Ao escrever essa crônica, eu confesso e quero comungar com outras pessoas a minha melancolia. Eu gostaria de ser refratário a este estado mórbido de tristeza e depressão. Mas a Medicina, que eu professo e exerço, ainda não alcançou sintetizar um soro ou vacina para essa condição enfermiça e existencial que acomete algumas pessoas. Já antecipo que jamais vou me considerar o sal da terra. Sou apenas semelhante a outros bilhões de minha espécie que têm o potencial de amar, fazer amigos, ser racional e dotado de muitos outros sentimentos como tristeza, solidariedade, piedade e compaixão! Apenas isso!
Teria eu visto algum crime cruel? Não. Esta realidade tem se incorporado ao nosso cotidiano e com ela até nos costumamos a conviver sem mais nos escandalizar. Alguns mortos a mais no trânsito? Também não. Eles fazem parte das notas diárias dos noticiários. Mais alguns milhões no balanço da corrupção? Não. Estes fatos também já foram classificados como institucionalizados e já não assombram ninguém.
Que me tachem do que quiseram, mas eu estou contrariado com a educação brasileira. Na verdade, educação brasileira, com e (letra e) e b mais do que minúsculos. Raquíticos mesmo. Eu não sei se os leitores que me leem, ouviram ou viram uma notícia dessa semana nos jornais sobre as vagas não preenchidas na Universidade Federal de Goiás (UFG – 7.4.15). São 942 em variados cursos, inclusive no curso de Medicina, historicamente uma das áreas mais concorridas. Eu tomo de empréstimo uma citação de um ex-governador de MG, Francelino Pereira: que País é este? Frase esta repetida por Renato Duque, um dos corruptos da Petrobras, quando foi preso na Operação Lava Jato, que País é este ?
Este País que foi tão grandiloquentemente aclamado e beatificado por figuras como Osório Duque Estrada, Castro Alves e Olavo Bilac deveria estar sendo mantido e reconstruído por homens e livros como recomendou Monteiro Lobato. Mas tudo tem sido feito ao contrário do que preconizaram esses grandes sonhadores, idealistas e notáveis vultos de nossa história.
É aceitável e certo que nossos governantes e representantes políticos tenham culpa no cartório no que concerne aos rumos de nossas escolas e universidades. Na visão de nossos áulicos administradores, cultura e educação digna e de qualidade se tornaram artigos de segunda necessidade. Esta realidade está estampada na visão e jeito petista de engabelar e enganar o povo brasileiro.
Que Pátria educadora é esta? Qualificativo este inventado pela presidente Dilma Rousseff. Que educação é esta, que abandona os seus próprios filhos? É muita falta de gentileza de um País com o seu próprio futuro, as crianças e jovens.
De outro lado, não se pode perder de vista também o espírito e disposição de nossa juventude. Afinal, o que querem os nossos moços e moças desse Brasil? Basta lembrar os versos da música disparada de Geraldo Vandré “Quem sabe faz a hora não espera acontecer”. É sabido e exaltado que a melhor hora, o melhor momento do ser humano é a fase jovem, quando a pessoa está plena de sonhos e projetos de vida. É oportuno então indagar: o que vocês jovens querem para o seu futuro e o amanhã de nosso País? Os sonhos de uma pessoa são as medidas de seu futuro. Será que nossos jovens já não sonham mais como o faziam os nossos ascendentes (pais e avós)?
O resultado do Enem 2014 foi outra notícia e constatação que nos deixa profundamente consternados com os rumos de nossa educação, com o futuro de nossa cultura, com a inteligência, com as ciências, enfim com o desenvolvimento “Latu senso” de nossa Nação. Um dos critérios ou item importante do exame (Enem) para se entrar numa universidade são as provas discursiva e Redação. Onde o aluno tem questões subjetivas. Ou seja, ele tem que expressar os seus conhecimentos escrevendo os seus pensamentos e conceitos sobre determinado tema.
O tema da Redação foi publicidade infantil. Mais de 500 mil alunos tiraram zero nesse item. Dissecando melhor os motivos de tantos reprovados, constatou-se que cerca da metade desses zerados entregaram a prova em branco, a outra metade escreveu alguma coisa, mas fora da temática proposta. Traduzindo em miúdos, os cerca de meio milhão de alunos reprovados por causa da redação não sabiam o significado da expressão publicidade infantil.
Explicando melhor o nível de nossos candidatos a um assento nos bancos de um curso superior: Nossos adolescentes e jovens crescem e lidam o tempo todo com publicidade e não sabem expressar sobre este maior fenômeno de seu próprio dia a dia. E como nossos candidatos vivenciam esta realidade? Através dos instrumentos que eles mais usam e apreciam. Ou seja, a televisão, o computador, a internet, o mundo virtual, as redes sociais, os smartphones, etc.
Tornando a minha melancolia e o desinteresse dos candidatos a uma vaga da UFG, tem-se que as vagas são preenchidas pelo sistema SISU (Sistema de Seleção Unificada, via Enem). Foram feitas três chamadas dos candidatos em lista de espera. Acreditem! É como se os coordenadores dos cursos tivessem que sair às ruas de laço em mão, para capturar o máximo possível de alunos paras os claros existentes nos bancos da universidade. É mole ou querem coisa mais lastimável!
O problema da educação brasileira começa lá na infância. Como ter um ensino médio e superior de qualidade se faltam até creches para nossas crianças? É o mesmo princípio na construção de uma casa ou prédio. Se em sua fundação e aterramento não há uma boa sustentação, essa obra está condenada ao fracasso, rachaduras e desmoronamento.
Educação e cultura de qualidade se fazem com livros, boas escolas, professores qualificados e as famílias engajadas nesse processo. Cada vez mais, os pais e cuidadores de nossas crianças e jovens têm delegado a missão da cultura, formação integral e educação às escolas. Ledo e lamentável engano. As escolas são apenas uma adjuvante nesse processo, que vão ministrar os conhecimentos das disciplinas básicas. Cidadania, conteúdos morais e éticos, o caráter, o estabelecimento de uma disciplina em tudo que se faz em casa, são pilares significativos na formação de futuros indivíduos de boa índole, honestos e com projetos de vida. Querem um exemplo triste e fútil, que presenciamos hoje, pelos pais ditos modernos e antenados com o progresso? A criança, o pimpolho, ainda nas fraldas e na chupeta, recebe os atrativos objetos de informática (celular, iPad, smartphone), esses são objetos lúdicos e uma espécie de babá eletrônica. Agora, imagina se quando forem para a escola estas crianças terão interesse e aptidão para escrever, desenhar, folhear um livro, aprender a ler e entender o que se lê. Nunca. Lápis, borracha, papel e régua parecem coisas arcaicas. A perdurar a orientação dos modernos educadores apenas com os instrumentos digitais, continuaremos a formar uma horda de analfabetos funcionais, de lorpas, idiotas e náufragos da cultura que mal sabem se expressar, pensar, criar e se quer escrever um bilhete, um ofício, uma carta, uma reles redação sobre publicidade. Que triste!
(João Joaquim, médico e articulista do DM. E-mail: [email protected])