100 anos: o filme que nós nunca veremos

O universo do cinema sempre apresentou algumas ousadias merecedoras de surpresa e espanto. O longa-metragem Boyhood, de 2014, foi gravado durante 12 anos com o mesmo elenco e mostra o envelhecimento dos atores simultâneo ao dos personagens. Um exemplo ainda mais abismal é o projeto Ambiancé, previsto para 2020, que pretende ser o filme mais longo da história, com duração total de 720 horas (equivalentes a 30 dias) – para ele foi lançado um trailer de 7 horas de exibição. Se tais iniciativas parecem bastante improváveis antes de serem finalizadas, o anúncio feito pelos diretores John Malkovich e Robert Rodríguez veio para propor um teste ainda maior ao poder do tempo: um filme cuja data de estreia está prevista para o século XXII.

O filme 100 Years: The Film You Will Never See (100 anos: o filme que você nunca verá) tem estreia prevista para o dia 18 de novembro de 2115. O roteiro é de autoria de John Malkovich, que também está no elenco principal. Malkovich tem 63 anos e ficou conhecido por sua atuação em mais de 70 filmes, dentre eles Os gritos do silêncio (1980), Quero ser John Malkovich (1999) e Queime depois de ler (2008). Robert Rodriguez, o diretor, tem 48 anos e ficou famoso pelas contribuições nos filmes Kill Bill e À prova de Morte, de Quentin Tarantino, e também foi diretor de Sin City e O Mariachi. Ambos anunciaram o lançamento de 100 Years em novembro de 2015, através de três trailers que não mostram nenhuma imagem original do filme, que só deve ser visto em 2115.

Força-tarefa

Uma verdadeira operação de segurança foi realizada por Malkovich, Rodríguez e envolvidos para que o filme só seja exibido em 2115, quando os dois e, provavelment, todos nós já não faremos parte deste mundo. Assim como as bebidas envelhecidas, o filme, que já está pronto, foi depositado em uma espécie de cápsula do tempo. Tal cápsula é na verdade um cofre de alta tecnologia feito de vidro e à prova de balas que abrirá automaticamente no dia 18 de novembro de 2115. Tal cofre foi lacrado no ano passado, durante a realização do Festival de Cannes, na França. O delegado geral do prestigiado festival, Thierry Frémaux, mostrou-se entusiasmado com o projeto, afirmando que trata-se de algo claramente inovador.

Para a estreia, foram convidadas cerca de 1.000 pessoas ao redor do mundo, incluindo Malkovich e Rodíguez. O convite deve ser herdado pelos descendentes de cada um dos convidados, que terão o direito de participar da cerimônia. O filme será exibido no festival de Cannes antes de rodar por outras localidades do planeta. “Espero que nossos descendentes considerem o filme 100 anos para a disputa da Palma de Ouro [prêmio máximo oferecido pelo festival] no festival de Cannes de 2116”, declarou Thierry Frémaux. Segundo Malkovich, a criação do filme se baseia na vontade insaciável de prever a situação do mundo nos próximos séculos: “a noção inerente a isso é para tentarmos imaginar como será o mundo em 100 anos”.

Os realizadores uniram-se com a fábrica de bebidas Remy Martin para criar um filme inspirado no tempo que leva para se produzir uma garrafa do conhaque Louis XIII. O produto foi criado em 1874 e consiste numa mistura de bebidas envelhecidas, sendo a mais jovem delas maturada por pelo menos 40 anos. Uma garrafa de 700 ml de Louis XVII custa no mínimo 3.400 dólares no mercado, o que equivale hoje ao valor aproximado de 11 mil reais. Todos os 1.000 convites para a première do filme foram produzidos em metal e enviados como cortesia do conhaque Louis XVII. “Quando essa ideia me foi proposta, considerei algo bastante inteligente e fascinante, o fato de trabalhar em algo que nunca verei”, conta Malkovich.

Nos trailers, o que podemos ver são três possibilidades diferentes de futuro em um universo distópico dominado pela tecnologia. Essa foi uma das únicas pistas reveladas pelos realizadores, tendo em vista que nenhuma sinopse ou detalhe do enredo foi revelada por eles. Outros dois nomes do elenco do misterioso filme também foram divulgados. Um deles é o do ator chileno Marko Zaror – conhecido por participar de filmes de artes marciais. O outro é o da atriz Shuya Chang, que até então executou pequenos papéis em filmes como A vingança dos dragões verdes (2014) e O tigre e o dragão: a espada do destino. Outra pista revelada pelos autores sugere que Zaror desempenha um papel antagônico, enquanto Malkovich e Chang serão os heróis da trama.