Conheça o juiz Sérgio Moro
Diário da Manhã
Publicado em 14 de março de 2016 às 23:57 | Atualizado há 9 anosAcabo de reler, no DM do último dia 10 de março, o lúcido artigo “Operação Mani Pulite (mãos limpas)”, da colega advogada e escritora Silvana Marta, que merece ser emoldurado e colocado na parede. E inspirado nele resolvi produzir esta página.
Neste momento, em que precisamos passar o Brasil a limpo, desponta a figura do juiz federal Sérgio Fernando Moro, como espécie de paladino da Justiça. Mas poucos sabem tratar-se de magistrado preparado, destemido e sobretudo disposto a sustentar luta renhida contra a corrupção.
Vozes isoladas, mas renitentes, buscam desmoralizar o grande magistrado, vinculando-o ao PSDB, para esvaziar sua atuação, e as redes sociais andam divulgando entre os fanáticos petralhas uma suposta certidão de sua filiação àquele partido.
Mas o achaque não resiste a uma simples consulta ao site do TSE: a certidão é verdadeira, mas se refere a outra pessoa e de outra cidade: O nome do juiz é Sergio Fernando Moro e é de Maringá. No documento do TSE o filiado chama-se Sergio Roberto Moro, filiado em São José dos Pinhais. Para quem imagina que se trata do pai do juiz, está errado, pois ele se chama Dalton Áureo Moro. Mais um expediente escuso criado com o objetivo de induzir a falsas conclusões e desmoralizar a “Operação Lava Jato”. Antes, já quiseram desmoralizá-lo, dizendo que sua esposa era assessora de um político do PSDB, no claro intuito de comprometer sua imparcialidade.
Quem acompanha a atuação do juiz federal Sérgio Moro, deve observar que ele é reconhecido como técnico, centrado, linha-dura e reservado. Titular da 13ª Vara Federal de Curitiba, especializada em lavagem de dinheiro, aonde chegou precedido de uma vitoriosa carreira, sem qualquer mácula, calcada na competência profissional, que expôs todo o esquema de lavagem e corrupção com ramificações na Petrobras e em partidos políticos, é visto como independente por colegas de toga e procuradores, magistrado com ares de justiceiro para advogados, entre adjetivos pinçados com afetos e desafetos, frequenta com a família bons restaurantes, foge de colunas sociais e evita comentários sobre sua vida pessoal, andando sempre escoltado por seguranças.
Com um ano de formado, passou no concorridíssimo concurso da Justiça Federal, tornando-se juiz federal, atuando sempre na área da 4ª Região (iniciou a carreira em Curitiba, passou por Cascavel e Joinville, até regressar à capital paranaense, de cuja 13ª Vara é titular). Doutor em Direito e professor da UFPR, estudou em Harvard e participou de programa do Departamento de Estado norte-americano, com visitas a agências que combatem a lavagem de dinheiro. Moro se acostumou com intrincados processos, como o caso Banestado. Em Brasília, fala-se que o deputado André Vargas (sem partido) luta desesperadamente pelo mandato para manter o foro privilegiado e escapar da caneta do magistrado, que já mandou prender 123 pessoas de uma só vez, em 2004.
Elogiado por alunos, é protocolar com os professores. Entrou em atrito com os colegas em 2012, quando auxiliou a ministra Rosa Weber no julgamento do “mensalão”. Dedicado ao trabalho, Moro redige pessoalmente as decisões que assina, destrincha documentos, ouve as escutas telefônicas, incentiva técnicas como delação premiada, infiltração de agentes e quebras de sigilos, como formas de encontrar a “verdade real”. Neste afã, advogados dizem que revela inclinação “acusatória”. Já o criminalista Luciano Feldens prefere destacar o cuidado do juiz na condução dos processos, com raros equívocos, tanto que raramente tem uma decisão reformada. Ficou famosa a queda de braço com o STF na Lava Jato, quando, em maio do ano passado, o ministro Teori Zavascki decidiu por relaxar a prisão do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa, e Moro enviou a Zavascki ofício e alertou para o risco de fuga. Costa acabou detido outra vez.
