Há um ano e três meses que vemos nos noticiários que o Banco Central tem reduzido a taxa de juros básicos para poder controlar a inflação na economia do País, tendo batido na última reunião do Copom uma baixa histórica de 7%. Com o nosso histórico recente, as baixas contínuas nos juros básicos brasileiros tem movimentado, e muito, o mercado financeiro.
A economia monetária brasileira segue a teoria que ao aumentar os juros, o governo torna o crédito mais caro e dificulta a tomada de empréstimos, assim, com as baixas na taxa de juros, a recíproca também é verdadeira. A Selic é a taxa de juros básica da nossa economia. É ela que determina quanto vale o nosso dinheiro e também serve de parâmetro para a captação, por isso, ela é um dos principais fatores que dita quanto custa o custo dos empréstimos.
Com os referenciais de juros menores, os bancos tendem a reduzir também as taxas de juros para o consumidor, mas isso não é uma regra. Quando o Banco Central quer estimular a atividade econômica, pode reduzir as taxas de juros, o que estimula o consumo e tende a gerar uma inflação mais elevada. Mesmo com a inflação maior, causada pelos aumentos de dinheiro na praça, o consumo, geralmente, tende a aumentar também. A medida é vista como um impulso na economia, mas há riscos para se levar em conta.
As atenções do mercado financeiro têm ainda diversos pontos para se manterem com os olhos quando se trata da economia do Brasil. O Copom, que reduziu a taxa Selic para a mais baixa dos últimos dois séculos, deixou mais espaços para cortar ainda mais os juros em 2018 que podem chegar a 6,75%. No entanto, um comunicado do Banco Central deixa em xeque esses cortes, isto porque o comunicado revelou que essas baixas estão atrelados aos resultados da Previdência e às agendas de reformas do governo federal.
JUROS ALTOS
Reinaldo Domingos é doutor em educação financeira, também é apresentador no canal Dinheiro à Vista, ele explica a correlação entre as duas taxas e o motivo de o consumidor ainda não sentir a baixa nos juros bancários. Se a taxa Selic sofre baixas como vem sofrendo nos últimos meses, a tendência é que as baixas nos juros bancários também ocorram. Entretanto, Domingos explica que essa relação não é tão próxima assim. “Ainda que a Selic esteja próxima de 10% ao ano, a taxa de juros que os bancos cobram no cheque especial ronda os 10% ao mês. “Quando a Selic baixa, há uma tendência de os bancos reduzirem os juros do cheque especial, mas não na mesma proporção”, diz Domingos.
O motivo, segundo Domingo, é que o mercado bancários brasileiro é ainda muito restrito. “são quatro ou cinco bancos dominando praticamente 80% do mercado”, segundo ele. Dessa forma, as empresas têm muito poder para determinar o preço – e preço, no sistema financeiro, é a taxa de juros”, explica.
A taxa média total cobrada à pessoa física, por exemplo, recuou de 42,2% ao ano em janeiro para 34,2% em outubro (último dado disponível). A queda é significativa, mas ainda está 6,9 pontos percentuais acima da mínima histórica da série do Banco Central, de 27,3%, registrada em maio de 2013 - quando a Selic saía de um outro ciclo de afrouxamento, que a levou a 7,25% até março daquele ano.
CONSUMIDOR
A baixa na Selic afeta em diversos pontos na vida do consumidor final. Alguns pontos são mais demorados e outros têm ação imediata na queda de preços. Os produtos importados têm um reflexo quase imediato com a baixa da taxa de juros básico, principalmente no câmbio. A quantidade de investimento estrangeiro no país também é influenciada pela baixa nos juros, isto porque a taxa básica também é utilizada para indexar os títulos públicos. Nelson Marconi explica que, com a taxa de juros menor, há menos interesse de investimento estrangeiro no país, o que diminui a quantidade de dólar, aumentando os preços dos produtos importados e consequentemente a inflação.
BENEFÍCIOS
Empresas de consumo e varejo, principalmente as que vendem a prazo, tendem a se beneficiar com a retomada do crescimento econômico. As lojas varejistas tendem a se destacar diante das demais.
Os endividados, sejam as empresas ou o consumidor comum com dívidas em moedas locais, pagam uma taxa de juros sobre o montante devido. Com isso, tanto as empresas, quanto os consumidores endividados nas linhas de créditos tem despesas menores quando a taxa de juros está em queda.
