Ao anoitecer região fica deserta. Bairro clama por revitalização que nunca saiu do papel
Bairro mais antigo de Goiânia e conhecido pela arquitetura em estilo art déco, o Setor Central está sem investimento há pelo menos três décadas. A região não conta com circulação de dinheiro necessária para manter sua vida cultural ativa. No entanto, a Secretaria de Planejamento Urbanismo (Seplam) afirmou que a ocupação do Centro será tratada como prioridade a partir de agora por conta do novo Plano Diretor, que ainda não foi votado pela Câmara de Vereadores. A pasta ressaltou que haverá estímulo para novos empreendimentos na região.
No horário comercial, veículos e pedestres estão espalhados pelas principais vias e calçadas do Centro, que conta com 22 prédios tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Mas basta cair a noite para o charme dar lugar ao medo. De acordo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população de Goiânia aumentou 44% em 20 anos, enquanto a do Centro registrou queda de 7% neste período. Neste tempo, a preferência de moradia passou a ser a região sul da capital, cujo crescimento foi de 56%, subindo de 25 para 39 mil habitantes.
Discutido em sessão plenária, mas ainda aguardando ser votado, o novo Plano Diretor prevê por meio de isenções urbanísticas construções e “aproveitamento democrático” do espaço urbano. No momento, o principal entrave para que esse estímulo saia do papel são impasses burocráticos. O objetivo é que sejam construídas residências no Centro e, com isso, o comércio local se fortaleça. Em entrevista ao Diário da Manhã em janeiro, o titular da Seplahn, Henrique Alves, disse que a criação de novos empreendimentos aumentará as opções de recreação na região.
O líder comunitário Sanivaldo Silva Ramos, 48, reconheceu que a prefeitura está agindo para trazer melhorias ao Centro, mas ele frisou que o esforço ainda é pouco. “Os secretários de planejamento urbano e cultura estão se esforçando, é verdade. A prova disso é a iniciativa do chorinho, no Grande Hotel, que traz várias pessoas de diversas regiões da cidade toda sexta-feira para o Centro”, diz. De acordo com ele, o tradicional Mercado da 74 é uma forma de lembrar a importância da região para a cidade. “Mas, mesmo assim, é preciso mudar a história do bairro”, frisa.
Já o presidente da Sociedade Goiana de Art Déco, Gutto Lemes, disse que o Centro da cidade precisa começar suas mudanças repensando a poluição visual. “Acredito que essa região da cidade necessite de mudanças, principalmente visuais”, declara. Segundo ele, as ocupações culturais podem atrair olhares para Goiânia, que é tida como referência mundial na arquitetura déco. “É preciso desobstruí-las, pois desta forma turistas serão atraídos para a região, o que pode gerar lucro aos cofres do município”, completa.
PELAS RUAS
Quem perambula pelas ruas de Goiânia sabe que a região central está esquecida, com paredes velhas, prédios históricos pichados, além de fachadas que tiram a essência do estilo déco e provocam uma amnésia afetiva nos goianienses. É impossível não lembrar o odor fétido de urina que exala quando se caminha em determinados pontos da Avenida Goiás. Parece um cenário típico da literatura dos estadunidenses John Fante e Charles Bukowski. Mas isto não é ficção, e sim realidade.
Segundo o líder comunitário Sanivaldo Silva Ramos, 48, as Organizações Sociais (OS) que administram o Centro de Convenções, na Avenida Paranaíba, são responsáveis por expulsar os empreendimentos da região, já que o preço cobrado pelas OS para alugar o espaço é alto. “As empresas cobram uma quantia fora do comum para os empresários utilizarem o local. Como consequência, não há fomento às atividades culturais”, afirma o líder comunitário, que mora no Centro há doze anos.
Ex-morador do Centro, o arquiteto Danilo Bastos, 27, afirmou que é necessário maior fomento à abertura de bares e restaurantes na região. “Bares atraem pessoas”, acredita o arquiteto, ressaltando que grandes cidades possuem concentração de estabelecimentos boêmios na região central, ao contrário de Goiânia. “Porém, eu reconheço que está havendo algumas ações com intenção de promover a ocupação do centro, coisa que não se via antes”, diz.
A ideia de revitalização está relacionada a uma melhor utilização do espaço urbano. Em pesquisa divulgada no ano de 2006, o historiador Ciro Augusto de Oliveira disse que iniciativas neste sentido podem provocar melhor desenvolvimento urbano, além de manter viva a memória da cidade. “Esse modelo de desenvolvimento toma como um dado econômico e cultural a estrutura e a forma da cidade, e como um dado social a trama de relações sociais de atividades que podem suportar”, diz o pesquisador.
HISTÓRIA
Goiânia foi planejada para ser a capital de Goiás por iniciativa do ex-governador do Estado Pedro Ludovico Teixeira, em conformidade com a Marcha para o Oeste – estratégia política do ex-presidente Getúlio Vargas, que o objetivo de que era necessário estimular o desenvolvimento do Centro-Oeste do País. Na época, havia uma preocupação em relação ao progresso da região, que não era tão ocupada pela população brasileira.
Em 24 de outubro de 1933, Pedro Ludovico deu o pontapé para que Goiânia existisse. A data homenageava os três anos do início da Revolução de 1930, que acabou virando a ditadura do Estado Novo. A nova capital passou a ter atividades em novembro de 1935. Pouco tempo depois, Ludovico enviou decreto que estabeleceu a transferência da Casa Militar, da Secretaria-Geral e da Secretaria do Governo de Goiás Velho para Goiânia.