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CULTURA

O galo avisa do ano que abriu

“Confia teus negócios ao Senhor e teus planos terão bom êxito. Tudo fez o Senhor para seu fim, até o ímpio para o dia da desgraça” (Provérbios 16:3-4)

As estrelas falam de um 2017 que deve ser punk, já o sol, este minimiza ao insistir que nem tanto para aqueles que, em 2016, aprenderam a levantar cedo, arar a estrada e mastigar as pedras do caminho. O fato, histórico, implica na política capenga do Brasil, traz como frame do dia a posse dos eleitos clicados em fotos aos abraços com os compadres e pelegos de diploma ainda fresco dos respingos partidários às mãos. Em dois ou três meses a verdade trata de dedurar os compadres e clicar a foto que vira manchete viral ao lado do também investigado agente ‘Japonês da PF’, desta feita, de algemas às mãos sujas no lodo da comissão da corrupção. Tolos poderosos sem poder de ética algum, mal sabem que “o sábio escala o caminho da vida, para evitar a descida à morada dos mortos” (Provérbios 15:24). Antes de crença alienada ou conversa fiada, fato cultural tragicômico apaniguado, patrimonialista e tradicional, quintal onde a unidade de esquerda no exercício da politicalha passou a ser, há tempos, uma quantia especificada entre o cifrão e o centavo capaz de manipular fantoches sociais e apequenar os críticos de plantão. “Ninguém se iluda. Se alguém de vós acredita ser sábio aos olhos deste mundo, faça-se louco para ser sábio” (BOFF, p. 28, in Coríntios: 1a e 2a epístolas)

Ainda arrotando o peru e as brigas de família do Natal, o eleitor estancado na Terra de Cabral que abrigou Macunaíma e deu à luz o Jeca Tatu fomenta o consumo exacerbado, alavanca datas comerciais como o Dia dos Pais, das Mães, Das Crianças. Respira a certeza incerta erguida na dúvida, percebe-se também filho do Espírito Santo sem se atentar às festas cristãs também que se dão também atrás das grades, na manjedoura que abriga Alas Feminino e Masculino esquecidas na prisão – nicho onde a sociedade dos normais esconde seus pecados enquanto filhas e filhos da puta. No mundo, notícias sobre a fronteira fria da (des) humanidade brigam por espaço em capas de jornais que denunciam ameaças física, psicológica e espiritual impostas à migração mundial forçada, à sombra da mansão da hipocrisia perfilada pela lei escrita a caneta banhada em ouro expropriado dos homens entregues a territórios sem lei o que perpetua a crescente diferença de classes, segundo COUTINHO “a miséria da razão” (2012). Antes que ocorra o advento capitalista de um provável suicídio coletivo – em construção, dividido em parcelas – acreditemos nas crianças, focados na ideia pedagógico-educativa de que nada emancipará ou libertará as gerações vindouras senão a consciência ou ‘feeling’ que a sabedoria conhece e nomina átomo. Essa ideia que o senso comum desconstrói pelo viés da religiosidade mercantilizada em forma de fé descartável aos incautos que clamam por Deus, cegos do poder de visão planetária que esbanja Freire: “E o mundo não é um laboratório de anatomia nem os homens são cadáveres que devam ser estudados passivamente” (1977).

A ser confirmado como verdade histórica, este ano será regido pelo galo – segundo o horóscopo chinês – quando quem levanta mais cedo colhe frutos frescos. Como o canto do galo tem hora certa, o mais provável é que vem vindo muita revelação nos meses que seguem e que irão contar da odiosa doutrina das velhas virgens cristãs – a serem reveladas – dando a luz à verdade abortada pelos cantos gélidos e escuros de um corredor fétido secular, velado a uma vida calada e vesga que sofre na prisão da puberdade – noite mal resolvida – o ônus da energia não consumida do orgasmo silenciado nos braços do diabo. Antes de provocativa uma verdade afiada, navalha ética capaz de aparar a moral dos imorais, atestada em ‘O suspiro dos oprimidos’: “A religião é o solene desvelar dos tesouros ocultos do homem, a revelação dos seus pensamentos íntimos, a confissão pública dos seus segredos de amor.” (FEUERBACH, s/d.)

Sem indagar das mentiras e descalabros que direcionam à sepultura os direitos roubados, a massa amorfa, indolor, torna-se vítima incapaz de provocar a onda e o fluxo, quebrar as máscaras, revolucionar a inércia da miséria perpetuada sob as botas da mentira, alienada às redes sociais que propagam o poder de consumo e enganação, malversa o momento crucial da (des) humanidade que continua, insiste em nascer, morrer, escapar à Terceira Guerra Mundial. Que morram o poder e a coação dos velhos poderosos e que se superem dos traumas as crianças sírias roubadas na inocência, a síntese antropológica da (in) verdade ética tocada a hipocrisias a serem superadas a partir de mais igualdade social – a liberdade para a libertação – distribuição das riquezas socialmente construídas a partir da invenção do mundo moderno, pois que Cristo avisou: “Deixai vir a mim os pequeninos, pois deles é o Reino do céu.” Mal sabia o revolucionário cristão que tanto as crianças como os reinos, há muito, pertencem aos fariseus de uma religião a qual manipula – pela mídia – a legião de trabalhadores carentes de saúde, habitação, lazer, cultura, emprego e libertação da alienação. A carruagem da ignorância (des) humana afunila a alma sedenta de salvação, trilha a contramão da sabedoria da filosofia transcendental refletida em ‘A lógica dos orientais’: “A liberdade do Eu seria, desde então, a fonte comum do conhecimento e da ação, uma vez que a ação já seria conhecimento e o conhecimento, pura atividade criadora” (JAMBET, 1983, p. 67)

Enquanto Nova York, Califórnia e o Google aumentaram suas próprias metas para ação climática depois da eleição do novo presidente dos Estados Unidos, o Brasil volta às manchetes mundiais com mais um massacre de sujeitos sem face, internos do sistema carcerário, a classe dos reeducandos, 80 deles afiliados ao crime organizado representado em terno e gravata no Congresso do País. “A técnica penitenciária e o homem ‘delinquente’ são de algum modo irmão gêmeos. [...] A prisão, essa região mais sombria do aparelho de justiça, é o local onde o poder de punir, que não ousa mais se exercer com o rosto descoberto, organiza silenciosamente um campo de objetividade em que o castigo poderá funcionar em plena luz como terapia e a sentença se inscrever entre os discursos do saber” (FOUCAULT, 1987, p. 226-227). Ilusão capitalista, a realidade impressa em cores pós-modernas dá a manchete de um globo da morte o qual a história dirá se realmente existiu.

E o pulso, ainda pulsa!

(Antônio Lopes, escritor, filósofo, mestre em Serviço Social, pesquisador em Ciências da Religião/PUC-Goiás; aluno-ouvinte em Direitos Humanos/UFG)

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