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OPINIÃO

Waldemar Gomes de Melo, jornalista

O jornalista Waldemar Gomes de Melo, que foi presidente da AGI no período de 94 a 97, faleceu no dia 4 de agosto 2000, após ter permanecido vários dias em estado de coma, no Instituto Neurológico de Goiânia.

Dias antes, passeando com o seu netinho André Luiz, nas proximidades de sua residência, no Setor Jaó, Waldemar, tropeçando, ao cair envolvendo a criança com os braços tentando protegê-la, precipitou-se desguarnecido ao solo, batendo com a cabeça numa pedra.

Os parentes, sentindo a demora do avô e o neto, foram atrás: localizaram-no estendido ao chão ao tempo em que o netinho, chorando, murmurava: “acorda vovô”.

No momento em que o fizeram entrar num carro para transportá-lo ao hospital, ouviram do acidentado algumas palavras que demonstravam a sua preocupação pelo netinho. Cientificado de que o menino estava são e salvo em sua casa, Waldemar esboçou um sorriso e balbuciou algumas palavras exprimindo sua satisfação. Foram as últimas que seus entes queridos ouviram, pois entrou em estado de coma ainda no trajeto ao hospital.

O seu quadro clínico teve complicações em decorrência de um derrame cerebral. Os médicos atestaram, como causa do infortúnio, traumatismo cranioencefálico em conseqüência da queda, com formação de coágulos no cérebro.

Waldemar teve o seu corpo transportado na tarde do mesmo dia em que faleceu para o cemitério Parque Memorial. Nos períodos da tarde, noite e a manhã do dia 5 de agosto, seu velório recebeu centenas de amigos, pessoas da área da comunicação, políticos e gente do povo. Houve manifestações sinceras e comoventes, um senhor de meia-idade declarou, ao lado do caixão: “Eu acompanhei sua vida na imprensa. Não o conhecia pessoalmente, mas admirava o seu trabalho”.

Homem honrado

Era filiado à Associação Goiana de Impressa desde 1956, tendo sido eleito conselheiro por várias vezes. Em 1997 foi procurado por um grupo de associados para aceitar a sua candidatura à presidência da entidade.

Sua gestão foi um primor de bom relacionamento entre a diretoria e os associados. A então antiquada sede da entidade era de fazer dó quando Waldemar assumiu a presidência. Trocou os móveis, reformou as instalações, transformando a sede num local à altura de receber a visita de associados e autoridades.

Homenagem aos fundadores

Foi em sua gestão que a AGI resgatou a história de seus fundadores. Dados informativos foram colhidos junto aos seus descendentes. Tarefa nada fácil pois alguns perderam os vínculos com Goiás, residindo em outros estados e até no exterior. Para a satisfação de todos nós a entidade tem agora os currículos e as fotos dos onze portentos que a fundaram em 1934.

A gestão de Waldemar Gomes de Melo não teve ostentações e sua pessoa na presidência valorizou a entidade perante a opinião pública e as entidades culturais goianas. Quando necessário, fez com que a entidade fosse ouvida expressando seu pensamento e da totalidade do Conselho Deliberativo, sempre defendendo os interesses materiais e culturais do Brasil.

Dotado de um coração pleno de bondade, ele fez com que a AGI ajudasse inúmeros jornalistas em dificuldade, normalmente na área da saúde. Foram incontáveis as cestas básicas, custeio de passagens ou quitação de talões de luz e água de associados em crise. Isso fez sua gestão incomparável. Todavia, ele não divulgava extremamente esses feitos, pela sua índole que o fez querido de muitos em vida.

Vida profissional

Em Goiânia as atividades profissionais de Waldemar Gomes de Melo destacaram principalmente com o Diário do Oeste, fundado por ele em 1958. Uma atitude arrojada para a época e o veículo em pauta foi o pioneiro no uso de uma rotativa e impressão a cores em Goiás. Vários dos jornalistas respeitados em nosso meio se iniciaram com o Waldemar. O Diário do Oeste marcou época na vida goiana e está inserido em suas páginas uma histórica mensagem de saudação de Juscelino Kubitschek a Pedro Ludovico que proclamou o fundador de Goiânia como um dos maiores estadistas do Brasil. O jornal foi vendido em 1964 ao Deputado Federal Emival Caiado que o fez circular por mais alguns anos.

