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COTIDIANO

O nióbio é nosso!

Quem primeiro levantou a questão foi o finado deputado federal Enéas Carneiro, do Prona. Por causa do seu estilo de fazer política e de falar, Enéas nunca foi levado a sério pela grande imprensa e pelas elites políticas, à direita ou à esquerda. A questão do nióbio, que Enéas considerava de importância capital para o desenvolvimento autônomo do Brasil, nunca esteve na ordem do dia.

Recentemente, o deputado Jair Bolsonaro, do PSC carioca, subiu à tribuna da Câmara dos Deputados para alertar o País sobre a importância estratégica deste minério. Chegou a visitar uma mineradora que opera em Araxá, Minas Gerais, a CPMM, dos Moreira Salles.

Agora, mais recentemente, foi criada, na Câmara dos Deputados, uma “Frente do Nióbio”, um bloco suprapartidário que pretende lutar em defesa desta importante riqueza brasileira que vem sendo pilhada por estrangeiros. A frente foi lançada há um ano por iniciativa do deputado gaúcho Giovani Cherini, do PDT.

O que levaria um pedetista gaúcho, nacionalista e de centro-esquerda, a unir-se, ainda que informalmente, a um capitão de artilharia, Bolsonaro, que é tido como a mais saliente voz da extrema direita brasileira?

Por mais que Enéas e Bolsonaro estejam identificados com ideias retrógradas e que fizeram e fazem do antiesquerdismo a marca registrada de seus discursos, eles enveredaram por um tema que deveria ser caro às esquerdas brasileiras, onde a abordagem nacionalista dos problemas brasileiros tem lugar de destaque.

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O que é

Nióbio é um metal muito leve que ocorre, comprovadamente, em apenas dois lugares do mundo, apesar de todas as tentativas feitas até aqui para descobri-lo em outras partes. Haveria, em tese, jazidas de nióbio no Quênia, ainda não confirmadas. O Canadá detém 2% das reservas conhecidas. Os outros 98% estão no Brasil, distribuídos por cinco Estados brasileiros: Amazonas, Bahia, Goiás, Minas Gerais e Rondônia. Apenas na Bahia o mineral ainda se acha em fase de pesquisa. Nos demais, as jazidas estão em franca exploração. O nióbio goiano está localizado em Catalão e Ouvidor, na forma de um minério chamado pirocloro. Nos demais, ele é extraído na forma denominada columbita.

O Brasil é o único exportador de nióbio do mundo, pois o Canadá proibiu sua venda ao exterior. Trata-se um mineral altamente estratégico para o país, daí a proibição de sua exportação. Já o Brasil não só exporta, desde 1950, todo o nióbio que produz como também o vende a preço de banana, e ainda permite que o minério produzido nos Estados amazônicos seja contrabandeado através de nossas fronteiras secas.

Por uma dessas coisas misteriosas que só acontecem no Brasil, o preço do nióbio é fixado pela bolsa de minérios de Londres. É algo fantástico, levando em conta que o Brasil, sendo o único exportador, não tendo concorrente no mercado, renuncie à sua prerrogativa de impor o preço da mercadoria. Mas isto acontece.

Os Estados Unidos da América é o maior comprador do nióbio brasileiro, com efeito. Se vamos fantasiar um pouco, o Brasil embargasse a venda de nióbio para os americanos, em pouquíssimo tempo a economia daquele país entraria em colapso.

Mas, afinal, para que serve o nióbio, e por que é tão importante para a moderna economia capitalista? Sem nióbio não haveria turbinas de aviões, não haveria foguetes espaciais, não haveria aparelhos de exame por ressonância magnética, não haveria oleodutos e gasodutos de longo alcance, não haveria certos componentes de computadores, não haveria ferrovias de trilhos soldados em peça única. Não haveria um punhado de outras coisas. Atualmente, as indústrias automobilísticas da Alemanha e dos Estados Unidos vêm desenvolvendo motores de alta performance e chassis para carros superesportivos feitos com ligas de nióbio.

Nióbio é o elemento mais resistente à oxidação. Mais ainda: aços contendo menos de 5% de nióbio em sua composição resistem a temperaturas superiores a 2 mil graus centígrados sem apresentar dilatação. É por isso que o nióbio é imprescindível na indústria aeronáutica, que o emprega na confecção de câmaras de combustão de motores a jato.

Preço praticamente imbatível

A discussão sobre o subfaturamento das vendas de nióbio, sob os royalties e o valor de mercado, além da ausência de controle do preço do minério, já vem ocorrendo nos meios políticos, conquanto timidamente, desde 2005, quando Marcos Valério afirmou na CPI dos Correios que o Banco Rural andou conversando com José Dirceu a respeito de uma mina de nióbio do Amazonas. Enéas Carneiro (1938-2007) afirmou que só a riqueza produzida pelo nióbio brasileiro poderia compor a parte mais substancial do PIB, que em 2007 foi de R$ 2,6 trilhões. Em 2010, vazou um documento pela Wikileaks que falava das minas de nióbio no Brasil como recursos estratégicos e imprescindíveis para os Estados Unidos da América.

