O desemprego alcança recordes no Brasil que tem hoje cerca de 13 milhões de desempregados segundo os últimos dados. Resultado: muita gente que está sem emprego tem que se virar pra levantar uns trocados e continuar tocando a vida. Esta situação de desemprego vem aumentando o trabalho informal em todo o País. Em Goiânia, a tradicional Feira da Marreta, funcionando há cerca de 15 anos no estacionamento do Parque Agropecuário de Nova Vila em Goiânia, é um exemplo claro desta situação de crescimento da informalidade no País.
A Feira, que antes funcionava só no estacionamento da Pecuária, está crescendo, avançando sobre ruas laterais e nas calçadas do Parque. Feirantes que trabalham há bastante tempo vem notando este crescimento da Feira com o aumento do desemprego. Criada por servidores públicos que trabalhavam na construção de Goiânia (funcionava antes na Praça Boa Aventura) a Feira da Marreta não é vista com bons olhos pelo poder público, sendo alvo de constantes batidas policiais a procura de produtos roubados.
O feirante dos setor de Recicláveis, Clédson Carvalho, que estava ocupando uma das calçadas ao redor da Pecuária diz que resolveu trabalhar na Feira da Marreta pra levantar uns trocados e ir tocando a vida diante da crise que afetou o seu rendimento: “A situação tá difícil. Muita gente que está aqui na calçada, está desempregada. Se a crise continuar a ocupação da calçada vai crescer. Daqui a pouco vai dar a volta na Pecuária”, brinca o feirante.
Paulo César de OIiveira Assunção, Estudante de Ciências Sociais, que há dez anos vende livros na Feira e fez uma pesquisa sobre os feirantes, também vem percebendo este crescimento com o aumento do desemprego. “O desemprego cresce, a Feira também. Muita gente que tá aqui trabalha de forma honesta. Muitos têm outras profissões. É um professor, dono de bar, pedreiro que, aos domingos, vem a Feira da Marreta vender objetos para complementar a renda e enfrentar a crise. Tá difícil a vida”, conta Paulo.
O dono de Bar na Vila Mutirão, Edivaldo Oliveira, mais conhecido como Di, também diz que vai a feira aos domingos para complementar a renda. Di afirma que não vende nada roubado. “Vou aos recicláveis e compro vários objetos danificados. dou um trato, arrumo e vendo aqui na Feira. Faço isto há 40 anos, não vendo nada roubado. Aqui a gente trabalha organizado. De forma honesta. Comecei na Vila Nova e continuo até hoje aqui complementando a minha renda”.
O Militar aposentado Euler Ferreira diz que frequenta a Feira da Marreta há cinco anos e sempre consegue comprar alguma coisa em conta. Desta vez carregava um botijão de gás nas costas que comprou, segundo ele, pela metade do preço de um novo. Ele afirma que não tem como saber se um produto é roubado ou não. Muita gente que precisa de dinheiro rápido vai à feira vender objetos. Para ele a Feira da Marreta tem esta opção de compra diferenciada com valores baratos, ou seja, você pode encontrar de tudo no local.
Estudo traça perfil sobre feirantes que trabalham de forma regular
O feirante vendedor de livros, Paulo César de Oliveira, citado acima na matéria, é também estudante do curso de Ciências Sociais da UFG e fez um estudo sobre o perfil dos feirantes da Feira da Marreta. Paulo frequenta a Feira da Marreta desde criança quando ela funcionava na Praça Boaventura na Vila Nova. Com o título Pesquisa Etnográfica – Feira da Marreta, Paulo conta como ela teve início e porque, ao contrário do que muita gente pensa, ganhou a alcunha de “Marreta” segundo os feirantes mais antigos..
PRIMÓRDIOS
“Nos seus primórdios, segundo relatos de vendedores mais antigos, a Feira da Marreta começou com funcionários públicos, cujos pagamentos de salários atrasavam. Iam à praça vender objetos de casa que não usavam mais, para obterem algum dinheiro e comprarem o que faltava. Panela velha, ferramentas, roupas usadas eram os objetos mais encontrados na feira. Das ferramentas, o que sobrepunha mais era a marreta, que foi perdendo espaço nas construções devido a ferramentas mais tecnológicas, dá aí a origem do nome, Feira da Marreta”.
Paulo defende a Feira que tem a fama de vender produtos roubados: “Ao contrário do que a sociedade pensa a Feira da Marreta é, em sua maioria, de trabalhadores, de pessoas que trabalham de forma honesta que buscam, aos domingos, complementar a sua renda. Acredito que aqui, por metro quadrado, tem mais pessoas honestas que no Congresso Nacional”, conclui Paulo.
Perfil atual do ponto de vendas
Paulo César de Oliveira conta no estudo que de um tempo pra cá, devido à crise financeira, houve um inchaço na Feira, mas a dinâmica continua a mesma, tendo a venda todo tipo de mercadoria nova e usada: sucatas diversas, objetos dos ferros-velhos e papeleiros, bicicletas, livros, revistas, componentes de informática, objetos domésticos, enfim tudo aquilo que pode ser reutilizado e comercializado de acordo com a cabeça e a necessidade do feirante nas diversas alas, além é claro, do setor de alimentação que também compõe a Feira da Marreta.
FUNCIONAMENTO
A Feira da Marreta se inicia na madrugada de domingo, a partir das 3 horas. Os feirantes mais antigos se ajudam e buscam delimitar as suas áreas para que os que não tem ponto invadam seus espaços. Estes invadem os corredores e espaços vazios e, aos gritos, tentam vender o seu peixe. É assim, de acordo com Paulo, que a Feira vai se formando naquela bagunça organizada cheia de bugigangas de todo tipo que você possa ou não imaginar.
LAÇOS
“A maioria dos feirantes da Feira da Marreta têm outras atividades durante a semana. Cada vendedor faz um laço de amizade com os outros vendedores que estão ao seu redor, formando um elo. Este elo é que faz a feira funcionar e ter suas próprias regras. Não tem órgão que a fiscaliza.. A Feira da Marreta é autogestora, tem suas próprias regras, e sua própria dinâmica”, conclui Paulo no estudo.