Mas antes do Diário do Oeste, Waldemar havia fundado o semanário O Araguaia e, juntamente com Gerson de Castro Costa, Paulo Gomide Leite e Edson Hermano de Brito, fundou o diário Folha de Goiaz, mais tarde vendido para os Diários Associados, de Assis Chateaubriand.

Toda a sua vida na imprensa e na vivência com políticos goianos, Waldemar relatou no seu livro Goiás – Imprensa que vivi, um valoroso reposi-tório da história goiana nos últimos 50 anos. Além de jornalista, foi escritor, advogado, empresário e um exímio poeta, tendo sido um dos seus livros – Tabatinga Amarela – prefaciado por Jorge Amado e a capa ilustrada com um famoso (agora) quadro de Siron Franco.

Como empresário, foi dono da Gráfica Imperial e da Gráfica Rio Branco, essa última localizada na Av. Goiás, pouco acima da esq. c/ a rua 2, ao lado da atual Agência da Caixa Econômica Federal.

Sua gráfica era pródiga em executar serviços para entidades culturais por preços ínfimos e, quando não, até sem nada cobrar. A edição no 1 da revista do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás foi impressa, por cortesia, em sua gráfica.

Entrou como associado à AGI em 26 de julho de 1956. Foi membro do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, Academia de Letras do Rio de Janeiro, União Brasileira de Escritores, seção de Goiás e outras entidades representativas na vida goiana.

Não tinha vínculos com a política ou dela usufruiu quaisquer favores. Ressalta-se, entretanto, que atendeu a um convite do então governador Mauro Borges e assumiu a função de secretário de imprensa no final da administração MB.

Outros homens ligados à vida pública também nutriram grande respeito e amizade pelo jornalista a quem Goiás muito deve. Incluiu-se nesta lista, Pedro Ludovico, Mauro Borges, José Feliciano, Íris Rezende, José Ludovico de Almeida, Venerando de Freitas Borges e Aquiles de Pina, esse último grande nome da vida política e social de Anápolis, cidade onde Waldemar moldou a sua formação cultural e força para transformar em realidade os seus ideais.

Vida em família

O jornalista Waldemar Gomes de Melo nasceu em Formosa, no dia 29 de fevereiro de 1924. Diplomou-se em Direito na Universidade Federal de Goiás, mas foi no jornalismo que plasmou a sua vida.

Sua vida em família foi das mais venturosas. Era casado com a sra. Margarida Franco Gomes, de tradicional família do sudoeste goiano que a conheceu em sua “Gráfica e Editora Rio Branco”. Foi, antes de esposa devotada, uma eficiente funcionária da firma.

Algumas semanas antes do seu passamento Waldemar afirmava aos amigos de sua felicidade no convívio familiar. Do seu casamento vieram os filhos Lúcio Franco (advogado), Maria Barbosa (médica), Carlos André (advogado) e Adriano (advogado). “Meus filhos só me deram alegria, desde a infância a fase adulta”, costumava repetir. E a sua ventura de viver havia enriquecida ainda mais com a vinda dos netinhos Lorena, Laura e André Luiz.

Tinha muitos amigos, pois que, em vida cultivou o trato cortês com todos e ajudou, de forma cristã e desprendida, toda uma legião de pessoas.

Professando a religião espírita, mas com muitos amigos católicos e evangélicos, aconteceram cultos e celebração de uma missa de 7º dia de falecimento na igreja do setor Jaó. Na missa, estando ali seus familiares e vários amigos, foram prestadas homenagens a um homem bom honesto e grande profissional, cujo nome será imorredouro na história da imprensa em Goiás.

Repercussão na Câmara dos Deputados

No dia 9 de agosto, na Câmara de Deputados, o então deputado Luiz Bittencourt (PMDB-GO) proferiu o seguinte discurso:

“Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, é com muito pesar que venho hoje trazer ao conhecimento da Câmara Federal a notícia da morte, em Goiânia, do jornalista, poeta e historiador Waldemar Gomes de Melo, homem de muita inteireza de caráter, de ilibada conduta social e figura de bastante projeção na vida cultural do meu Estado. Aos 76 anos, vítima de traumatismo craniano em conseqüência de grave acidente, esse goiano ilustre, nascido na cidade de Formosa e de atividade empresarial registrada em Anápolis, de onde se transferiu depois para a capital, teve uma participação marcante em diversos eventos de histórica importância nos anais do jornalismo de minha terra natal.