Elmer Salomão, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Pesquisa Mineral–ASPM comentou a respeito das denúncias: “Nosso nióbio tem um preço praticamente imbatível e se ele for elevado, outras jazidas no mundo todo entrarão em produção”. O exemplo dado em reforço deste argumento é a China. Quando decidiu reduzir a oferta e aumentou o preço das terras-raras, acarretou o surgimento de 50 novos projetos de produção desses bens minerais.

Salomão adverte: “O setor mineral tem contribuído para os investimentos no país e para o superávit da balança comercial, e não deve ser utilizado como combustível ideológico para políticas intervencionistas. Se o Brasil não está aproveitando hoje suas riquezas minerais como deveria é porque não tem uma política industrial nesse sentido. O que não podemos fazer é guardar toneladas de minério sem saber se no futuro isso será tecnologicamente utilizado ou não. Somos obrigados a aproveitar os nossos recursos minerais justamente devido à revolução tecnológica. A idade da pedra não acabou por causa da pedra, mas porque a pedra foi substituída por outra coisa”

A posição de Elmer Salomão coaduna-se com interesses empresariais. Para os exploradores de minérios, o que importa é vendê-los, mesmo in natura. O argumento de que a elevação do preço do nióbio iria estimular a busca por novas jazidas, em outros lugares do mundo, baseia-se na lógica imediatista de mercado. Ocorre que, mesmo que se descobrissem novas jazidas fora do Brasil, elas teriam que gerar uma oferta superior à brasileira para dominarem o mercado. Vender a preço vil, de resto, é malbaratar uma vantagem competitiva que não tem perenidade. Minério dá somente uma safra.

Pesquisas

Do ponto de vista estratégico, o que mais importa não é exportar nióbio in natura, mas agregar valor ao minério. Com efeito, o Brasil exporta nióbio na forma de minério para importá-lo na forma de turbinas de jatos, trilhos de ferro, dutos, semicondutores etc. Com as reservas que possui, poderia converter-se em grande exportador de produtos a base de nióbio. Como é o caso do Canadá, que é um dos seis únicos países do mundo que fabricam turbinas de avião.

Algumas universidades brasileiras, como a USP, a Unesp e a UFRJ vêm pesquisando as propriedades do nióbio, a fim de desenvolver tecnologias no setor de supercondutores, na geração e transmissão de energia elétrica, no sistema de transporte e na mineração, sendo amplamente empregados na construção de equipamentos químicos, mecânicos, aeronáuticos, biomédicos e nucleares.

Com os objetivos de aumentar o valor agregado e o consumo do nióbio tiveram início as primeiras pesquisas com a fundação do Programa de Engenharia Metalúrgica e de Materiais no Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia, em 1967. O Projeto Nióbio, do Departamento de Engenharia de Materiais – Demar, da Escola de Engenharia de Lorena, da Universidade de São Paulo, esteve de 1975-1976 sob comando de José Walter Bautista Vidal, que foi secretário de tecnologia industrial do então Ministério da Indústria e do Comércio do Brasil e se destacou pela defesa intransigente das riquezas minerais do Brasil.

Em 2009, o trabalho de pesquisa da UFR obteve uma patente internacional para uma tinta anticorrosiva a base de nióbio num processo denominado niobização. Em 2013 o Projeto Nióbio desenvolveu os diagramas de fases para os elementos nióbio (Nb), cromo (Cr) e boro (B).

O nióbio brasileiro pode ser usado como grande ferramenta para o desenvolvimento do Brasil, um país que demanda por uma vasta malha ferroviária, por gasodutos e oleodutos. Um país que tem um vasto litoral e que, a despeito disso, já não possui indústria naval. Um país que tem uma indústria aeronáutica de prestígio internacional, mas que ainda não fabrica motores a jato, apesar desse tipo de motor ser bem menos complexo do que o motor a pistão.

Apesar de o país possuir esta riqueza, não há por parte dos governos qualquer interesse em colocá-la a serviço do país. Não existe qualquer abordagem específica para o nióbio dentro das discussões sobre o novo marco regulatório da mineração. A oferta de nióbio está praticamente toda nas mãos das duas gigantes multinacionais privadas que operam no país. Inexiste a articulação de uma política de desenvolvimento de um parque industrial nacional consumidor de nióbio. Apesar de as exportações de nióbio contribuem para o superávit da balança comercial e o metal ser, hoje, o 3º item mais importante da pauta mineral de exportação, ninguém jamais cogitou em tratar o assunto como questão de segurança nacional.

A grande imprensa brasileira, hipnotizada por dogmas neoliberais e defensora intransigente do capital estrangeiro, não dá a menor importância ao tema. Uma política pública para o nióbio brasileiro chega a ser combatida pela grande mídia como fantasia nacionalista de velhos nostálgicos do dirigismo estatal. Enquanto isso, o país vai abrindo mão de uma riqueza que, juntamente com outras potencialidades do nosso solo, poderia erradicar a pobreza no Brasil e assegurar ao nosso país um desenvolvimento autônomo. Junto com o nióbio que vai saindo do país a preço de banana, vai também escorrendo pelo ralo do entreguismo a soberania nacional.

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