaptação emblemática e pontiaguda na parte inferior do nosso rosto.
"Em suma, não encontramos sequer evidências de que os queixos são vinculados à função mecânica e, em alguns casos, até, descobrimos que eles são ruins para resistir a forças mecânicas à medida que crescemos", disse Holton, professor assistente e antropólogo do Departamento de Ortodontia do Colégio de Dentistas da UI. "No geral, isto sugere que os queixos não vieram de uma necessidade de dissipar tensões e estresses e que outras explanações beiram melhor a verdade", pontuou.

Por que, então,
o queixo?
Mais intrigante ainda são as análises dos antropólogos da UI liderados por Robert Franciscus, que acreditam que o queixo humano é uma consequência secundária da nossa mudança de estilo de vida, começando cerca de 80.000 anos atrás e acelerando a pleno vapor com a migração de humanos modernos da África há cerca de 20.000 anos mais tarde.
O que aconteceu foi o seguinte: os seres humanos modernos evoluíram a partir de grupos de caçadores-coletores que foram bastante isolados um do outro para grupos cada vez mais cooperativos que estabeleceram redes sociais em todo cenário. Estes grupos mais ligados parecem ter melhorado o grau de expressão na arte e outros meios simbólicos.
Os machos, em particular, tornaram-se mais tranquilos durante esse período, menos propensos a lutar por território e pertences, e mais dispostos a fazer alianças, evidenciadas através da troca de bens e ideias, que beneficiaram todos eles.
A mudança de atitude foi amarrada a níveis de redução de hormônios, isto é, a testosterona, resultando em mudanças perceptíveis para a região craniofacil masculina: uma grande mudança foi o rosto tornar-se menor, reduzido em vigor, que foi uma saída fisiológica natural criando uma oportunidade, "escape", para, enfim, surgir o queixo humano.
"O que estamos discutindo é que nós tivemos uma vantagem em algum momento por termos estabelecidos redes sociais melhor vinculadas, e pudemos trocar informações e companheiros com mais facilidade, não houve inovação", disse Franciscus, que estava na equipe que primeiro expôs a teoria em artigo publicado no mês de agosto de ano passado na revista Antropologia Atual (Current Anthropology) e que é um dos autores a contribuir no artigo mais recente. "Para isso ter acontecido, os machos passaram a tolerar uns aos outros. Foi preciso ter mais curiosidade e menos agressão, e a arquitetura facial é a prova patente dessa história".
O novo estudo reforça esse argumento, na medida em que descarta o queixo como efeito das forças mecânicas.
Após minucioso exame da região mandibular, e das forças principais que ela sofre/aplica: flexão vertical e deslocamento horizontal. No segundo caso, um lado da mandíbula é puxado para fora, resultando em compressão na parte exterior do queixo. Por outro, a análise da flexão vertical também mostrou as forças que tensionam a área do queixo. Em ambos os casos, o pensamento anterior era que que o estresse mecânico aplicado ao queixo, apesar de acontecer em nível microscópico, teria sido a causa desta saliência óssea que temos abaixo da boca.
O crescimento do queixo, segundo a conclusão dos pesquisadores, tem mais a ver como cada recurso em nosso rosto de adapta com o nosso aumento de tamanho da cabeça, como se cada peça individual de um quebra-cabeça tridimensional em expansão muda de forma para se adequar ao novo espaço e encaixe.
Crianças, por exemplo, têm queixos mais planos, até imperceptíveis, semelhante ao que é visto nos Neandertais. Essa proeminência óssea só se torna visível à medida que nossas cabeças crescem para a vida adulta.
"Nosso estudo sugere que o queixo existe por causa da função", afirma Holton, e "provavelmente tem muito mais a ver com a dinâmica espacial durante o desenvolvimento do ser humano."

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