O Arraial de Barro Preto da Santíssima Trindade de Goyaz, poético recanto dos sertões goianos, era, em 1912, já um distrito de Campininha das Flores, hoje bairro de Goiânia. As datas emblemáticas de sua origem são desconhecidas, já que se baseiam em informações orais.
Dois anos antes, 1910, o padre Antão Jorge Heckembleikner aumentou o número de missas e solenidades na igreja do Barro Preto. Solicitou ajuda para reconstrução do Santuário e o início das obras foi em 1911, ficando pronta em 1912, quando foi rezada missa solene que teve por cantora Maria Augusta de Mello.
Naquele dia, o distrito de Trindade encheu-se de luz. Inaugurava-se um templo espaçoso para a realidade e o meio. Houve participação de autoridades do distrito, de Campininha das Flores e da Cidade de Goiás.
Padre Antão Jorge, Redentorista alemão, teve participação decisiva na história trindadense ao levar adiante, a partir de 1910, os trabalhos de reconstrução da Matriz de Trindade, na época, já pequena para o número sempre crescente de fiéis. Foi ele quem comandou os trabalhos, a organização dos acervos territoriais da igreja naquela época, principalmente com a venda de terrenos que não eram utilizados, o que gerou renda para as despesas.
Após sua inauguração, houve crescente ampliação de eventos como no ano seguinte, 1913, a introdução de uso de fogos de artifício durante os festejos da Romaria; o que deixava estupefatos os romeiros do interior que não conheciam essas modernidades de então. Muitos corriam assustandos acreditando ser o fim do mundo. Com o início da Primeira Guerra Mundial e o sentimento antigermânico, foi nomeado o padre brasileiro Francisco Braz Alves para vigário, para se evitar empecilhos ou contendas.
No ano de 1915 teve início as solenidades da Semana Santa. Bellarmina Magalhães Ottoni, Martinha Cavalcanti e Floripes Borges de Carvalho foram as primeiras a organizarem os eventos dessa piedosa devoção, quando se comprou na Casa Sucena de São Paulo, as imagens de Senhor Morto e Nossa Senhora das Dores para a procissão do Encontro e Procissão do Senhor Morto. Foi um sucesso inusitado para a época e para o meio sertanejo de outrora.
Enriquecendo o cenário, a Matriz ganhou iluminação com gás acetileno que era conhecido como “luz-luar”, retirando-se as antigas candeias de azeite, lamparinas e velas de sebo que empesteavam o ambiente com fumaça, mesmo que perfumadas com alecrim, sândalo ou patchuli, colhidos nos velhos quintais. Nesse mesmo ano, o Apostolado da Oração tem início com a inscrição de 361 associados. Mulheres abençoadas por Deus se uniram para o exercício sagrado da fé e da devoção.
No ano de 1918 foi realizada pela primeira vez a festa do Sagrado Coração de Jesus em Trindade, que teve vida efêmera. Nesse mesmo ano, segundo relatos, os Redentoristas criaram uma Banda de Música para Trindade que também não foi adiante. O meio e as problemáticas políticas tornava adversa qualquer tentativa de progresso.
As pessoas de então ainda não compreendiam o sentido cultural, a maioria estava envolvida na luta da terra, no trabalho braçal para o sustento da vida.
Havia indisposição para receptividade às novidades. Tudo era pacato, simples, lento, num mundo que não se revelava, senão até os limites do morro da cruz das almas.
1920 foi um ano de muitas realizações para Barro Preto, com a emancipação política em 16 de julho, passando a denominar-se Trindade; a iluminação elétrica da igreja com um gerador próprio, mais tarde contratado da Usina de Gabriel Alves de Carvalho, pioneira da cidade; a publicação e distribuição da Polyantheia Redentorista, sem dados históricos; a instalação de um telefone na Igreja, o primeiro da cidade, que se ocmunicava com o Seminário em Campinas. Sobre esse fato, o escritor Antonio José de Moura em seu livro Sete léguas de paraíso satiriza a ignorância dos roceiros que criam que os padres, naquele aparelho esquisito, falavam com o céu, ou com o inferno, também...
Em Trindade, por volta de 1920, para organização e acomodação do número crescente de ex-votos, foi criada na Matriz a "Sala dos Milagres", graças à organização do Padre Antão Jorge.
Em 1928 foi criada a Paróquia independente de Trindade, segundo o livro de Tombo de Campinas, página 23, n° 05, mas pela carência de sacerdotes, o fato somente se consolidou 20 anos depois, em 1948, com construção do convento, sendo o padre Arthur Bonatti o primeiro superior e vigário da Paróquia de Trindade, subordinada diretamente ao então vice-provincialado de Aparecida, no Estado de São Paulo.
