Após atraso no repasse das passagens do Programa Passe Livre Estudantil (PLE), estudantes relatam não terem recebido créditos suficientes. Após ter um pedido de medida tutelar negado, o Ministério Público de Goiás (MPGO), através da promotora Maria Bernadete Ramos Crispim, afirmou que vai promover uma “ação mais completa” para resolver os problemas do Programa. O superintendente da juventude da Secretaria de Governo (Segov), Leonardo Felipe Marques, disse que não há problemas quanto à atrasos e repasses.
O repasse, que deveria ter sido feito no dia 14, só aconteceu na última segunda-feira, (19). Por meio de nota, a (Segov) informou que a “checagem das informações dos estudantes impediram que o crédito fosse efetivado na data prevista”. A data definida para repasse é o décimo dia útil de cada mês. “Um atraso de um ou dois dias para os estudantes é muito”, afirmou Bernadete. A verificação das informações, que configurou o atraso, monitorou possíveis óbitos entre usuários e também estudantes que não fizeram a validação dos créditos recebidos. Segundo a Segov, entre estudantes que “não estavam utilizando os recursos”, ao todo, R$ 700 mil foram abatidos.
A promotora Bernadete critica a demora. “Esse programa foi implantado em julho do ano passado e só agora eles estão implantando mecanismo para impedir fraude”. Em dezembro, quando o PLE também registrou atrasos e repasses indevidos, o Ministério Público recomendou que a situação fosse regularizada dentro de 20 dias, mas o pedido foi indeferido. Em janeiro, em função da “crise de atrasos dos valores”, o MP pediu uma tutela para determinar a imediata normalização do sistema. O pedido foi apreciado somente em fevereiro e também não foi deferido. Segundo Bernadete, o juiz entendeu que o pedido era “genérico” e que não havia tempo hábil para a regularização, em decorrência do feriado de carnaval.
“Tivemos reuniões com o secretário de governo, o Tayrone (di Martino), estivemos pessoalmente com o superintendente da juventude. Fizemos tudo que era possível, reuniões pessoais, o pedido de recomendação e o pedido de tutela. Esses problemas começaram em julho, desde que o governo editou a nova lei”, disse a promotora, que pretende elaborar uma nova ação, com maior descrição. O procedimento de investigação dos problemas no Passe Livre já acumula cerca de 300 páginas, a maioria de reclamações recebidas. No ano passado, o Passe Escolar, que dava direito à meia passagem para todo estudante matriculado na capital, foi extinto após 24 anos em vigor. A partir daí, os estudantes passaram a depender exclusivamente do PLE.
O superintendente Leonardo Felipe disse que, além deste mês, só houve um outro atraso nos repasses. “Impreterívelmente nós repassamos ou no décimo dia útil ou em dias anteriores. Eu não tenho nenhum atraso. Para não dizer que não teve atraso, nós tivemos um mês (que atrasou), por conta dos dias letivos nós pagamos um dia depois, mas como era dezembro nós pagamos ressarcimento nos outros meses”, afirma.
Entre as principais reclamações que o MP tem recebido, estão: problemas com o recadastramento e com a validação dos créditos; insuficiência de passagens; e o corte da meia passagem. A promotora afirmou que essas reclamações serão adicionadas “com mais cuidado” na próxima ação que será promovida. “Esse sistema que está aí não pode continuar assim, está tendo muito prejuízo para os estudantes”, disse Bernadete.
A estudante de psicologia Adrielle Machado, de 19 anos, disse que utilizou normalmente os créditos no mês de fevereiro entre a faculdade e sua casa, mas não recebeu nenhuma passagem este mês. “Me disseram que só vou receber no próximo mês porque não teve recarga há mais de 3 meses, mas isso não é verdade, eu usei o cartão o mês passado todo. Eu não tenho condições de pagar oito reais por dia e eu preciso estudar”, reclama a estudante.
Leonardo Felipe informou que o cartão da estudante foi bloqueado devido à um “uso indevido” que foi identificado no mês de outubro do ano passado e que os créditos recebidos no mês de fevereiro “devem ter caído de uma recarga presa no ano passado”. Pelo regimento do PLE, ao ter o cadastro aprovado, o estudante recebe 48 passagens. Caso os créditos não sejam totalmente utilizados pelo usuário durante o mês, o próximo repasse encaminha somente o que foi gasto pelo estudante. Isso porquê o usuário não pode ter mais do que 48 créditos em um mês. Um estudante, que preferiu não se identificar por “medo de perder o benefício”, disse que utilizou todas as 48 passagens no mês de fevereiro, mas só recebeu 34 créditos neste mês.
O superintendente da juventude informou que no sistema de controle da Segov consta que o estudante realizou apenas 34 viagens no mês de fevereiro, por isso recebeu este valor. O estudante nega, afirmando que precisa gastar 4 passagens por dia para frequentar a universidade. O PLE calcula o repasse com base em duas passagens por dia. Adrielle também afirma que os créditos mensais são insuficientes para todo o mês e que, ainda assim, tem problemas com repasses.
O estudante que não quis se identificar relatou que enfrenta problemas com o PLE desde que foi lançado. Após fazer o cadastro em janeiro, ele conta que o valor só foi depositado em março e inferior à 48 passagens que, no valor atual da tarifa, totaliza R$ 192. “Caiu 100 reais (no primeiro mês), no mês seguinte 80, no outro 70. Nunca caiu o valor correto. Eles disseram que todo décimo dia útil iria cair após as 14 horas. Não aconteceu. Todo mundo tira dinheiro do bolso, gasta o que não tem pra poder ir para a faculdade”, alega. Leonardo Felipe diz que não há atraso nem defasagem nesses rapasses. “Todos os usuários recebem 48 passagens no primeiro mês e no segundo mês eles recebem para completar. Isso é assim a vida inteira, desde 2013”.
OUTROS CASOS
Dois casos chamaram atenção envolvendo o PLE. O primeiro aconteceu no mês das férias, quando o repasse não é feito. A Universidade Federal de Goiás (UFG) oferta “disciplinas de verão e inverno”, que são cursos ministrados na época das férias para aqueles estudantes que tiverem interesse. O reitor da UFG, Edward Madureira, precisou enviar uma lista para a Segov com os nomes dos estudantes que estariam matriculados, para que os créditos pudessem ser liberados. “Muitos (estudantes) não receberam (as passagens) para fazer esse curso de verão. O Estado não tem um mecanismo para controlar isso. O reitor teve que mandar uma lista para eles conferirem se o estudante devia ou não receber o passe. Esse controle é inadmissível, eles chegaram ao cúmulo”, critica Bernadete.
Outro caso é quanto à integração nos terminais. O estudante que utilizar o Eixo-Anhanguera e precisar fazer a integração no terminal para os ônibus semi-urbanos, que dão acesso, por exemplo, às universidades que ficam na BR-153, precisa pagar duas passagens. Usuários que utilizam o Cartão Fácil, por exemplo, pagam uma única passagem neste mesmo trajeto. “Esse ato está prevendo que se o estudante tiver Passe Livre ele não pode usar nenhum outro cartão. É inadmissível”, analisa a promotora Maria Bernadete. Um estudante que faz este trajeto todos os dias, não quis se identificar e disse que, como gasta quatro passagens por dia, depende de carona para frequentar a Universidade porque o Passe Livre é insuficiente.