Há 200 anos, o Brasil se desprendia das amarras de Portugal e declarou sua independência, a partir de então, o gigantesco território na América do Sul, então colônia portuguesa, passaria a ter mais autonomia e suas próprias leis. O Diário da Manhã conversou com dois historiadores para entender o processo de independência e as marcas deixadas por ela.
O historiador e antropólogo Túlio Fernando Mendanha explica que o processo, no entanto, "foi planejado grupos políticos nacionais, que, na época visavam a ampliação e manutenção da autonomia política herdada do decreto de 1815 expedido por D. João VI (pai de D. Pedro I) que transformava o Brasil em parte do Reino."
"Este decreto nos retirava da condição de Colônia portuguesa, a meu ver a construção dessa autonomia política pós independência é uma de nossas heranças mais importantes, pois enquanto nação passamos a caminhar de maneira menos dependente de Portugal", comenta o historiador.
Túlio explica também que, na construção das narrativas históricas, existe essa espécie de elaboração de grandes heróis, que comumente são homens brancos e ricos.
"Isso provoca esquecimento de outros personagens importantes em acontecimentos históricos relevantes", explica.
"Por detrás de D. Pedro I existia toda uma série de grupos que o apoiavam, o verdadeiro patriarca da Independência, responsável por manejar tais interesses foi José Bonifácio de Andrada, mentor de D.Pedro e a esposa do Imperador, Dona Maria Leopoldina", afirma.
Em busca da identidade
A Doutora em História pela Universidade Federal de Goiás (UFG), Anna Paula Teixeira Daher, afirma que o Brasil ainda está em busca pela sua identidade.
"Do ponto de vista histórico, e eu queria lembrar que esse ano marca o bicentenário da independência e o centenário da Semana de Arte Moderna de 1922, o que se vê é que o Brasil traça um caminho em busca do que é ser brasileiro. E ate hoje não há um acordo. E, nessa busca, alterna entre negar o europeu, negar o que entende por tradicional, e depois abraçar todas essas características de novo", opina.
A doutora em História comenta sobre a importância de se olhar para as diversidades que compõem o Brasil, que vão muito além dos descendentes de europeus.
"Na minha opinião, o verdadeiro caminho para a independência, principalmente nos últimos anos, tem se voltado para o estudo e a compreensão da diversidade de culturas que construíram o Brasil. Não só da Europa, mas dos povos originários, de África e de tantos outros grupos que para ca migraram (como árabes e japoneses). O caminho é longo, mas é um começo", comenta Anna Paula.
Segundo o historiador Túlio, acontecimentos como a independência repercutem de forma acanhada no cotidiano.
"De fato, ao pintar o quadro da Independência (feito quase 70 anos depois do grito do Ipiranga) Pedro Américo colocou um tropeiro e um carreiro na tela, ambos estão ali para representar ainda que simbolicamente que o povo assistiu o episódio, mas dele não teve ampla participação efetiva, e dele usufruiu pouco em um sentido prático de suas vidas. O povo hoje pode ter acesso a acontecimentos políticos de grande envergadura a partir da internet e das redes sociais que também são instrumentos de mobilização."
Com isso, o historiador faz uma analogia à falta de consciência de classe, que tem grande impacto na maneira como a população se comporta diante de acontecimentos políticos.
"Dito de outra forma, se a independência fosse hoje, provavelmente seria transmitida por lives feitas por quem concordava com o ideal de liberdade e por grupos que, pelos mais diversos interesses gostariam de continuar sendo uma colônia extrativista europeia" finaliza.
Há muito o que se refletir ainda sobre o que é o Brasil, afinal, 200 anos de independência representam a juventude de um país comparado a outros milenares. Valores culturais têm grande discussão em rodas de conversa e salas de aula, fruto de um país onde a população busca pela identidade e, através da história, busca compreender suas origens, que vão muito além de 200 anos.