Em 1923, Dom Emanoel Gomes de Oliveira assumiu como Bispo de Goiás e modificou o teor do contrato com os Redentoristas no ano seguinte, em 05 de dezembro de 1924 em que os mesmos passaram à condição de assalariados e com subordinação administrativa à mitra diocesana.
Em 27 de Maio de 1947 foi instalado um serviço de autofalantes na Praça da Matriz de Trindade com amplificadora e emissora local, serviços requeridos pelo Padre Pelágio Sauter, desde então começaram os anúncios fúnebres até hoje existentes.
Em 19 de fevereiro de 1946 foi o Pe. Alexandre Miné transferido para Trindade a fim de providenciar o início da construção do Santuário Novo do Divino Pai Eterno no outeiro da Cruz das Almas, cuja pedra fundamental foi lançada em 1943.
Em 30 de julho de 1960 foi fundada em Trindade a "Associação Paroquial Amparo Materno-Infantil", que prestou grandes serviços à comunidade trindadense. Nesse mesmo ano, em 01 de março, foram aprovados os estatutos da "Associação Luiza de Marillac de Trindade" outra entidade religiosa de serviço comunitário.
Nos eventos religiosos, no tocante às missas, procissões e encontros sempre houve participação da comunidade. Um movimento jovem importante foi instalado na Matriz de Trindade nos anos de 1970, seguido pela Renovação Carismática Católica, na década de 1980, com grande participação popular. Assim, irmanados pelo espírito cristão, dedicaram seus dias para que a Igreja Matriz de Trindade tivesse mais brilho e mais receptividade. Dentre estes, destacam-se os zeladores Nicomedes, Getúlio, Ernesto, Ana Geralda, Adélia, Adelino e irmão Zé.
Dentre as floristas dos andores destacaram Joana Borges Guedes (Joanoca); Altanir Pinheiro (Izinha) e Maria de Lourdes de Oliveira Barros. Famosos também foram os presépios de Laudelino Carlos Pereira, Flaviano Carlos Pereira, João Pereira dos Santos e Geraldo Silva. Nos gritos, os leiloeiros se destacavam como Geminiano Alves de Mello e Getúlio Figueiredo, assim como os fogueteiros Chico Borges, Joaquim Fogueteiro e Chico Garça. Até mesmo há de se relembrar o cheiro das pipocas feitas por Adeliro Pipoqueiro e Jerônimo Pipoqueiro, num tempo distante.
Também a bela matriz foi visitada por gente ilustre, como JK.
O grande líder político do século XX no Brasil foi incontestavelmente JK o construtor de Brasília que realizou o feito histórico da mudança da capital para o planalto brasileiro, sonhado desde o inicio da República, ainda no século XX.
Esse homem admirável esteve na década de 1960 realizando campanha eleitoral em Trindade, cumprindo promessa feita ao Divino Pai Eterno. Na época em que visitou Trindade, acompanhado do governador José Feliciano Ferreira, do prefeito José Pinto Magalhães e de lideranças como Abrão Manoel da Costa, Jonas Pires de Campos, Vespasiano Odorico Vieira e Sizenando da Silva Campos, ele rezou aos pés da imagem dentro da Matriz.
Sua visita, como era de se esperar, causou rebuliço em toda cidade. Eleito senador, Juscelino é perseguido pela Ditadura militar até sua trágica morte em 22 de agosto de 1976, num acidente na Via Dutra.
Também a música sempre fez parte da rotina da velha e secular igreja.
O registro pioneiro sobre a música trindadense partiu de Oscar Leal em seu precioso documentário Viagens ás terras goyanas, em 1890. Nele, indignado, narra que na Igreja, como instrumento musical, estava um realejo, prova máxima de pobreza, pois nas outras cidades, havia órgãos, harmônios, cítaras, pianos e Trindade, um vilarejo simples, mas sempre cheio de gente, havia dentro da igreja, um profano realejo!
Outro pioneiro da música em Trindade foi o abnegado Padre Pelágio Sauter que ministrava aulas de harmônios aos jovens da época, formando dezenas de cantoras líricas como Isaura e Ozana Braz, Natalina Neves, Maria Augusta Gonçalves e Elza de Freitas.
Nos anos 1930 em Trindade, surgiu a Banda do Mestre Araújo, sob a coordenação do Maestro José Ferreira de Araújo, da Banda de Música da Polícia Militar do Estado de Goyaz, que ministrava aula de música para seus alunos, formando gerações seguidas de bons músicos trindadenses.
