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Projeto de lei quer liberar uso indiscriminado de agrotóxicos

O Brasil é hoje o país que mais usa agrotóxicos no mundo, um celeiro cobi­çado pela indústria dos venenos.

A tendência mundial é a agri­cultura orgânica. O Brasil na con­tramão de uma tendência, se for aprovado o substitutivos PL 629902 que trata da regulação dos defensivos fitossanitários.

Muitos produtores e muitos profissionais veem o agrotóxico como única solução, e não é. A agricultura planejada evita conta­minação e desperdícios, por isso, precisa ser profissionalizada e en­tendida no sentido agronômico: conhecer a planta, conhecer o solo, conhecer o meio ambiente e conhecer as pragas.

Temos uma lei de agrotóxicos em vigor desde 1989. Mas alguns setores que trabalham com agro­tóxicos, principalmente a indús­tria, estão insatisfeitos com os ter­mos da legislação em vigor, sob a alegação que ela burocratiza mui­to. Alguns produtores fazem coro a esse discurso mais pela propa­ganda da indústria em cima do as­sunto do que por conhecimento de causa. As indústrias de agro­tóxicos querem mudar principal­mente a parte do registro dos ve­nenos. Ao dizerem que querem ‘desburocratizar’, significa dizer ‘flexibilizar as regras de registro’.

É o que explica o engenheiro agrônomo José dos Reis de Sou­sa Filho, presidente da Associação dos Engenheiros Agrônomos do Estado de Goiás, conselheiro do Crea e fiscal estadual agropecuá­rio da Agrodefesa.

“O Brasil é hoje o país que mais usa agrotóxicos no mundo, até por causa das nossas condições, quais sejam climáticas e extensão territorial. O clima tropical está presente em boa parte do territó­rio, especialmente nos Estados d centro do país, como Mato Gros­so do Sul, Minas Gerais, Goiás, São Paulo, Tocantins, além de outros, que são as principais zo­nas de plantio do nosso território. Por isso, diferentemente dos paí­ses da Europa, onde durante um período o clima é extremamen­te frio (neve), os insetos não se proliferam, o que os mantém na condição de baixa população. Ao contrário, por aqui eles se repro­duzem durante o ano inteiro, de­vido as condições favoráveis. Com relação ao solo, são intemperiza­dos e muito profundos”, explica.

Usa-se muito agrotóxicos no Brasil por causa dos insetos e mi­crorganismos que causam pre­juízos à agricultura. São popular­mente chamados de ‘pragas’. No Brasil há uma sequência de sa­fras que duram o ano inteiro, o que propicia excelentes condições de alimentação para os insetos, faci­litando sua proliferação. “A Euro­pa não produz o ano inteiro devi­do ao clima, como já foi dito. Isso gera uma condição de se ter mais pragas e mais doenças por aqui.”

José Reis analisa que infeliz­mente o brasileiro entende que só há uma maneira de controle de pragas: o uso de agrotóxicos.

“Eliminar os insetos é impos­sível. Por isso, para o controle de pragas, há uma série de medidas agronômicas a serem tomadas para a sua redução.”

José Reis explica que há dois pontos primordiais para uma boa plantação.1º) A construção do solo. Essa construção não se dá apenas com a colocação do calcário, mas de modo que os níveis de nutrientes nele encon­trados fiquem equilibrados. Mas há outros nutrientes, denomina­dos micro e macronutrientes. A denominação de macro é para definir quantidades maiores de nutrientes, e micro para definir quantidades menores de nu­trientes. Por isso, não é por co­locar uma quantidade maior de um nutriente que a planta irá fi­car melhor.Cada um desses com­ponentes tem uma quantidade ideal para que a planta cresça sa­dia. Se esses nutrientes estão em equilíbrio, a planta o absorve de maneira equilibrada e se torna uma planta sadia. A planta sadia é menos preferida pelos insetos.

