Na ilha de Madagascar encontra-se a maior quantidade de camaleões de todo o mundo. Moram nos mais variados habitats e apresentam diversos tamanhos e formas. Mas são todos répteis e conservam seu sangue frio e características principais imutáveis e facilmente identificáveis. Assim como os fofoqueiros.
A primeira delas e talvez a mais visível seja o mimetismo. Você olha e não vê, você chega perto, mas perto ainda e não o localiza. Esteja no meio das folhagens, no cipó, ou no chão. Socialmente invisível, ninguém se dá conta dele, até que abre a boca.
Aí apresenta sua imensa língua protrátil de maledicências. Arremessa-a numa velocidade incrível, para todos os lados. Atingindo insetos e pessoas de rodo e supetão. Parece ser inofensivo, porém não o é. Pois o mal que injeta, com informações distorcidas e veneno de inveja é algo inacreditável.
Outra coisa não tão percebida é a posição dos olhos. Grudados na cabeça, podem ir para frente e para trás de forma independente. Isso os faz grandes observadores da vida alheia e consequentemente os carregam de informações, que modifica ao seu bel prazer. Na mata, a imobilidade o salva. No escritório, na academia, no salão de beleza, na sauna ou em qualquer ponto em que as pessoas se reúnam, lá está ele calado a espera do bote lingual.
Seus movimentos são lentos, entretanto formidavelmente calculados. Com o advento das redes sociais, um dos seus passatempos prediletos é perscrutá-las, enriquecendo seu cabedal de mentiras e meias-verdades. Some no inverno, pois existe menos gente, menos pessoas para conviver. Retira-se para frente do seu micro ou do seu smartphone e desata a teclar, violentamente.
Pode aparecer de várias formas, já disse, mas todos feios. De uma monstruosidade amoral. A maioria porta chifres, o que lhes torna ainda mais ferinos e amargurados. Outros são orelhudos. Sua pretensa risada e alegria são de uma falsidade atroz. Existe até o pigmeu, mas nunca são grandes, nem irão ser. O crescimento pessoal está longe dessas pessoas.
Por último, a cauda preênsil. Para se apoiar em suas investidas e deslocamentos, precisa de apoio que é exatamente quem o ouve. Todo fofoqueiro tem o rabo preso. Isso denota justamente a última parte da minha enorme metáfora camaleônica. Infelizmente, a grandessíssima maioria das pessoas já fez ou faz fofoca, talvez nem percebam. Eu mesmo já caí nessa esparrela mais de uma vez. Como evitar e como identificar e separar o mimetismo da camuflagem?
Nós camuflamos nossos medos, invejas e dificuldades com comentários maldosos e de segunda intenção, mas sempre uma pessoa nos alerta ou até a nossa própria consciência. Devemos estar atentos com as palavras, pois estas têm muito poder. No entanto o verdadeiro camelão, o fofoqueiro primal, não para de falar. Nada o impede e ele insiste no tema maldito e em maldizer algo ou alguém.
Mil perdões as esses animais maravilhosos que conheci em Madagascar, na minha última aventura. Mas eles são exatamente iguais a essas pessoas. Elas eu não peço desculpas, e as evito ao máximo, não lhes dou ouvido e nem corda. Pois se isso ocorre, um dia serei eu o camaleão ou a vítima a sofrer com o desmando vil. E nenhuma das duas opções é boa, pois o sangue frio deixemo-lo aos répteis.
(JB Alencastro, médico e poeta)