- Sandinista, na América Central, a última revolução na América Latina, ocorrida em 19 de julho de 1979, que derrubou a ditadura de Anastazio Debayle Somoza
- Erotides Borges participou por dois anos consecutivos de Brigadas Voluntárias, do Brasil, para auxiliar na reconstrução da economia devastada pelos ‘contras’
- O que há, hoje, é uma ‘caricatura do Sandinismo’. Com culto à personalidade, inflexão à direita e ao centro, violência policial, com repressão política aos protestos
Sandinista, na Nicarágua, a última revolução na América Latina em 19 de julho de 1979. Anos depois, para reconstruir o País devastado pela guerra promovida pelos ‘contras’, sob a hegemonia do Comandante Zero, financiado com dólares em contrabando dos EUA e do Irã, uma Brigada Voluntária partiu do Brasil para colher café. Por dois anos consecutivos. 1986 e 1987. A principal commoditie à época para exportação do vizinho. Um produto cobiçado no mercado internacional. Nascido em 7 de dezembro de 1947, em Pedro Afonso, Erotides Borges, que havia aterrissado em Goiânia em março de 1967 e já teria se contaminado com as rebeliões estudantis do ano de 1968, que completa 50 anos em 2018, integrou o pelotão que auxiliou, por conta própria, a insurreição de Daniel Ortega, Humberto Ortega & cia. ltda.
– Depois de 1º de janeiro, de 1959, em Cuba, a única revolução em ‘Nuestra América’.
TIROS DE BAZUCA
Ex-membro da VAR-Palmares [Vanguarda Armada Revolucionária Palmares], organização de luta armada contra a ditadura civil e militar no Brasil, que depôs o nacional-estatista, em sua versão trabalhista, gaúcho de São Borja João Belchior Marques Goulart, o ex-operário conta que a Frente Sandinista de Libertação Nacional [FSLN] derrubara a ditadura da oligarquia de Anastazio Debayle Somoza. O ditador acabou executado no Paraguai, em 17 de setembro, em 1980. Com um tiro de bazuca. Violência que estourou os seus miolos. O nicaraguense estava refugiado sob a proteção do presidente sanguinário, Alfredo Stroessner, que cairia, depois, em 1989, e viria para o Brasil, Goiás e Brasília. As suas referências políticas e ideológicas no socialismo da América Central eram Daniel Ortega, preso político por sete anos, além de Thomás Borges.
– Camilo Ortega morrera, em combate, em 26 de fevereiro de 1978, aos 27 anos, em Masaya, Nicarágua.
Uma revolução de novo tipo, acreditava. Modelo diferente das revoluções Russa, de 26 de outubro ou 7 de novembro de 1917; Chinesa, de 1º de outubro de 1949; Cubana, de 1º de janeiro de 1959; e até da Vietnamita, em 30 de abril de 1975, explica. Pós-insurreição armada, um comissariado administrava a Nicarágua, com o estabelecimento de eleições democráticas e regulares, como as de 1984 e 1990, 1996, sem partido único, com uma economia de livre mercado e forte participação do Estado no fomento à retomada do desenvolvimento econômico, observa Erotides Borges. A guerra deflagrada pelos ‘contras’ destruiu a rede de infraestrutura da Economia, afastou investidores, esgotou as energias financeiras do Estado, cansou os cidadãos da Nicarágua, que depois de elegerem Daniel Ortega, em 1984, mudaram.