Mestre Araújo era ainda responsável pelas famosas retretas do velho coreto do Largo da Matriz, das dolentes músicas que alegravam o footing dos namorados e os sonhos acalentados que se perderam no tempo ante o inexorável nunca mais. Todos vivenciados à sombra do ícone maior, a Matriz.
O primeiro piano de Trindade pertenceu a Davina Nascimento Vasconcelos, que era Professora no Grupo Escolar João Pessoa. O segundo pertenceu a Cecília dos Santos Almeida, também professora do referido Grupo Escolar e o terceiro a Elza de Freitas, grande cantora lírica.
Também a imprensa teve propulsão na histórica Matriz.
O início da imprensa em Trindade aconteceu na década de 1920 quando começou a circular em 0l de julho de l922 o jornal Sanctuário de Trindade, de caráter quinzenal e religioso e que tinha por redatores os Padres Redentoristas do Santuário de Campinas. Esse jornal tinha temática exclusivamente católica e se destinava a divulgar os acontecimentos religiosos de Trindade e Campinas. Esse veículo de comunicação circulou até l930 e mais de setenta anos depois voltou a circular.
Assim, os sineiros tiveram esmero na velha igrerja.
Apesar de não ser uma profissão, os sineiros sempre tiveram esmero na atuação marcante na Igreja Matriz de Trindade. O sino, fixado numa das torres, tem o som dolente e evocativo e seus sineiros também sabiam dele extrair conotações diferentes a cada tipo de evento religioso: batia diferente para missa, enterro; nesse, com variantes: enterro de anjinho ou moça virgem e enterro de gente pecadora!
Os sineiros da Matriz de Trindade nos seus tempos primitivos foram Josino Lopes de Barros e seus filhos Hermínio Lopes de Barros e Emiliano Lopes de Barros, além do Irmão Plácido, Getúlio José de Figueredo, Nicomede, Irmão Valdir, Irmão Zé, Adelino e Ernesto.
Os fotógrafos e retratistas também fazem parte da história da Matriz.
Os retratistas de Trindade ocupam um lugar especial no folclore de nossa terra. Até mesmo nos nomes, nos apelidos, revelam a popularidade dos mesmos: Beijo, Zé do Beijo, Bastião Xaxado, João da Máquina, Domingos da Diolinda, Negrinho fotógrafo e muitos outros que passaram e ainda passam por nossa história.
Assim, Hélio Batista Bastos retratista da porta da igreja do Divino de Trindade foi lembrado porque na sua humildade, é pessoa reconhecida, querida e admirada por muita gente e até já faz parte do folclore de nossa cidade, sempre visto nas ruas da cidade com sua bicicleta, nos pequenos serviços para amigos, nos fundos do casarão do bêco do Tem Tem, na busca dos remédios caseiros, no atendimento às amigas da Rua Padres Redentoristas na sua gentileza permanente e na maneira sábia de viver, sabendo ser tudo e nada, porque o mundo é isso o que levamos.
Sua história é curiosa. Nasceu em Goiânia em 12 de janeiro de 1937, filho do lar mais numeroso de Trindade, quem sabe de Goiás, pois seus pais tiveram do mesmo leito, 24 rebentos!
Desse feito notável, sua família, em 1940, desfilou para o Presidente Getúlio Vargas como uma das curiosidades de Goiás, pois não é comum uma mulher ter 24 partos normais!
Era seu pai, João Batista Bastos, policial militar e conseguiu o feito de equilibrar as finanças de uma família numerosa com honestidade. Sua mãe, Edwiges Romana era do Maranhão e mesmo com tantos partos teve vida longa, haja vista que gravidez não é doença, ao contrário, saúde e vigor.
Em 1953, Hélio iniciou seus serviços como retratista com o Zé do Beijo e só mais tarde conseguiu comprar sua maquininha lambe – lambe do “Gordo” mascate. Assim, passou a trabalhar na porta da igreja do Divino Pai Eterno com grande freguesia.
As atividades teatrais foram constantes no âmago da história da igreja de Trindade.
Barro Preto, vila chantada nas campinas goianas, longe e barrada do contato com a então capital, Goyaz, pela altaneira Serra Dourada, teve um tardio desenvolvimento das atividades teatrais. Segundo o historiador português Oscar Leal em seu livro Viagens às Terras Goyanas, escrito em 1890, havia sempre representações no Largo da Matriz do Divino Pai Eterno da Santíssima Trindade do Barro Preto, relatando até mesmo um autentico “Can-Can”, forma precária, porem pioneira e arrojada de cultura.
