Cultura

Salve o Udigrudi!

Redação

Publicado em 7 de setembro de 2016 às 03:00 | Atualizado há 9 anos

É  notório que a música brasileira possui muita qualidade, mesmo com diversos artistas pouco valorizados. E pouco se sabe sobre o Movimento Udigrudi, reunião de artistas de diversas áreas – mais especialmente da música –, que inaugurou o rock e a música psicodélica recifense durante os anos 1970. No entanto, uma espécie de “revival” da psicodelia no Brasil vem trazendo à tona algumas dessas sonoridades. Uma delas é a coletânea No Abismo da Alma, organizada pela Tramp.

A coletânea reúne diversos jovens artistas fazendo versões de Ave Sangria, Alceu Valença, Zé Ramalho, Geraldo Azevedo, Flaviola, Marconi Notaro, Lula Côrtes e Laílson de Holanda. Esses dois últimos gravariam em 1973 o primeiro álbum totalmente independente do Brasil, Satwa, nos estúdios da mitológica Rozenblit. O álbum é resultado dos dois artistas ainda sem nenhum vínculo com a gravadora, realizando algo completamente inusitado para o mercado brasileiro. O termo “folk psicodélico” ainda não existia. Estavam entrando em estúdio pela primeira vez, gravando em condições muito básicas, abusando da criatividade. Parece que mais de 40 anos depois, a proposta ainda continua atual, como podemos ouvir na versão da Orquestra Abstrata para a música Amigo.

Segundo Laílson, “a versão de Amigo me pegou na veia. Essa é uma das músicas que mais gosto do álbum Satwa. A cítara do Eduardo Kolody ficou muito boa! No original fiz um overdub de baixo nas cordas graves do violão e ele e Wassily também conseguiram reproduzir muito bem o clima da obra. O nome dessa música quem deu foi Lula [Cortês]. A gente estava tocando ela ainda antes de irmos para o estúdio e ele falou: ‘Cara, essa música parece com dois amigos se encontrando numa calçada, um vindo de um lado, outro do outro e aí se encontram e começam a conversar. É uma música de amigos!’ Aí virou Amigo!”

 

Udigrudi

Inspirados pela revolução francesa de maio de 1968 e estimulados pela publicação do Ato Institucional Nº 5, também conhecido como AI-5, que aconteceu em dezembro do mesmo ano, jovens do sertão de Pernambuco e da capital, Recife, iniciaram um movimento contra a cultura repressora da época, conhecido como Movimento Udigrudi, ou seja, o underground no melhor estilo brasileiro.

A riqueza desse movimento foi ilustrada não apenas na forma de música, mas também em peças de teatro, filmes, artes plásticas e artesanatos. Embalados pela psico­­delia das bandas que tocaram no festival Woodstock, com seus temas que exploravam a subjetividade, loucura, obsessão e alucinações, e por obras da geração beatnik, de Allen Ginsberg, William S. Burroughs, Jack Kerouac e Neal Cassady, artistas como Lula Côrtes, Lailson Cavalcanti, Marco Polo, Almir de Oliveira, Paulo Rafael, Robertinho do Recife, Ivinho, Dicinho, Rafles, Agrício Noya, Alceu Valença, Geraldo Azevedo, Marconi Notaro, Zé da Flauta, Israel “Semente Proibida”, Zé Ramalho da Paraíba, Flávio Lira e seu Bando do Sol criaram o que podemos chamar de beat-psicodelia recifense, uma mistura lisérgica de rock’n’roll com influências de forró, baião, repente, xaxado, embolada e frevo.

Visando desentupir um pouco as veias do pessoal que está ouvindo bandas neo-psicodélicas estrangeiras, como Tame Impala, Pond, Temples, Jagwar Ma, Foxygen, entre outras, e homenagear esses grandes músicos brasileiros e suas respectivas obras, que completaram mais de 40 anos, o jornalista Leonardo Paladino convidou bandas e cantores do Amazonas, Bahia, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Minas Gerais, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo para gravarem uma coletânea colaborativa e sem fins lucrativos, intitulada No Abismo da Alma – Um Tributo ao Movimento Udigrudi.

Essa coletânea reúne 19 novas interpretações para clássicos como Talismã e Mister Mistério, de Geraldo Azevedo e Alceu Valença, presente no disco Quadrafônico (1972), Allegro Piradíssimo e Amigo, de Lula Côrtes e Lailson, do icônico Satwa (1973), Não Tenho Imaginação pra Mudar de Mulher e Fidelidade, de Marconi Notaro, do lendário No Sub Reino dos Metazoários (1973), Do Amigo e Palavras, de Flávio Lira, do Flaviola e o Bando do Sol (1974), Papagaio do Futuro e Borboleta, de Alceu Valença, do Molhado de Suor (1974), Geórgia, A Carniceira e O Pirata, do LP Ave Sangria (1975), do grupo de mesmo nome, Não Existe Molhado Igual ao Pranto, Pedra Templo Animal e Nas Paredes da Pedra Encantada, de Lula Côrtes e Zé Ramalho, do álbum Paêbiru (1975), e muito mais.

Ouça gartuitamente na internet como ficaram essas canções com os novos arranjos de Tagore, Meneio, Bilhão, Primos Distantes, André Prando, Catavento, Almirante Shiva, Jan Felipe, Bike, Aeromoças e Tenistas Russas, Bombay Groovy, Alderia, Orquestra Abstrata, Bratislava, Graxa, Supercordas, Luneta Mágica, Astralplane e Vitor Brauer.

 

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