“E, abrindo Pedro a boca disse: Reconheço por verdade que Deus não faz acepção de pessoas” (Atos, 10:34). O versículo ilustra o que Fagner Brandão, bacharel em teologia, professor de história e pastor na igreja Caminho da Inclusão, prega para seus fiéis.
A igreja, que completa sete anos em Goiânia no próximo dia 25 de junho, é pioneira ao agregar um público que normalmente sofre preconceito social e religioso.
Localizado em Campinas, o templo tem seus cultos aos domingos às 19h e aos sábados os grupos familiares são realizados nos lares dos fiéis e nas quartas-feiras há orações e pedidos de intercessão.
A liturgia - palavras de fé, orações, hinos, canções gospeis e rituais religiosos - neopetencostal é seguida como em qualquer denominação nesse estilo e o que diferencia a Caminho da Inclusão são as pessoas que a procuram.
Pessoas que buscam em Deus aceitação e na Igreja, acolhimento e respeito. “As pessoas que nos procuram sofreram preconceito e exclusão dentro da própria religião, em igrejas evangélicas e católicas. São pessoas machucadas, que buscam algum apoio, algum conforto. Pessoas com depressão, tentativas de suicídio e que não veem mais saída, e encontram abrigo e família na igreja”, afirma Brandão.
Vistos como pecadores pela maioria das religiões, os homossexuais buscam expressar sua fé, manter um relacionamento com Deus e buscar a salvação em igrejas não tradicionais como a inclusiva.
Interpretação bíblica
Para Brandão, as religiões, a que chama de fundamentalistas, que usam passagens da bíblia com interpretação literal e descontextualizada do texto, sem interpretar o contexto sócio-histórico em que foram escritas, promovem doutrinas equivocadas para os dias atuais, como as que exigem que as mulheres mantenham o cabelo grande ou usem saia e véus.
Na igreja inclusiva é utilizado, de acordo com o pastor, o método teológico em que se analisa criticamente a origem das palavras e o contexto histórico de quando as passagens bíblicas foram escritas. “Usamos a mesma bíblia, os mesmo versículos, mas com esse método de interpretação e nós temos o que chamamos de teologia inclusiva, que interpreta essas passagens permitindo a análise de contexto”, completa.
Brandão ainda explica que as passagens bíblicas que são utilizadas contra a homossexualidade, foram escritas para condenar a promiscuidade, a prostituição e a ligação a idolatria de outros deuses, o que na época em que o texto foi escrito, envolvia práticas de relações sexuais com orgias.
“O que não se aplicaria ao contexto hoje de homoafetividade ligada ao amor de um para com o outro, ligada ao sentido de constituir uma família e de servir a Deus em primeiro lugar. Temos lutado há sete anos para as pessoas entenderem que é possível o homossexual ter família, é possível o homossexual ser um bom profissional, e também é possível que ele tenha um espaço e tenha sua fé e seja alguém também religioso”, afirma.
Preconceito
Falar em homoafetividade e não falar sobre preconceito ou mesmo violência física é quase impossível diante de tantas notícias que demonstram como é o dia a dia desse grupo. As do último mês mostram que um homossexual havia sido vítima de um ataque com ácido em Curitiba, no Paraná, e que outro havia sido assassinado a tiros em Feira de Santana, na Bahia, e que homossexuais estavam sendo perseguidos, torturados, presos e mortos na Chechênia, uma república russa.
“O preconceito existe muito: a não aceitação da sociedade, da família, da religião. Os homossexuais são vistos como aberrações, como pessoas que estão em pecado, como pessoas que transmitem a vergonha para a família, para a sociedade e para a igreja”, afirma Brandão.
O pastor também explica que o preconceito também chega à igreja inclusiva, com ataques verbais e mesmo vandalismo no prédio. “A sociedade acaba vendo os homossexuais como sendo promíscuos. Então ligar essa figura que é vista como aberração e promíscua a religião é um processo que estamos a sete anos tentar fazer aqui”, completa.
Para ele, as passagens bíblicas provam que o amor de Deus é incondicional e dirigido a todas as pessoas que creem em Jesus Cristo e que não é religião ou o pastor quem vai julgar o homem no juízo final. “Encontramos conforto para continuar servir a Deus, estando na igreja, porque esse julgamento final é de Deus e vamos fazer tudo o que a bíblia ensina como qualquer cristão, a diferença é que amamos pessoas do mesmo sexo, com a qual constituímos família, seguindo os parâmetros e princípios da bíblia”, finaliza.
História
A igreja começou na casa do casal Jeferson Silva e Fagner Brandão, que hoje são pastores da igreja, mas logo não comportava o número de pessoas que os procuravam. Assim, mudaram-se para uma sala comercial, locada no setor central, mas o síndico do prédio não aceitou “a movimentação de pessoas diferentes” e a igreja teve que ser realocada novamente.
Pastores Jeferson Silva (à esquerda) e Fagner Brandão
Em Campinas, a igreja que foi chamada Athos e Vida nos 5 primeiros anos, teve várias fases: de completamente lotada, por ser uma novidade a períodos com apenas os frequentadores mais fiéis. Hoje ela não é a única e existem várias igrejas no Centro-Oeste e em Goiânia neste segmento.
No Brasil existem igrejas inclusivas a cerca de 15 anos, sendo que as primeiras foram abertas no Rio de Janeiro e em São Paulo. Hoje elas são referências e consideradas muito grandes, por ter muitos fiéis.
Essas denominações seguem o modelo americano da Comunidade Metropolitana, que existe desde 1968, fundada pelo reverendo Troy Perry em Los Angeles.