Otavinho Arantes, maior nome do teatro em Goiás, nascido em 1922 em Trindade, iniciou sua vocação pelo incentivo do abnegado Padre Pelágio que, nos anos de 1930, deu ênfase a esta arte no ambiente sagrado da Matriz de Trindade. O seu “Grêmio Teatral” apresentava peças como “Cala a Boca Etelvina” e “Progresso Feminino” em critica ao crescente movimento feminista encetado no Rio de Janeiro por Berta Maria Júlia Lutz, pioneira das mulheres dos anos 20 e 30 e Mietta Santiago, primeira eleitora do País, no longínquo ano de 1927 e também em Goiás pelo movimento de Benedita Chaves Villa Real, primeira eleitora goiana.
Também o cinema, com sua modernidade naqueles tempos, teve por cenário a igreja da praça.
Os pioneiros do cinema ou de apresentações do gênero em Trindade foram os Padres Redentoristas, com seus filmes de cunho religioso. Sebastião Aranha foi o primeiro a exibir filmes “profanos”, trazidos em viagens cansativas, nos mulambentos burros, no seu dom artístico mambembe, mas sempre atuante. A ele se seguiu o conhecido Chico Garça.
Segundo relatos dos jornais da época, nos anos 1930 existia o “Cine Pai Eterno” da Firma Vaz & Cia, com exibição regular de filmes famosos, que eram o deleite dos moradores da cidade, além da Sorveteria Linde, também sucesso de publico do pós-cinema, onde se deliciavam com os “gelados”, pois nesse tempo, nem em sonho alguém em Trindade possua uma geladeira!
Outro pioneiro do gênero foi José Henrique da Rocha (Zé Feio) que foi administrador do “Cine Cometa” na Rua do Comercio que foi encanto para muita gente, sendo seu negócio, no velho casarão apelidado de “Cine do Zé-Feio” que marcou época em Trindade pelos filmes que apresentava, inclusive em vez primeira, o lendári... E o vento levou.
No ano de 1955 o conhecido fazendeiro João Alves de Carvalho e sua esposa Edna Eva Alves adquiriram as antigas e sombranceiras residências de Alfredinho Taxista (um dos pioneiros do Carro de Praça de Trindade) e a Pensão da Dona Nega e, no local dessas, construíram o prédio que seria doravante, destinado a abrigar o novo cinema que se denominaria “Cine Teatro Mara” em homenagem à primogênita do casal.
Os velhos livros da Europa chegaram a Trindade e ficaram na Matriz a cargo dos padres estrangeiros.
Em Trindade, a partir de 1896, com a chegada dos Padres Redentoristas foi organizada uma pequena biblioteca sacra. Em 1936, o então Grupo Escolar João Pessoa possuía uma pequena biblioteca, organizada pelas professoras Nila Chaves Roriz de Almeida, Davina Nascimento Vasconcelos e Ana Maria de Oliveira.
Na década de 1950 surge no Ginásio Pai Eterno a “Biblioteca Veritati” organizada pelo “Clube dos Estudantes Trindadenses” que promoveu inúmeras atividades culturais relacionadas à literatura e artes plásticas, antecipada pela Biblioteca Pública Municipal Pe. João Cardoso de Souza em 1974 e até hoje em pleno funcionamento no prédio histórico intitulado “Castelinho” no Beco dos Aflitos. Teve sede na Praça da Prefeitura, Largo da Matriz e no prédio histórico denominado “Sobradinho”.
Esta biblioteca homenageia o ilustre padre João Cardoso de Souza pelo seu trabalho intelectual em favor de Trindade e sua cultura voltada para a história e para a música.
Ainda na instrução pública, a igreja teve o seu histórico papel.
Desde os tempos iniciais em que foi construída a Matriz de Trindade, a partir de 1912, diversas foram as atuações dos Redentoristas no campo da instrução e do profissionalismo, principalmente da mulher. Pelo Decreto Estadual nº 306 de 05 de Março de 1947 foi transferida a Escola Normal São José de Corumbaíba para Trindade. Dentre os diretores dessa Escola teve destaque o padre Aristides Menezes Pedro, que conseguiu o seu reconhecimento pelo decreto de nº 031 de 01 de Julho de 1959.
Em 20 de Junho de 1954 foi fundada a Escola Doméstica São Geraldo de Trindade, de corte e costura, mantida pela Paróquia (onde eram professoras abnegadas Idália Pereira Pires “Irmã Helena” e Joana Borges Guedes “Janoca” que ministravam aulas gratuitas de corte e modelagem).
