A moradia embora ainda não enunciada com um direito social universal, já era vista como preocupação e buscada como status constitucional. No artigo 7.º inciso IV, vê-se a consideração da moradia como necessidade essencial primária do indivíduo. Também no título II dos direitos e garantias fundamentais art. 5.º inciso XXIII diz que a propriedade atenderá à sua função social. Esse pensamento é importante porque caracteriza o direito social como direito personalíssimo, humano e fundamental diante da evidente precisão desta para a sobrevivência do ser humano.
É por isso que os trabalhadores estão se organizando: para lutar contra a desigualdade e pela inclusão social.
Em Goiânia, são 8 000 m² ocupados pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), onde a luta é por moradia, especificamente.
Muitos dos ocupantes desta área já se desiludiram com os cadastros oferecidos pelo governo, os quais eles denominam de ‘engana povo’, denunciando que estes cadastros são restritos a amigos daqueles que lidam com o poder.
Rogério da Cunha, que comanda a ocupação ‘Fidel Castro’ no conjunto Vera Cruz, define a ocupação como “um anseio do povo de ter seu imóvel próprio, de sair do aluguel, que é um dinheiro sem volta”.É este sonho pela casa própria que tem movido as 86 famílias da ocupação a enfrentarem uma rotina dura todos os dias. Os serviços são divididos entre eles para manutenção da estrutura organizativa do movimento. Dentre os mais importantes estão a equipe de infraestrutura, responsável pelo levantamento dos barracos e também da viabilização da água e energia para o acampamento, a equipe de ronda, movimentação noturna onde há o rodízio de moradores que guardam o acampamento, a cozinha comunitária, onde todos ajudam na compra dos mantimentos, para que não falte nada a ninguém e a ciranda, que é uma creche e uma biblioteca disponível aos filhos dos ocupantes como também às crianças da comunidade local, além da horta comunitária, destinada à cozinha. Tem ainda um movimento com o fim do desenvolvimento de cultura e arte, que é uma forma de unificar e fortalecer o movimento.
“A sociedade como um todo está muito armada. Uns se voltam contra os outros em busca de vantagens, quaisquer que sejam. Porém, aqui, nada é de ninguém–tudo é de todos; de modo que os problemas de convivência em comunidade são menores do que o propósito coletivo da ocupação”, explica Rogério.
Deste modo, há busca é pela socialização das pessoas da ocupação, para que o movimento seja ordeiro e civilizado.
Importante frisar que o acampamento visa demonstrar para a sociedade que os ocupantes são pessoas de bem e não bandidos, como são taxados por boa parte dos desavisados. Ademais, drogas ou armas não são aceitas, de modo que se houver o incidente, a pessoa é convidada a deixar a ocupação.
“As pessoas aqui trabalham e por isso têm como viabilizar a compra do óleo, do arroz, do feijão, através de vaquinha, embora doações sejam bem vindas.”
A ocupação é democrática de modo que as deliberações são acordadas coletivamente, em assembleia.
Em sua estrutura organizativa, a ocupação está dividida em G1 e G2 onde os barracos são numerados, além dos vários setores, os quais cita setor de articulação e negociação, de comunicação e simbologia, de formação política, de cozinha, cadastro, ronda, infraestrutura, auto defesa, cultura e arte.
Antes de chegarem ao conjunto Vera Cruz, os ocupantes fizeram uma ocupação numa maternidade abandonada na periferia de Goiânia. Posteriormente, foram para o Conjunto Santa Fé. A administração municipal anterior entrou em negociação com os ocupantes e os removeu para a atual área onde estão assentados. Tudo de acordo com a orientação da administração pública municipal, com documentação, onde foram autorizadas 93 famílias a estarem no local. Porém, nesta nova gestão, o ex-Secretário Agenor Mariano baixou uma portaria anulando todos os acordos firmados com a administração municipal anterior. “Atualmente responde pela pasta Henrique Luiz,” afirma. “A nossa negociação não é com o gestor–é com a prefeitura de Goiânia, não importa quem esteja à frente, e direitos não se negociam. Se implementam”.
A ocupante Sirlene Alves, de 49 anos, criou seus filhos que já estão estabelecidos no mercado de trabalho. Ela mora no acampamento com seu marido e afirma que cansou de pagar aluguel. Após se desiludir com as inscrições habitacionais disponíveis pela administração pública estadual e municipal e após verificar a seriedade do movimento, resolveu aderir.
Um em cada dez municípios brasileiros tem registro de ocupações de terrenos ou prédios por movimentos de moradia, informa o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os dados pertencem à Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic)–Perfil dos Municípios Brasileiros de 2017, que abrange 5.570 municípios.
Segundo levantamento, em 2017, 3.374 municípios (60,6%) do total tinham loteamentos irregulares ou clandestinos e em outros 952 municípios (17,2%) tinham favelas, mocambos, palafitas ou assemelhados. Segundo o IBGE, foram encontrados “cortiços, casas de cômodos ou cabeças de porco”, existentes em 684 municípios (12,3%). 724 municípios informaram ter algum tipo de ocupação, o que representa 13% do total.
Informa ainda que a maioria dos municípios brasileiros continua sem um Plano Municipal de Habitação. De acordo com o IBGE, apenas 39,7% do total dos municípios brasileiros contavam com esse planejamento, o correspondente a 2.212 municípios. Portanto, 60,3% dos municípios não tinham planejamento nesse sentido.