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A dura realidade do trabalho infantil doméstico

O trabalho doméstico é uma das formas mais comuns e tradicionais de trabalho infantil e está entre as piores formas de ocupação a que se pode submeter crianças e adolescentes. São atividades que, mesmo realizadas no âmbito do lar, violam direitos de crianças e adolescentes à vida, à saúde, à educação, ao brincar, ao lazer e ainda acarretam prejuízos que comprometem o seu pleno desenvolvimento físico, psicológico, cognitivo e moral.

O trabalho infantil doméstico no Brasil é exercido, em maioria, por meninas negras. Crianças e adolescentes do sexo feminino são 94% das ocupadas no serviço doméstico, enquanto 73% delas são negras. O levantamento é do Fundo Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI).

Mesmo na ausência de estatísticas mais precisas, estima-se que pelo menos 200 mil crianças na faixa etária dos 5 aos 13 anos suportam obrigações típicas de adultos, em prejuízo de seu desenvolvimento físico e social, seja em suas próprias casas ou, como é mais frequente, em casa de terceiros.

A dona de casa Maria Lina Barbosa, 40 anos, foi um exemplo deste tipo de exploração infantil em Goiás. Com o sonho de trabalhar e estudar, ela saiu do interior do Tocantins e mudou-se para Goiânia com 15 anos. “Eu não tinha onde ficar e queria trabalhar e estudar. Encontrei uma mulher que quis me ajudar, ela ia me dar moradia e em troca eu trabalhava na casa dela. Eu fazia de tudo como uma empregada, mas não recebia nada. Ela me maltratava e me humilhava, uma vez chegou até a raspar meu cabelo por dizer que eu não podia ter um cabelo liso já que as filhas delas não tinham. Eu também só jantava se a comida sobrasse e não podia comer junto com ninguém", relata.

Considerado pelo decreto n. 6481/2008 como a pior forma de trabalho infantil, a atividade doméstica ainda é desempenhada por milhares de crianças e adolescentes. “O que é mais grave é que esse número não expressa a realidade. Há aí uma subnotificação. Então, certamente o universo de crianças e adolescentes que estão no trabalho infantil é maior, mais preocupante ainda”, pondera a secretária do FNPETI.

Barreira cultural

Ainda hoje o trabalho infantil doméstico se confunde com solidariedade e relacionamento familiar em lares brasileiros. É muito comum a divisão do trabalho na cidade ou na fazenda se estender à figura do “afilhado” ou “filho de criação”, geralmente o filho do empregado ou do parente mais pobre que vai à cidade para “ter mais oportunidades” e cuidar da casa e das crianças da família.

“Infelizmente, uma boa parcela da população, as famílias e as próprias crianças e adolescentes envolvidos no trabalho infantil não identificam essa tarefa doméstica como um trabalho. Ainda persiste aquela compreensão de que a menina está ajudando, seja na própria casa ou na casa de terceiros. Então, não há uma compreensão de que é um trabalho infantil e, ainda menos, compreende-se tratar-se de uma das piores formas do trabalho infantil”, afirma Isa Maria.

Riscos

A Organização Internacional do Trabalho (OIT) cita ainda como os riscos mais comuns presentes na vida dessas crianças a submissão a jornadas longas e muito pesadas de trabalho, salários baixos ou inexistentes e uma grande vulnerabilidade ao abuso físico, emocional ou sexual.

A defasagem escolar de crianças que fazem serviço doméstico também é muito acentuada. Estudo de pesquisadores das Universidades Federais da Paraíba e de Pernambuco publicado na revista Psicologia e Sociedade em 2011 mostrou que 80% das crianças que faziam trabalho doméstico já tinham sido reprovadas; metade dessas crianças atribuíram as dificuldades de desempenho a dificuldades de relacionamento ou adaptação, e 26% delas citaram expressamente o trabalho como fator principal.

No Brasil, até os 13 anos de idade, qualquer trabalho é proibido pela Constituição Federal. Entre 14 e 15 anos, a participação em programas de aprendizagem profissional é admitida, desde que o jovem continue na escola. A partir dos 16 anos, o trabalho é permitido com carteira assinada, desde que não seja no período noturno, em função perigosa ou em local insalubre.

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