Nesse mesmo período foi criado o “Lar Infantil São Clemente” e a “Escola Paroquial Santo Afonso” no Largo da Matriz, na antiga residência de Ana Maria de Oliveira (Dona Sinhá), onde também foi um clube. A junção de todas essas Escolas deu o embrião do Ginásio Divino Pai Eterno, idealizado pelo Padre Gabriel Maria Vilela, que teve colaborações para a fundação do auspicioso estabelecimento de ensino da conceituada educadora Nilda Campos e de Maria de Lourdes Oliveira Barros que foi a primeira professora do referido Ginásio.
Nesse estabelecimento destacamos o abnegado trabalho do Padre João Cardoso de Souza, das Irmãs de Caridade e dos Diretores, como o Professor, como o Professor Aldair Nery dos Santos. Em 25 de janeiro de 1976 o colégio (antigo Ginásio) Pai Eterno passou à Municipalidade e mais tarde foi doado para a Secretaria de Educação do Estado.
Relembrada em versos, a Igrerja de Trindade também serviu de inspriação.
Trindade foi e continua sendo uma terra de muitos talentos literários, notadamente na poesia. A temática religiosa, notadamente referente à velha matriz e ao significado de sua fé e romaria tem sido uma constante. Arleno Mendanha (1941-1987) foi o maior poeta trindadense de todos os tempos, além de professor e funcionário municipal. Seu poema intitulado “Trindade” é antológico:
Beco dos Aflitos
Milhares de pés,
Cansados aflitos,
Atrofiados bonitos,
Circulando aflitos.
Beco dos aflitos:
Mascates com seus variados
Biscates...
Olhaí, meu!
É um barato!
Jeans a mil!
Sensacional descoberta:
A pomada para a cura
Do câncer... leva uma, vai,
Leva mil!
Beco dos aflitos
Caminho da loucura
Da procura e da cura...
Dos amores e desamores
De perdas e ganhos
Insônias e sonhos...
Beco dos aflitos:
É uma rua
De tudo e de todos,
Por onde os sonhos trafegam
Ganhando o mundo...
Trindade:
Do Pai Eterno
De Constantino
De eu sempre
Eterno menino...
Trindade:
Santíssima
Trindade
Também as catequistas tiveram papel essencial na propagação da fé. Muitas, em diferentes épocas, foram as chamadas para o trabalho evangelizador da Matriz de Trindade nas aulas de catequese e preparação para o crisma. Desde as mais antigas pode-se destacar Maria da Cruz, que além de professora, cantora, era também catequista, além de Ana Maria de Oliveira (Dona Sinhá), que foi diretora do Grupo Escolar João Pessoa e grande intelectual. Viúva, com filhos menores, ela devotou sua existência ao ensino e à religião.
Os carreiros fazem parte da história da sesquicentenária romaria e da velha igreja.
Carro de boi, transporte pesado, rús¬tico, lento. Seu nostálgico cantar já foi inspiração para poetas, para cantores de alma apaixonada, para os saudosistas dos tempos idos, modinheiros das noites estreladas, na distante época em que este meio de transporte sustentou a economia agrária do país.
Eles são históricos, vêm dos tempos imemoriais. De onde surgiram? Todo ano, há mais de 150 anos, a cidade de Trindade e enche deles pelas ruas, vielas, becos, avenidas e principalmente na porta da Matriz, local onde os romeiros se aglomeram e onde há ganho mais fácil, por meio da piedade dos fiéis
As manifestações de fé vivenciadas na histórica e secular Matriz do Divino Pai Eterno de Trindade constituem uma histórica singela, evocativa e singular dentro da história goiana e brasileira. São homens e mulheres, na esteira do tempo, tocados pelo amor do Pai, na busca do conforto para os males do corpo e do espírito, confiantes na significação da imagem abençoada.
Enfrentando as intempéries do tempo e do meio, saem de suas casas, num ritual sagrado de fé, de carro de boi, de caminhão, a pé, de ônibus, em carros luxuosos, em automóveis simples, a cavalo, nos paus de arara, de bicicleta, para louvar ao Pai Eterno da Trindade.
Cumprem um sacrifício pelo amor e pela devoção, como na singela música de Valter José: “Sou romeiro que caminha/ sou devoto do Senhor/ Caminhando pra terra santa/ Velha Trindade da fé e do amor”.
(Bento Alves Araújo Jayme Fleury Curado é graduado em Letras e Linguística pela UFG. Pós-graduado em Literatura Comparada pela UFG. Mestre em Literatura pela UFG. Mestre em Geografia pela UFG. Doutorando em Geografia pela UFG. Escritor, professor e poeta). [email protected])