– Para nova opção: liberal, Violeta Chamorro venceu as eleições em 1990. Apesar disso, ela, sem provocar rupturas, manteve Humberto Ortega como comandante do Exército Nacional. Primeira viagem
A sua primeira viagem à Nicarágua ocorreu em 1986. De janeiro a março. Voluntária. O roteiro, inusitado: Goiânia, São Paulo, Caracas, na Venezuela, com uma parada por três dias. Em seguida, Havana, Cuba. Destino final: Manágua, com escala em Costa Rica. Para colheita de café. Uma jornada extenuante, que durava das 6h às 17h, conta. Antes, um café da manhã regado a café y tortilhas. Com horário curto para o almoço, às 11h. No cardápio, tortilhas, de massa de milho, frango, arroz e até feijão. O já goiano conheceu em seu périplo Vanda Pignatto, da Secretaria de Relações Internacionais do PT, que, tempos depois, seria a primeira-dama de El Salvador, pela Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional [FMLN], sob a presidência da República de Maurício Funes, com o fim da guerrilha, a guerra civil que deixou milhares e milhares de mortos. Com câncer, ela, hoje, está presa, enfrenta grave caçada jurídica, policial e midiática da direita. É acusada de desviar 165 mil dólares do erário. Para despesas pessoais.
– Defecções ocorreram na Frente Sandinista de Libertação Nacional. Com o alinhamento à Cuba, de Fidel Castro, e à URSS [União das Repúblicas Socialistas Soviéticas], de Leonid Brejnev.
Uma segunda Brigada Voluntária formou-se, em 1987. Com Erotides Borges na linha de frente. Sempre ele. Um otimista. Incorrigível. Com a certeza na frente. A história nas mãos. O itinerário dos revolucionários internacionalistas do Brasil incluía, agora, Goiânia, São Paulo, Lima, no Peru, Manágua, na Nicarágua. Faltava mão de obra para colher café no País dividido por lutas fratricidas, lembra-se. Rupturas ocorreram no Bloco de Poder Histórico, confidencia. Adeptos das ideias de Nahuel Moreno, trotskista argentino, saem do País, relata a testemunha ocular da história das revoluções do século XX. A ‘Era dos Extremos’, como anota Eric Hobbsbawn, historiador marxista. Violeta Chamorro, da ala liberal, afasta-se do núcleo duro, Ernesto Cardenal e Fernando Cardenal formulam críticas, diz. Assim como Sérgio Ramírez, frisa.
– Violeta Chamorro ganha as eleições, em 1990.
VOLTA AO PODER
Daniel Ortega, com um programa rebaixado, à direita, volta ao poder, em 2006. É reeleito em 2011. Com um terceiro mandato obtido nas urnas, com 72% dos votos válidos, em 2016. Rosario Murilo, sua mulher, sob uma cultura patrimonialista, de extensão dos vícios privados para a vida pública, é indicada à vice. Com superpoderes. Não há limite de mandatos na Nicarágua. Sérgio Ramírez diz que o que existe, em 2018, é uma ‘caricatura do Sandinismo’. Com culto à personalidade, inflexão à direita e ao centro, violência policial, com repressão política aos protestos, com número de 384 mortos, denúncias de corrupção, patrimonialismo, sem abertura de espaços para os velhos quadros da FSLN. “Um socialismo em que a pobreza não diminui e aumenta o número de milionários”. A Nicarágua é o segundo país mais pobre da região. Ela perde no ranking apenas para o Haiti, pós-terremoto. Cabisbaixo, triste com o destino da revolução, última da América Latina, Erotides Borges, hoje, aos 70 anos, só lamenta:
– Um erro manifestar apoio cego a Daniel Ortega.
Renato Dias, 51 anos de idade, é graduado em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Goiás. Mais: pós-graduado em Políticas Públicas pela mesma instituição de ensino superior, a UFG. Em tempo: com curso de Gestão da Qualidade, pela Fieg, Sebrae-GO e CNI. Além de jornalista pela Faculdade Alves de Faria, a Alfa. O repórter especial do jornal Diário da Manhã e colaborador do www.brasil247.com é também mestre em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento pela Pontifícia Universidade Católica, a PUC de Goiás. É autor de 13 livros-reportagem, premiado por obras investigativas e reportagens de direitos humanos.
A Nicarágua é o segundo país mais pobre da região. Ela perde no ranking apenas para o Haiti Renato Dias, jornalista Um socialismo em que a pobreza não diminui e aumenta o número de milionários Sérgio Ramírez, escritor