Apaixonado por sua militância na imprensa e também das artes gráficas, o extinto foi um dos fundadores, com Gerson de Castro Costa e Edson Hermano de Brito, do primeiro jornal diário a circular em Goiânia, com efeito, à frente da Folha de Goiaz, ele se conduziu com absoluto espírito de lucidez profissional, ditando o seu processo de comunicação social sob a inspiração de critérios informativos, baseados na verdade e no respeito aos valores ético-morais. Mereceu, portanto, o prestimoso apoio da população e o seu jornal teve uma longa existência, sendo integrado em 1944 à cadeia dos Diários Associados.

Seus dois parceiros na direção da Folha de Goiaz foram Gerson de Castro Costa e Edson Hermano de Brito. O primeiro, jovem idealista e de boa formação intelectual, logo ingressou no mundo da política e, pertencendo ao grupo de Pedro Ludovico, eleito pela legenda do Partido Social Democrático, buscou assento na Assembléia Legislativa do Estado, que o presidiu com muita eficiência administrativa e habilidade pessoal. Daí, veio para a Câmara Federal e nesta Casa atuou em mandatos consecutivos, sempre defendendo os interesses goianos e tendo sido o autor do projeto, transformado em lei, que criou a Universidade Federal de Goiás.

Unânime e a opinião que Waldemar Gomes de Melo fez uma verdadeira revolução na imprensa goiana, implantando o primeiro jornal em duas cores e instalando a primeira rotativa no Estado, quando do início dos anos 50. Foi assim o Diário do Oeste também uma verdadeira escola para alguns dos mais significativos nomes do jornalismo de Goiás, todos eles hoje atuantes em diferentes campos desse mister profissional. Ele é apontado como um idealista visto que, na década de 40, editou com sucesso o jornal Araguaia, considerado de fundamental relevância para a história da imprensa do meu Estado.

À ocasião do falecimento, os jornais ressaltam que o primeiro trabalho de Waldemar Gomes de Melo foi o de auxiliar de serviços gerais, passando posteriormente à linotipia e seguindo uma carreira vencendo degrau por degrau no conceito de seus confrades. Do jornalismo, seu interesse transbordou para a literatura, pois escreveu um livro de poemas intitulado “Tabatinga Amarela” e “Goiás – Imprensa que Vivi”, tendo deixando dois inéditos. Nos últimos anos trocou o mundo agitado das redações, que o seduziu na juventude, pela serenidade de um pequeno sítio onde cuidava de rosas e produzia mudas para reflorestamento.

Poeta, dono de uma sensibilidade lírica bastante acentuada, pertencia a várias instituições culturais e era membro de destaque do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás. O seu livro. “Tabatinga Amarela”, é uma seleção de poemas e também um álbum de arte, com uma expressiva capa de Siron Franco e ilustrações do pintor Ailson Brás Corrêa, falecido recentemente. Sobre a sua temática manifestou-se o escritor Jorge Amado, que gostou dos seus poemas, feitos com vida e belo lirismo, virtudes que definiam a sua personalidade de excelente poeta. Todavia, além de todas essas qualidades, é de dizer-se que Waldemar Gomes de Melo foi um homem de singela pureza moral, um cidadão de irrepreensível estilo de vida, um chefe de família que soube bem educar os filhos e merecer a irrestrita lealdade de sua mulher, companheira também de sua atividade empresarial, que se chama Margarida Melo Franco, pessoa de forte individualidade, rígida conduta e firme energia humana.

Consternado, deixo consignado o meu profundo sentimento de pesar pelo desaparecimento de Waldemar Gomes de Melo e apresento à sua honrada família as minhas sentidas condolências. Ele foi, de fato, um goiano de fibra, um amante fervoroso do seu berço natal, um brasileiro de honra que não desmereceu a fortuna de haver nascido em Goiás.”

(Walter Menezes, ex-presidente, conselheiro permanente da Associação Goiana Imprensa e diretor do Jornal da Cultura Goiana)

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