Os protestos convocados pela classe artística hoje prometem discutir a ‘desburocratização’ da lei Aldir Blanc, edital de emergência lançado pelo Governo Federal no ano passado para contemplar trabalhadores da cultura em meio à pandemia. Denominado Frente Ampla da Defesa da Cultura, o movimento tem como objetivo cobrar – entre outras coisas - efetividade na captação de recursos do Fundo de Cultura do estado referente aos anos de 2015 e 2018, que não teriam sido pagados.
“A gente tem um edital de difícil compressão, muita letra miúda, extenso. Para a galera do rock, ou para qualquer setor da cultura, é difícil”, diz o produtor cultural Leo Bigode, da Monstro Discos, ao DM. O mapa goiano, afirma ele referindo-se ao site, não funciona: “Para quem é do interior ou de comunidades carentes, que não tem acesso à internet e não têm condições de escrever projeto, é muito mais difícil. Vejo com preocupação o jeito que o estado de Goiás está trabalhando nesse edital da Aldir Blanc.”
Poeta e editor da Goiânia Clandestina, Mazinho Souza assevera que os documentos e comprovações para a inscrição dificultam, na Lei Aldir Blanc, o processo de captação do recurso. “A quantidade de documentações e comprovações artísticas que solicitam geram uma exclusão da nova geração de artistas, que por estarem iniciando seus projetos e produções, não possuem um currículo extenso como solicitam os editais”, declara.
“Quando vemos editais de cunho emergencial, esse nicho de artistas continua sem contemplação, o que impossibilita a continuidade de seus trabalhos e/ou projeções artísticos de maneira que contribuam com a cultura do município e do estado, sendo obrigados, na maioria das vezes, a abandonar suas carreiras artísticas e buscar outros meios para sobreviverem”, crê Mazinho, um dos poetas mais ativos da cena goiana.
Para os organizadores do protesto, a luta não é apenas pela ‘burocratização” da lei Aldir Blanc. “Estamos vivendo uma guerra declarada contra a cultura no Brasil. Querem apagar, queimar nossa memória, nossa diversidade, demonizar artistas, censurar projetos artísticos-culturais que não se enquadram dentro do perfil do governo autoritário de Bolsonaro”, declara a produtora cultural Patrícia Vieira.
Os editais do Fundo também são questionados pela Frente Ampla em Defesa da Cultura. Segundo o grupo, nestes anos, o FAC era vinculado e estipulado em lei e teria que ser aplicado na ordem de 0,5% da arrecadação líquida do Estado. “Vivemos um momento histórico sombrio. O exercício do poder no governo federal é autoritário, perverso, suprime direitos democráticos duramente conquistados pela sociedade e desrespeita a vida”, diz a atriz, diretora, dramaturga, teatro-educadora, criadora do Grupo Zabriskie e fundadora do Zabriskie Teatro, Ana Cristina Evangelista.
Segundo a atriz, o modelo de governo atual se utiliza de manobras para fabricar fatos e se manter no poder. “O ato da Frente Ampla Em Defesa da Cultura e das Artes de Goiás é fundamental, pois traz a outra voz, de quem se indigna e sente na carne, no dia a dia, o desmonte da Cultura, a supressão de direitos conquistados com muita luta ao longo de décadas que garantiam, parcialmente, um fôlego para a produção e o acesso democrático da sociedade à Arte e à Cultura”, afirma a artista.
Em evento na sexta, o governador Ronaldo Caiado disse que tinha “orgulho em iniciar a retomada da cultura”. Ele declarou, na ocasião, que resgatou “toda esta classe que sofreu duramente, a dos artistas que ficaram totalmente sem público e sem perspectiva de tê-lo”, disse. “Qualquer evento que o Governo de Goiás fizer sob minha gestão, as pessoas terão certeza absoluta que vão receber o dinheiro”, frisou. E arrematou: “não se governa com esperteza, mas com qualidade de gestão, transparência e eficiência”.
“É preciso que a gente entenda que investimento em cultura não é só o que está previsto em lei. Investimento em cultura é muito sério, e é um negócio que leva a marca a chancela do estado pro mundo”, afirma Leo Bigode.
“Enquanto o Distrito Federal abriu agora, recente, o edital de 38 ou 40 milhões (aproximadamente), um montante de recursos para a área deles, do DF, o estado de Goiás abriu um fundo de cultura de R$ 2 milhões. O que tá claro é que existe muito pouca vontade de dar atenção e entender que o setor cultural representa 4% do PIB”, arrematada.