A necessidade de reservar 0,6% do PIB (Produto Interno Bruto) do Orçamento de 2025 para investimentos públicos abriu um impasse dentro do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O Ministério do Planejamento e Orçamento quer permitir o uso de até metade da reserva de emendas parlamentares para alcançar o montante obrigatório, que hoje ficaria em torno de R$ 74 bilhões, mas a ideia enfrenta resistências do Palácio do Planalto.
Na prática, contabilizar as emendas no piso dos investimentos reduz a pressão sobre o Executivo, que poderia destinar menos recursos a essa finalidade.
O Planejamento vê nisso uma fonte de alívio para a gestão fiscal, sobretudo em um contexto de avanço das despesas obrigatórias. Representantes do Ministério da Fazenda também veem a proposta com simpatia.
Já o Planalto critica a ideia justamente pela perspectiva de redução de verbas próprias para obras federais, o que poderia afetar o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), uma das prioridades de Lula para ajudar a impulsionar a economia.
O argumento da ala política é que os gastos com emendas são pulverizados, destoando do propósito original da regra incluída no novo arcabouço fiscal, que é preservar os gastos de maior qualidade e com impacto econômico positivo, como seriam os investimentos estruturantes.
Auxiliares de Lula almejam usar o piso exclusivamente para fortalecer o PAC, coordenado pela Casa Civil, e outras ações do Executivo, como foi feito em 2024.
A proposta orçamentária original previa R$ 69,7 bilhões para investimentos, pouco acima do piso de R$ 68,5 bilhões exigido pelo novo arcabouço fiscal. A estratégia foi combiná-lo com outras regras de aplicação obrigatória —por exemplo, investindo em Saúde ou Educação para atender a dois pisos ao mesmo tempo.
Para esse grupo, o "caminho mais fácil" é passar a contabilizar as emendas, mas isso também significaria lançar um PAC bem mais enxuto em 2025.
O Planalto não vê isso com bons olhos e teme se equiparar ao nível de investimentos dos governos Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL), alvos de críticas dos petistas.
Na equipe econômica, a avaliação é que, diante do crescimento de outras despesas obrigatórias, "a realidade vai se impor".
Para o ano que vem, a reserva para as emendas individuais e de bancada pode ficar na casa dos R$ 43,6 bilhões, considerando a atual projeção para a RCL (Receita Corrente Líquida) de 2024. A Constituição fixa a reserva para essas despesas em 3% da RCL do ano anterior.
Pelas diretrizes atuais, o governo teria de cumprir as duas regras de forma compartimentada —ou seja, quase R$ 120 bilhões em gastos engessados por regras fiscais, sem contar outros carimbos, como os pisos de Saúde e Educação.
Se o dispositivo for aprovado, poderia haver uma interseção entre os valores, reduzindo a pressão sobre o Orçamento.
A ala política quer que essa combinação se dê dentro do próprio Executivo, entre investimentos de Saúde e Educação.
A ideia de usar parte da reserva de emendas para cumprir o piso de investimentos que foi incluída na minuta do PLDO (projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2025, que está em fase final de discussão dentro do governo. A informação foi revelada pelo jornal Valor Econômico.
A Constituição Federal já determina que metade das emendas individuais seja direcionada a ações e serviços públicos de saúde, o que ajuda a cumprir o piso da área. Em 2022, o governo Bolsonaro passou a incluir no PLDO a possibilidade de usar também as emendas de bancada para esse fim.
Agora, na gestão Lula, o Planejamento quer prever que "no máximo a metade dos valores destinados às reservas previstas no § 5º [emendas individuais e de bancada] poderá ser considerada para fins de cumprimento do art. 10 da Lei Complementar nº 200, de 2023, quando da elaboração do Projeto de Lei Orçamentária de 2025". O artigo em questão é o piso de investimentos instituído pelo novo arcabouço fiscal.
Neste ano, 41,8% dos R$ 33,6 bilhões em emendas individuais e de bancada estão enquadradas como investimentos na classificação orçamentária.
Por isso, técnicos do Planejamento avaliam que "faz sentido" considerar até metade da reserva para o cumprimento do piso, embora a destinação efetiva para investimentos ocorra só na apreciação do Orçamento pelo Congresso Nacional.
A autorização na LDO neste caso é necessária porque a lei do arcabouço exige o cumprimento do percentual mínimo em investimentos em dois momentos: não só na aprovação do Orçamento, mas também no envio da proposta pelo Executivo (quando ainda não há detalhamento das emendas).
Além disso, a regra só incluiu no piso dois grupos de despesas, os investimentos propriamente ditos e os aportes no FAR (Fundo de Arrendamento Residencial), que executa as obras do Minha Casa, Minha Vida.
As emendas, por sua vez, têm um código distinto enquanto estão em uma reserva, fora do escopo do piso.
Além dos entraves técnicos, fontes do governo admitem que há risco político em usar as emendas para cumprir o piso de investimentos.
Se os parlamentares não aceitarem o carimbo prévio e derrubarem o dispositivo da LDO antes do envio do Orçamento, em 31 de agosto, isso colocaria o governo diante do problema de origem, que é acomodar todas as regras dentro do limite de despesas do novo arcabouço fiscal.
Em outro cenário, caso as emendas destinadas a investimentos fiquem abaixo do que o governo incluiu no piso de investimentos, isso também demandaria ajustes de última hora nas programações para 2025.