Integrante da primeira geração de juízes lotados em varas especializadas em lavagem de dinheiro, desde 2003, Moro virou referência quando se trata de crime financeiro. A experiência e a vida acadêmica renderam o livro “Crime de Lavagem de Dinheiro” (Editora Saraiva), um dos mais citados no julgamento do “mensalão”.
No longo artigo “Considerações sobre a Operação Mani Pulite”, a notória “Operação Mãos Limpas”, que publicou em 2003, sobre a operação que limpou a Itália, prendeu corruptos, provocou suicídios e fechou partidos, ele declarou: “(…) a ação judicial não pode substituir a democracia no combate à corrupção. É a opinião pública esclarecida que pode, pelos meios institucionais próprios, atacar as causas estruturais da corrupção. (…) a punição judicial de agentes públicos corruptos é sempre difícil, se não por outros motivos, então pela carga de prova exigida para alcançar a condenação em processo criminal. (…) a opinião pública pode constituir um salutar substitutivo, tendo condições melhores de impor alguma espécie de punição a agentes públicos corruptos, condenando-os ao ostracismo (…) A gravidade da constatação é que a corrupção tende a espalhar-se enquanto não encontrar barreiras eficazes. O político corrupto, por exemplo, tem vantagens competitivas no mercado político em relação ao honesto, por poder contar com recursos que este não tem. Da mesma forma, um ambiente viciado tende a reduzir os custos morais da corrupção, uma vez que o corrupto costuma enxergar o seu comportamento como um padrão e não a exceção.”
Ele se preparou para mudar o Brasil; e perceba o leitor que ainda estamos no começo da “Lava Jato”.
Além da “Operação Lava Jato”, o juiz também conduziu o caso Banestado, que resultou na condenação de 97 pessoas, atuou na “Operação Farol da Colina”, onde decretou a prisão temporária de 103 suspeitos de evasão de divisas, sonegação, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro – entre eles, Alberto Youssef. Na “Operação Fênix”, em 2007, Moro decretou a prisão de 11 pessoas ligadas a Fernandinho Beira-Mar. No caso do escândalo do “Mensalão”, a ministra do Rosa Weber decidiu convocá-lo para auxiliá-la, devido a sua incontestável especialização em crimes financeiros e no combate à lavagem de dinheiro.
Em 2014, Moro foi indicado pela Associação dos Juízes Federais do Brasil para concorrer à vaga deixada por Joaquim Barbosa no STF, que foi preenchida por Luiz Fachin (não convinha ao Planalto substituir Joaquim Barbosa por outro de igual tendência). Foi eleito o “Brasileiro do Ano de 2014” pela revista “Isto É” e um dos cem mais influentes do Brasil em 2014 pela revista “Época” Na décima segunda edição do “Prêmio Faz Diferença” do jornal “O Globo”, foi eleito a “Personalidade do Ano” de 2014 por seu trabalho frente às investigações da Lava Jato.
Em atitude pioneira, Moro, contrariando a velha história de que “rico não vai para a cadeia”, no último dia 8/03/2016, condenou à prisão por quase vinte anos Marcelo Odebrecht, presidente de uma das maiores multinacionais da construção civil, coisa impensável até há poucos anos. Políticos e magnatas envolvidos em corrupção deve botar as barbas de molho, pois Marcelo é o quarto presidente de grandes empreiteiras a pagar pela corrupção. E nós, cidadãos comuns, começamos a lavar a alma.
O povo não vai permitir que, passados mais de dois mil anos, uma corja de bandidos queira crucificar um outro redentor.
O “crime” de Jesus até hoje não foi tipificado, e o de Moro é simplesmente tentar passar o Brasil a limpo.
(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, escritor, jurista, historiador e advogado, [email protected])