ENTREVISTA COM O ECONOMISTA EVERALDO LEITE
Everaldo Leite é economista e explica a importância da taxa de juros básicos de um país. Para o economista, os juros bancários ainda não desceram por insegurança. “A questão é que os bancos ainda não reduziram a taxa de juros de mercado, e não diminuíram também as barreiras severas ao crédito. O nível de inadimplência continua alto e o nível de desemprego é desestimulante.” Veja a entrevista, na íntegra:
A taxa de juros básica é um preço e tem dupla função para o Governo Federal, uma de ferramenta monetária e outra de financiamento dos gastos públicos. No primeiro caso, ela é utilizada para expansão ou retração da economia, sendo elevada em momentos em que a inflação de demanda aumenta de forma desordenada, ou sendo reduzida quando a taxa de inflação volta ao patamar de segurança instituído pelo Conselho de Política Monetária brasileiro. O mecanismo é o de transmissão do valor da taxa básica, ditada pelo governo, na elaboração e composição dos juros de mercado. Se a taxa de juros básica aumenta origina uma informação imediata, aos bancos e às empresas, que a partir de então ficará mais caro financiar seus projetos e negócios. Além disso, o mercado consumidor é impactado com o novo patamar de juros, procrastinando ou não a aquisição de bens e serviços no mercado. Há uma preferência por poupar e por especular, no caso de aumento dos juros básicos.
A taxa de juros básica também é o preço que estimula a aquisição de títulos governamentais. Para o governo federal é fundamental financiar os seus gastos, pois, não raramente, a receita corrente líquida é insuficiente para bancar suas obrigações. No caso do Brasil, onde o setor público não para de crescer e de depender de uma receita cada vez mais ampla para garantir seus serviços e despesas, a manutenção de uma taxa de juros elevada é muito mais comum do que em outros países onde a estrutura de governo é menor. Quando a queda na taxa de inflação admite que se reduza a taxa básica, esta cai, mas continua num grau elevado de atração significativo, não permitindo que recursos especulativos retornem para o mercado real. O mais grave é que a possibilidade de crescimento dos gastos com a dívida pública futura poderá comprometer mais à frente as contas do governo, que terá novamente de lançar mão de mais dívida pública, ou de aumento de impostos, ou, o pior, da inflação.
O que é melhor para o mercado financeiro? Qual a tendência internacional sobre isso?
O mercado financeiro busca títulos públicos com juros mais altos em todo o mundo, no intuito de obter ganhos seguros de médio prazo. O Brasil é um dos países que oferece uma alta taxa de retorno para os investimentos em títulos e os bancos privados nacionais são seus maiores investidores. A tendência internacional, entretanto, é de manter suas taxas de juros em um patamar baixo, justamente para estabelecer um ambiente propício aos negócios e ao crescimento econômico de seu próprio mercado de bens e serviços, e não à especulação.
Por que mesmo com a baixa da taxa Selic os juros bancários continuam tão altos?
O nível de risco ainda impacta bastante a taxa de juros. O altíssimo risco atual se deve ao estágio de crise que atingiu o mercado, o que fez com que instituições bancárias comerciais se tornassem bastante conservadoras, incluindo aí os próprios bancos oficiais.
Você acha que os bancos pretendem continuar com essa tendência?
Os bancos se alinham à conjuntura econômica nacional e internacional, caso estas se tornem mais positivas, permitindo reduzir o risco e a inadimplência, certamente os juros dos bancos comerciais deverão ser gradualmente reduzidos. O problema é que, com baixa cultura de poupança, o Brasil sempre terá taxas de juros mais altas do que outros países onde a parcela da poupança é mais expressiva na economia.
Como funciona a Selic?
A cada 45 dias o Comitê das Políticas Monetárias (Copom) determina uma meta taxa do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic). Na prática, esta deve ser a taxa que o Banco Central cobra se tiver que emprestar recursos a outras instituições financeiras. Professor da escola de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV EESP), Nelson Marconi explica que quando o Banco Central diz que a meta da Selic é 7%, ele vai controlar a quantidade de moeda na economia para fazer com que a taxa praticada nas operações junto ao mercado esteja próxima ou igual a essa meta.
A taxa serve como instrumento governamental para influenciar sobre a inflação da economia. “No mundo todo, todos os bancos centrais fazem política monetária determinando taxa básica de juros. Essa é a taxa que vai servir de referência para as outras taxas praticadas no mercado”, explica Marconi.