Carla Monteiro
A Cabralina que fidelizou o coração do reservado Alfredo Nasser foi se encontrar com o seu amor hoje pela manhã. Maria Cabral Arantes tinha 92 anos e uma saúde extremamente frágil. Nos últimos meses estava sob os cuidados do seu filho mais velho, o Francisco, depois de um severo AVC. Seus quatro filhos, seis netos, duas noras, irmãs, sobrinhos e uma infinidade de amigos e admiradores estão em prantos. O meu coração chora, porque faleceu não apenas uma amiga e confidente querida, mas uma porção romântica e solidária da história goiana.
Maria Cabral, ao lado de Rezende Monteiro, batizou o Fabio Nasser, irmão de Júlio Nasser e filho de Consuelo Nasser e Batista Custódio. Maria era o arquivo sentimental e improvisado de Alfredo Nasser. A sua confidente, a qual chamava de ‘amada e silenciosa presença’. Ela foi o mais estranho e secreto amor dos últimos 20 anos da vida de Alfredo Nasser. “Muitos colecionam selos ou isqueiros. Eu coleciono Nasser”, justificava-se, em tom de brincadeira. Sem saber, resgatou Alfredo Nasser de uma segunda morte, esta mais dolorosa, o ostracismo histórico e o desaparecimento, sem vestígios, da sua trajetória política e literária.
O altruísmo de Maria era tão graúdo que ela conseguiu formar um lindo núcleo familiar a partir dos cestos que lhe eram deixados à porta. Amou a cada um com a força de um grande terremoto, mas envolto em uma suave brisa matinal. Maria era meiga. Incapaz de palavras ásperas. Socorria a quem lhe solicitasse. Sempre de modo abnegado. Foi assim com sua mãe e o seu irmão Jeová. Ajudou a irmã Veneranda, com os filhos, apegando-se de modo especial ao José Luiz Bittencourt, que dormia apenas em seus braços. Não conseguiu contar uma história que desabonasse quem quer que fosse. Não existia pessoa ruim, ou desagradável, para Maria Cabral. Todos tinham suas batalhas e devíamos respeitar, ensinava ela. Nas maiores dificuldades, ela sorria. Aliás, a amiga fiel e devotada de Consuelo Nasser, a quem sempre teve por irmã, nunca considerou dificuldades na vida que a dissuadisse de palmilhar silenciosamente, envolta por sua doçura e espírito solidário, o caminho traçado. Como é revigorante poder fitar-lhe o semblante e confirmar que o seu coração partiu sereno. Maria Cabral, a Cabralina, como eu sempre a chamei, deixa saudade. Mas nos presenteia com lindas lembranças. Agradeço a Deus por ter permitido que um anjo viesse habitar entre nós. Obrigada Maria Cabral por ter me consentido privar da sua afável companhia.