Cultura

Paralamas celebram carreira em show na Capital goiana

Marcus Vinícius Beck

Publicado em 28 de fevereiro de 2024 às 01:13 | Atualizado há 4 meses

Antes de tudo, transparência: nunca morri de amores pelos Paralamas do Sucesso. Para ser mais específico, meu descontentamento crescia naquilo que entendia como guitarra mirrada, baixo tímido e letras bobinhas (“Vital comprou uma moto/ e passou a se sentir total”), embora a bateria fosse o elemento sonoro mais marcante da música do trio Herbert Vianna, Bi Ribeiro e João Barone. “Mais Rolling Stones, menos The Police”, eu esbravejava.

Era justo pensar assim? Intelectualmente honesto? Esteticamente digno? Sonoramente interessante? Ou um adolescente, entre quinze e dezesseis aninhos, pode dar-se ao direito de ulular que andava tão doooowwwnnnn, ééééééé, como se ele fosse um elepê parado na arranhada segunda faixa do primeiro disco do Barão Vermelho, sua banda predileta?


Este texto é, em parte, para dizer a você que eu estava equivocado, em parte para informar que, quem quiser curtir o som dos caras, aí é fácil, deve se programar para assistir Herbert, Bi e João no Goiânia Arena no sábado, 9, como uma das atrações do “Um Festival”. O show da banda carioca está previsto para começar por volta das 21h30, mas é bom sair antes de casa, do bar ou de qualquer lugar: em festival, a gente sabe, a programação sempre pode mudar.

A primeira coisa importante a respeito dos Paralamas é que a mestiçagem os levou a uma carreira internacional. “Como nenhuma outra jamais tivera”, enfatiza o jornalista Arthur Dapieve, no livro “BRock: O Rock Brasileiro dos Anos 80”, perfil dessa geração roqueira oitentista. Faço coro ao que disse Liminha, produtor do disco “Selvagem?”, chave na discografia do grupo, a quem “os Paralamas vinham numa rota de muito sucesso (…) e de repente eles deram uma guinada radical”. “Foi uma atitude madura”, atesta, em depoimento ao jornalista e sociólogo Mario Luis Grangeia, autor de um livro sobre o álbum.

Só que “Selvagem?” – e eis a segunda coisa importante sobre os Paralamas – é o terceiro disco lançado pelo grupo. O primeiro elepê, “Cinema Mudo”, de 1983, trouxe o roquinho “Vital e Sua Moto”, numa versão com coro dos Golden Boys, mas sem um motor (!) que a gravadora EMI queria enfiar na música, além de “Patrulha Noturna”, “Química” e uma homenagem à avó de Bi, “Vovó Ondina é Gente Fina”. Contudo, o resultado não agradou Herbert, Bi e João, que consideraram o disco mal gravado e longe da estética new wave que queriam.


		Paralamas celebram carreira em show na Capital goiana

Anos 80: banda trouxe brasilidade à linguagem roqueira.

Marcus Vinícius Beck


Não bastassem os desvios conceituais, o produtor Marcelo Sussekind encheu o álbum de confetes, o que contribuiu para deixá-lo longe das apresentações ao vivo, perigosamente frio e anacronicamente “desnewavizado”. Em conversa com o pesquisador Ricardo Alexandre, na obra “Dias de Luta: O Rock e o Brasil dos Anos 80”, Herbert lembrou que o tempo no estúdio ficara marcado pelas interjeições de Sussekind: “era um tal de ‘vamos dobrar a guitarra’, ‘vamos botar mais um solo’, ‘um reverb na caixa’ que o disco foi um fiasco.”

Apenas em “O Passo do Lui”, de 1984, o grupo recebeu o registro fonográfico que há muito merecia. Em músicas como “Óculos”, “Meu Erro” e “Romance Ideal”, hits eternos do grupo carioca de raízes fincadas em Brasília, ouve-se uma cozinha entrosada, com acordes econômicos na guitarra e algumas das composições pelas quais os Paralamas viriam a ser considerados essenciais: “Ska”, “Me Liga”, “Assaltaram a Gramática”, esta última, veja você, uma parceria improvável entre o hitmaker Lulu Santos e o poeta marginal Waly Salomão.


		Paralamas celebram carreira em show na Capital goiana

Capa do disco “O Passo de Lui”.

Foto: Divulgação


Se os riffs lembravam o guitarrista Andy Summers, responsável pelas dançantes seis cordas elétricas do The Police, é certo que a banda inicia aqui jornada à procura de um sotaque brasileiro para o rock. Tamanho sucesso ainda carimbou, com duas datas, o passaporte do trio para se apresentar no primeiro Rock in Rio, em janeiro de 1985, onde Herbert se revoltara contra vaias emitidas por fãs de AC/DC, Iron Maiden e Ozzy Osbourne. “Em vez de vir jogar pedra, fica em casa aprendendo a tocar guitarra. Quem sabe no próximo festival você está aqui no palco”, sapecou, defendendo Kid de Abelha e Eduardo Dusek.

Percebam como Herbert é o cara. Mesmo que um dos maiores guitarristas de sua geração e diretor musical de uma banda com relevância internacional, ele ainda não obteve o devido valor como instrumentista, ainda que seu solo em “Lanterna dos Afogados” – de tradição melódica à moda Carlos Santana – seja um dos mais bonitos já gravados na nossa música. Afora seus dotes guitarrísticos, por pouco – por um triz, na verdade – a vida não lhe escapou, em fevereiro de 2001, após sofrer acidente de ultraleve que o deixara paraplégico.

Ao mesmo tempo em que segue na guitarra tradição consagrada por Jimi Hendrix e o rock pesado do Led Zeppelin, Herbet se mostra, em praticamente toda sua obra, um letrista sintonizado às causas sociais. Como demonstra no rock pulsante “Selvagem?”, por exemplo: “o governo apresenta suas armas/ discurso reticente, novidade inconsistente/ e a liberdade cai por terra/ aos pés de um filme de Godard”. Ou no reggae grooveado “Teerã”: “E as marcas de sangue no chão/ São lembranças difíceis de apagar.” O que dizer do samba-rock “Alagados”? “Alagados, Trenchtown, Favela da Maré/ A esperança não vem do mar.”


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Paralamas colocaram os tijolos finais no terreno da latinidade, entre anos 80 e 90.

Maurício Valladares/ Divulgação


Nos próximos discos, os Paralamas colocaram os tijolos finais no terreno da latinidade, o que se nota em discos como “Os Grãos”, de 1991, “Severino”, 1994, “Nove Luas”, 1996, e “Hey Na Na”, 1998. No primeiro álbum, na faixa “Trac Trac”, destaca-se a participação do cantor portenho Fito Páez, um dos principais nomes do rock argentino. E excursões pela América Latina e pelos EUA deram notoriedade ao trio brasileiro lá fora, que se apresentou no tradicional Festival de Montreux. Errado estava eu. Paralamas do Sucesso são f…

Um Festival Goiânia

Sábado, 9

Abertura dos portões: 15h

Goiânia Arena

Fued José Sebba, Jardim Goiás

Paralamas – 21h30

Nando Reis – 23h30

Ira! – 19h30

CPM 22 – 18h

Raimundos – 16h30

Ingressos a partir de R$ 70

Pelo app Ticket 360

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