A Coomp Brasil, cooperativa de consumo de âmbito nacional, propõe comercializar toda a produção de frutas e hortigranjeiros dos quilombolas da região da Serra da Mesa, na região norte do Estado. A representação da Coomp Brasil entrou em negociação para o processo de compra nesta semana na cidade de Uruaçu, onde a presença da comunidade quilombola é forte. Os entendimentos nesse sentido foram estabelecidos por André Bezerra, presidente da Coomp Brasil em Goiás, Domingas Gouveia de Carvalho, pelos quilombolas de Pombal em Santa Rita, e Júlio César da Serra Campos, diretor financeiro da Fundação de Desenvolvimento, Assistência Técnica e Extensão Rural de Goiás (Fundater).
Segundo André Bezerra, esses alimentos podem ter como destino a Merenda Escolar em Goiás, que dispõe de R$ 120 milhões em seu orçamento financeiro para esse fim. Exército, Marinha e Aeronáutica contam com valores anuais semelhantes, também, para a mesma finalidade. A Coomp Brasil quer, no entanto, a garantia do fornecimento de todos esses alimentos por parte dos produtores, dando preferência aos assentados da reforma agrária, quilombolas e indígenas. O contrato tende a ser por um período de seis meses, garantindo preços no decorrer do período. Bezerra chama a atenção para a transparência, lembrando que por se tratar de recursos estaduais ou federais, as autoridades acompanham de perto toda a movimentação.
“Com isso, fica garantida também a produção e o numerário firmado em acordo com as representações dos quilombolas”, afirma Bezerra, que negocia com a comunidade quilombola no entorno da Serra da Mesa. O representante da cooperativa vê numa parceria assim algumas vantagens, sobretudo na redução dos custos operacionais da iniciativa e garantia das compras sem a presença de intermediários. Por exemplo, os caminhões que buscariam as compras, fariam a entrega dos insumos básicos à produção na mesma viagem. O pagamento é em dia, segundo o presidente da Coomp Brasil, e cai direto da fonte na conta bancária do condomínio de produção.
Os produtores quilombolas cultivam fruteiras e hortaliças sem uso de agrotóxicos e seguindo à risca a prática da sustentabilidade, conforme ressalta Domingas Gouveia, empolgada com a possibilidade de negociação direta com a sua comunidade. Esses alimentos, conforme a região, são constituídos de mandioca descascada e congelada, farinha de mandioca, mel, verduras – como repolho, abóbora, cenoura, beterraba, folhagens – como alface, couve, cebolinha, pimentas, temperos. Há ainda arroz de sequeiro, feijão e milho verde, chuchu, tomate, banana prata, melancia, abacaxi, entre outras.
“Não queremos nada fantasioso”, observa Domingas Gouveia, concordando com a proposta de parceria entre os produtores de sua comunidade e a cooperativa de consumo e de fomento de desenvolvimento. Os quilombolas, através do Projeto Tanque e Rede do Parque Aquícola Borges Vieira, podem fornecer também pescados, já que eles atuam também no lago da Serra da Mesa. João Borges foi o primeiro remanescente do Quilombo do Pombal, em Uruaçu.
Isabel Rodrigues da Costa produz rapadura, requeijão, polvilho, maracujá, tamarindo, entre outros, e mostra-se satisfeita com as novas perspectivas de ver sua produção vendida diretamente ao consumidor. “Escoar tem sido o nosso problema”, satisfeita com a possibilidade de entregar o que produz diretamente da propriedade em Santa Rita.
QUILOMBOLAS EM GOIÁS: QUEM É ESSE POVO
Goiás é o maior quilombo em extensão territorial do Brasil, com cerca de quatro mil pessoas abrigadas, em 253 mil hectares de Cerrado. O Estado possui 33 comunidades e sete em processo de certificação pela Fundação Palmares.
Com identidade e cultura própria, as comunidades dos quilombolas estão diretamente relacionadas à história da ocupação do território brasileiro. Os quilombos surgiram a partir do início do ciclo da mineração no Brasil, quando a mão de obra dos escravos passou a ser utilizada nas minas de ouro, espalhadas pelo interior do País.
Com as dificuldades do trabalho na mineração e as péssimas condições de vida dos escravos, as fugas eram frequentes para o interior do Brasil, em lugares cada vez mais isolados (os chamados Vãos), dando origem aos quilombolas.
Domingas Gouveia, uma líder nata dos quilombolas, lembra que seu povo está em Goiás há 87 anos. Em Uruaçu chegou na década de 60. A Igreja doou terras a eles. Em Pombal há entrega de 25 casas populares. A produção da comunidade é de pequena escala. O artesanato é trabalhado, utilizando-se de cabaças e jatobás, assim como frutos do bioma Cerrado.
Roupas de tecidos, confecção de bonecas de pano chamadas Marias Negras, são chamativos aos turistas e visitantes das comunidades. Da cultura de descendência africana, a comunidade negra promove outros atos, entre elas a dança dos tambores, a catira e participação em festejos, onde procuram também a sua sustentação econômica. Maria Santina Barbosa da Silva é uma das participantes do grupo de danças, composto de 39 pessoas. Ela se queixa muito da falta de transportes para a manifestação cultural do grupo.
Os bisavós e os avós de Isabel chegaram, ainda, em lombo de cavalo em Santa Rita, no entorno de Serra da Mesa. Ela ainda ouviu histórias interessantes sobre pessoas mais antigas de sua comunidade. “Naquela época, o calçado era feito para demorar meses e fortes para suportar a travessia dos rios em montarias ou nas canoas”, recorda o papo ainda de seus pais. Hoje, a situação é outra, inclusive quanto ao uso do celular, que está sempre próximo, para atualização dos assuntos.
Trabalhar com afinco e honestidade foi sempre o que ouviu de seus pais. Por isso, não foge da luta na moagem da cana nem da fabricação de farinha de mandioca. Hoje, a sua comunidade conta com trator para várias operações na terra. A casa de farinha gera 18 empregos diretos. “Já foram mais, a crise econômica brasileira fez o enxugamento dos demais”, observa ao DM. Isabel chama a atenção para o Projeto Recuperação de Nascentes, que conservou 150 nascentes em Santa Rita. Acilon José de Araújo é outro que toca a sua roça e hoje revende na feira dos quilombolas no centro de Uruaçu.
ORIGEM DA PALAVRA QUILOMBO
Segundo a Wikipédia, a palavra “quilombo” tem origem nos termos “kilombo” (Quimbundo) e “ochilombo” (Umbundo), estando presente também em outras línguas faladas ainda hoje por diversos povos bantus que habitam a região de Angola, na África Ocidental. Originalmente designava apenas um lugar de pouso, utilizado por populações nômades ou em deslocamento; posteriormente passou a designar também as paragens e acampamentos das caravanas que faziam o comércio de cera, escravos e outros itens cobiçados pelos colonizadores. Significava também “acampamento guerreiro”, “capital, povoação, união”. Porém, foi só no Brasil que o termo “quilombo” ganhou o sentido de comunidades autônomas de escravos fugitivos.
Com isso, ficam garantidos também a produção e o numerário firmado em acordo com as representações dos quilombolas” André Bezerra, que negocia com a comunidade quilombola