Dentre as várias histórias intensas do período da ditadura militar no Brasil, uma das mais bonitas e até hoje sem um ponto final, foi a que envolveu a jovem militante Iara Iavelberg. Nos breves 27 que durou sua jornada, a jovem enfrentou forças inimagináveis, abandonou uma vida que poderia ser o sonho de várias outras mulheres, para viver a sua própria utopia.
Nascida em um dia 7 de maio, do ano de 1944 na capital paulista, era filha de uma família judaica rica e conservadora. Aos 16 anos de idade já estava casada, uma relação arranjada com um médico bem mais velho que circulava nos ciclos sociais dos pais da garota. Mas isso nunca foi o interesse que Iara queria para si, então mal passados três anos ela abandonou o marido e fora desfrutar as próprias vontades.
Era o início dos anos 60’, para jovens de classe média e alta, as influências europeias chegavam rapidamente. A moça se tornou adepta do amor livre, logo após se separar do casamento precoce. Lia livros, participava de debates, discussões e reuniões estudantis. Logo entrou para o movimento estudantil, bem quando o golpe militar explodia no começo de 1964.
Em São Paulo estava na crista da onda, vivia de perto a efervescência musical, cultural e politica que começava a borbulhar pelas universidades do país. Um dos seus casos mais notórios foi com um dos líderes estudantis na época, o jovem e até então um nato revolucionário José Dirceu. Iara era alta, bonita, olhos claros e cabelos bem cuidados, se tornara rapidamente a mais desejada esquerdista em meio à militância.
O fato de ser extremamente vaidosa, jamais diminuirá a verdadeira essência da jovem. Apesar de ter vindo de berços dourados da elite paulistana, Iara encontrou nas leituras socialistas a verdadeira late motive de sua vida. Ela que prezava pela liberdade, sentimental, do corpo e da mente, não poderia deixar de se incomodar com a situação politica de repressão que assombrava o País nos anos 60.
Paixão Clandestina
Era psicóloga por formação e professora por vocação. Quando a barra apertou já no fim dos anos 60’ e a ditadura militar começava a prender, torturar e matar diversos companheiros e amigos, a jovem entrou para a clandestinidade. Primeiro integrando a Organização Revolucionária Marxista Política Operária (Polop) e depois o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), quando a repressão começou a desarticular os grupos contra o regime, conheceu Carlos Lamarca, comandante da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) dois meses depois dele desertar do Exército, em abril de 1969.
A paixão entre a filha de milionários paulista que tornou-se guerrilheira e o filho de sapateiro carioca, capitão desertor do Exército brasileiro e um líderes da luta armada, foi fulminante e eterna. Os dois foram viver juntos e passaram dez meses escondidos em ‘aparelhos’ pelo País. Uma das companhias do casal nestes esconderijos e que testemunhou de perto a relação entre os dois foi a guerrilheira ‘“Vanda”, da VPR, codinome de Dilma Rousseff, décadas depois a primeira mulher presidente do Brasil. Esse romance foi retratado no filme Lamarca de 1994.
A viagem, em junho de 1971, de Iara e Carlos Lamarca do Rio de Janeiro para a Bahia, foi a última vez em que estiveram juntos, antes da morte de ambos. Em 1970, começaram treinamento militar no Vale do Ribeira – onde Iara deu aulas teóricas de marxismo aos guerrilheiros – e, caçados pelo Exército, cartazes com a foto dos dois, entre outros, foram espalhados por todos os cantos do País. Neste ano, em 7 de dezembro, Lamarca liderou o sequestro do embaixador suíço Giovanni Bucher, no Rio de Janeiro, em troca da libertação de 70 presos políticos.
Nos primeiros meses de 1971, a maioria das organizações de esquerda já estava desarticulada e semidestruída, e os restos da VPR juntaram-se ao MR-8. Na nova organização, Iara, intelectual, teve um cargo de cúpula e Lamarca, considerado mais despreparado pela nova direção, foi rebaixado a militante de base, enviado para o interior da Bahia, enquanto a mulher deveria se estabelecer em Salvador.
Amargo fim
As causas e até a data de sua morte permanecem envoltas em mistério. A data oficial é contestada por relatório do Ministério da Aeronáutica, segundo o qual ela teria se suicidado em 6 de agosto, acuada pela polícia em uma residência em Salvador. Alguns militantes, presos no DOI-Codi de Salvador, dizem ter ouvido seus gritos quando era torturada, o que contradiz a versão do Ministério da Marinha, segundo a qual ela teria sido morta durante “ação de segurança”.
Décadas mais tarde, a sobrinha de Iara, a jovem chamada Mariana Pamplona iniciou um processo de investigação a fundo, sobre as causas da morte da tia. As circunstâncias controversas, que fizeram que o caixão de Iavelberg fosse entregue à família, com ordens expressas que o proibia de ser aberto, não impediu que Iara fosse enterrada na ala dos suicidas do cemitério Judeu de São Paulo. Apenas em 2003 os restos mortais puderam ser enterrados perto ao túmulo da família.
Os estudos e investigações sobre a morte da Iara Iavelberg geraram um filme-documentário chamado Em Busca de Iara. O roteiro do filme foi escrito por sua sobrinha Mariana Pamplona.
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