Opinião

Equívocos e erros na tradução e interpretação dos textos bíblicos

Diário da Manhã

Publicado em 19 de maio de 2016 às 01:47 | Atualizado há 9 anos

Os equívocos e os erros de tradução e consequentemente de interpretação dos textos bíblicos, são conforme fontes seguras, numerosos. Estes erros e equívocos impactaram profundamente o Cristianismo, gerando em seu ceio doutrinas, costumes e rituais distantes da realidade do que originalmente fora escrito. A Bíblia como se conhece hoje, demorou cerca de 1600 anos para ser preparada. Não há entre os historiadores acordo sobre quando a Bíblia começou a ser escrita, no entanto, conforme a tradição, ela foi produzida por mais de 40 autores entre os anos de 1500 a.C., a 450 a.C., no seu primeiro Testamento, e entre os anos de 48 d.C.,  a 96 d. C., no seu segundo Testamento. As Escrituras receberam a alcunha de Bíblia originalmente por João Crisóstomo, grande pregador e patriarca de Constantinopla entre 398 e 404 da nossa era.

A palavra Bíblia significa pequena coleção de livros, ou seja, conjunto de Escritos Sagrados para Judaísmo e Cristianismo, chegou a nós atravessando séculos por meio do povo judeu e pelos cristãos dos primeiros séculos e demais, sendo preservados e compilados por seus escribas. O termo passou por grandes mudanças, “Bíblos”  era o nome de uma antiga cidade Fenícia, famosa pela exportação de papiros. Deste nome se originou a palavra  “Biblíon”  (livro) e mais tarde  “Tá Biblía” (os livros). Este plural grego determinou o nome  “Bíblia”, que em posterior oportunidade foi traduzido para o latim como substantivo feminino singular e virou  “Bíblia”, que quer dizer “o livro”. Foi com este sentido que se difundiu para todas as línguas em que foi traduzida. Todavia, o conceito de conjunto de livros vem do hebraico “Se Faraim”, que quer dizer “os livros”, ou seja, as Escrituras Sagradas da primeira Aliança.

As línguas usadas nas Escrituras Sagradas foram o hebraico e o aramaico no Antigo Testamento. Já o Novo Testamento teria sido escrito em aramaico (somente Mateus) língua do povo hebreu à época e grego (os demais livros), que era a língua oficial do comércio quando ele foi escrito. Estas línguas são de origens diferentes, o hebraico e o aramaico são semíticas pertencentes à família das línguas afro-asiáticas. Já o grego é de origem indo-europeia do sul dos Bálcãs oeste da Ásia Menor em torno do mar Egeu. Nas traduções destas línguas se faz necessário conhecer as origens culturais dos autores; seus usos e costumes à época em que foi escrito o texto; o que o texto quer transmitir; se seu ensino é para aquele momento ou se é atemporal; se a linguagem usada é figurada, parabólica, literal ou alegórica;  se aquilo que o texto recomenda fazer ou não fazer é para aquela ou esta comunidade de pessoas; analisar pré-texto, contexto e pós-texto, fazendo um apanhado de ideias semelhantes ao longo da Bíblia para não fugir dos sentidos originais, dentre outros.

O que se pretende mostrar neste artigo é que estes parâmetros não foram respeitados desde as primeiras traduções das Escrituras. Termos, conceitos, definições, ideias, costumes e essências originais foram trocados, adaptados, adulterados, omitidos e maculados pela Septuaginta (Tradução dos LXX, do hebraico para o grego) e pela Vulgata Latina que é a tradução da tradução dos LXX ou Septuaginta e do hebraico e o Novo Testamento em grego. A Vulgata foi à única versão oficial da Bíblia usada na Igreja até o ano de 1530 A.D., quando, devido ao povo não mais falar latim, iniciou-se o processo de tradução para as línguas modernas.

Durante a tradução Jerônimo se deparou com textos difíceis de serem compreendidos, logo após a conclusão, dedicou-se a escrever prefácios e comentários para a Vulgata, além de responder às polêmicas teológicas existentes em seu tempo, devido à má tradução e interpretação. A Vulgata nasceu do desejo do papa Dâmaso em por fim as divergências que os Concílios até então não conseguiram sanar, como a natureza de Cristo, vida após a morte, o sentido original de ressurreição que majoritariamente a Igreja à época pregava como retorno do espírito à vida em um novo nascimento físico, o dízimo e ofertas, existências de anjos e demônios, céu e inferno dentre outros. Porém, em 384 A.D. Jerônimo recebe a missão por imposição do papa de preparar uma Bíblia padrão para todas as comunidades cristãs, onde desde então todas as demais traduções e versões seguiram a Vulgata que veio distorcer verdades originais.

Mas quais são os erros e equívocos na tradução do texto bíblico que mudaram os sentidos das Escrituras? Conforme fontes teológicas cristãs e judaicas são inúmeras ultrapassando o número de cinquenta mil erros de tradução e sentidos. Comecemos pelo dízimo, por exemplo. A palavra dízimo em hebraico é ma‘asér, que quer dizer décima parte, ela aparece em vários lugares do Antigo Testamento.

O primeiro exemplo é o de Abrão quando foi resgatar seu sobrinho Ló que foi levado cativo após a vitória de quatro reis contra cinco (Gn. 14), ele vence, resgata Ló e os bens que foram tomados dele e de todos os reis derrotados. Saiu ao seu encontro levando comida e água na volta vitoriosa, Melquisedeque rei de Salém e sacerdote do Deus Altíssimo, abençoa Abrão e louva a Deus pela vitória. Por estes motivos e pelo costume da época Abrão dá a décima parte dos despojos ao rei e sacerdote que o encontrou com comida, pão e vinho. Portanto, um costume dos antigos cananeus e palestinos, não é um mandamento expresso da Lei de Deus é um costume, um respeitoso hábito. Abraão viveu cento e setenta e cinco anos (Gn. 25: 7) e esta foi à única vez que deu dizimo por respeito à tradição daquela terra.

Observemos que Abrão “deu dízimo”, em hebraico é “Vayyitten lô ma‘asér”, “e deu para ele dízimo de tudo” (Gn. 14:20). Ele não “devolveu” ele “deu”, o conceito e o costume bíblico neste caso é o de dar e não devolver, esta tese de devolver dízimo não é bíblica ela é motivada pelo senso de enriquecimento e aquisição de poder pela alienação e manipulação. É um grande erro pregar a devolução do dízimo, pois se pode perceber neste primeiro exemplo que o ato de dar um décimo dos despojos de guerra foi voluntário e em respeito à tradição daquela terra. Na próxima parte deste artigo continuaremos com outros exemplos bíblicos de dízimo (Continua…).

 

(Professor Nilton Carvalho, cabeleireiro, teólogo, historiador, pós-graduado em Educação pela PUC-GOIÁS, escritor e conferencista. Contato para palestras e outros [email protected] 062-9987-9969)


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