2.º) Outro manejamento que contribui para a redução de pragas é plantar em momentos onde não haja evidências da pra­ga. Um tomateiro contaminado passa a doença para as plantas novas, e todas perecerão. Ou­tra situação: o fungo que causa a ferrugem na soja se prolifera via aérea. Se há uma plantação contaminada e logo em seguida se planta outra safra, a plantinha nova não resistirá.

Agricultura agronomicamente planejada

A Agrodefesa implantou algu­mas medidas obrigatórias, que são preventivas, como destruir resto cultural de soja; estabelecer um calendário de plantio: duran­te três meses no ano, não se pode ter planta viva de soja. Assim, bai­xa-se o inócuo, apesar de ter o es­poro do fungo, mas não em quan­tidade tal que vá afetar a cultura. Há outra séries de medidas que evitam as pragas, e são essas me­didas culturais preventivas que fa­zem com que haja menos pragas. Então, se ainda assim a praga exis­te, aí sim o uso do agrotóxico será recomendado, mas só após terem sido tomadas todas as outras me­didas. “Muitos produtores e mui­tos profissionais veem o agrotóxico como única solução, e não é. Por isso defendo a agricultura planeja­da. A agricultura precisa ser profis­sionalizada e entendida no senti­do agronômico: conhecer a planta, conhecer o solo, conhecer o meio ambiente e conhecer as pragas.” defende José Reis.

O manejo integrado de pra­gas é imprescindível ao bom de­sempenho da plantação. Manejo é planejamento, ou seja, primei­ro você faz as coisas certas antes de começar a plantar; depois, acompanha a cultura para saber o momento certo de entrar com o agrotóxico; finalmente, não se deve fazer o que se faz com o to­mate por exemplo, que tem um calendário de aplicação do agro­tóxico, chegando a níveis de dia sim dia não de aplicação, o que é uma loucura. Desnecessário. Calendário de aplicação não tem sentido agronômico.

“Eu fiz a minha pesquisa de mestrado em Paty do Alferes, no Rio de Janeiro. Comparando o manejo do tomate de Goiás com o do Rio, lá eles tinham 42 aplica­ções por ciclo. Quando eles pas­saram a fazer o manejo integra­do, eles reduziram para 16/17 aplicações, com uma coisa muito simples: acompanhando a plan­ta, sujando a botina e vendo o que estava acontecendo. Era o chamado ‘monitoramento’, onde era usada uma tabelinha onde as pragas eram identificadas. Cons­tatando-se um nível de pragas que justifiquem a aplicação do agrotóxico, aplica-se. O mane­jo integrado reduziu a níveis ex­celentes o uso dos venenos. Em Anápolis, ao contrário, os produ­tores aplicavam o agrotóxico du­rante todo o ciclo contra a traça do tomateiro, sendo que em nem um momento havia sido cons­tatado de fato a traça. Ou seja, desperdício e contaminação des­necessários. Defendo uma agri­cultura profissional e agronomi­camente planejada.

EXPERIÊNCIA

O professor Paulo Marçal, da UFG, já aderiu ao plantio orgâni­co com manejamento agronômi­co planejado. Ele produz tomate e diversas oleráceas, milho, fei­jão, arroz, 100% orgânicos. Está provado que é possível fazer agri­cultura sem o uso dos agrotóxicos. Além do mais, o professor Pau­lo Marçal também planta mono­cultura de forma orgânica, como a cana-de-açúcar. O modelo ava­liado mostrou-se importante e efe­tivo na recuperação, conservação e manutenção da biodiversida­de, além de se mostrar eficiente como instrumento de minimiza­ção dos impactos sociais associa­dos ao setor. Trata-se de um modo novo modo de manejo, com práti­cas diferenciais de cultivo e mane­jo ecológico em um agroecossiste­ma de cana-de-açúcar.

O agrônomo José de Souza acredita que é possível fazer agri­cultura de modo diferente do que tem sido no Brasil.

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