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Bis exibe show antológico dos Stones em Copacabana

É apenas rock ´and roll, mas eu gosto: o canal Bis exibe nesta segunda-feira, 3, a partir das 21h, o histórico concerto dos Rolling Stones nas areias da praia de Copacabana, no Rio de Janeiro. Parte da turnê mundial “A Bigger Bang: Live On Copacabana Beach”, com a qual os músicos rodaram o planeta entre 2005 e 2007, o show ganhou versão em vinil e CD no ano passado. Os produtos estão à venda no site oficial da banda britânica.

Assim que Keith Richards mandou o riff inicial de “Jumpin´ Jack Flash”, o público saíra do chão: 1,5 milhão de pessoas pulavam ao som do demencial rockão stoniano naquele 17 de fevereiro de 2006. É preciso uma boa dose de arrogância para tocar na praia de Copacabana, no Rio, antes do carnaval. Mas para os Rolling Stones ousadia é uma necessidade que lhes tornam adoravelmente marginais e subversivos.

“Foi uma emoção absoluta e inesquecível – uma energia muito boa viver aquele momento. Para mim, ainda soma o fato de que foi a primeira vez que vi o mar e a primeira vez que fui ao Rio de Janeiro (onde, por coincidência, defendi meu doutorado ano passado, em História, na UFRJ)”, diz Diego Mascate, pseudônimo artístico do compositor Diego de Moraes. “A primeira vez que vi o mar, tendo o privilégio de ter como trilha sonora os Stones em um show histórico, bicho!!! Surreal!”, afirma.

No setlist, uma paulada de clássicos, com “It´s Only Rock´n´Roll (ButI Like It)”, “Tumbling Dice”, “Wild Hordes”, Midnight Rambler”, “Happy”, “Miss You”, Sympathy For The Devil”, além de “Honky Tonk Woman” e “Brown Sugar”. Mas o melhor da apresentação, ao menos em termos de músicas que estão há décadas gravadas em nossa memória musical, ficou para o bis, com “You Can´t Always Get What You Want” e “Satisfaction” – dois hits obrigatórios nos shows dos Stones.

Em “Life”, autobiografia lançada em 2007, Richards diz que, quando assistiu ao vídeo do show pela primeira vez, percebeu que estava muito concentrado, “concentrado pra caralho”. A preocupação, escreve no músico na obra, era com a quantidade de pessoas que havia em Copacabana e se o som estava sendo projetado como deveria para o outro lado da baía, “ou se ele acabava ficando todo embolado no meio do caminho”.

Diego conta que conseguiu ver Jagger, Richards, Wood e Watts atravessando a passarela que ligava o Copacabana Palace ao palco. “Foi incrivelmente eletrizante ouvir o riff inicial de “Jumpin’ Jack Flash”, ali, pulando no meio da multidão. Um dos melhores shows que vi na vida! Uma cena emocionante foi quando eles entraram numa passarela que dava para um palquinho no meio da multidão”, recorda-se.

Nessa hora, continua Mascate, conseguiu enxergá-los melhor. E entendeu como era a sensação de estar num pequeno palco de um pub londrino projetado para o meio da massa. “Foi como se eu estivesse vivendo um sonho!”, descreve o músico, que à época estava fascinado pelo clássico LP duplo “Exile On Main Street” (1972), que neste ano completa meio século como uma das obras mais importantes do rock no século 20.

Para o poeta e turismólogo Alex da Cunha, estar entre o milhão e meio de pessoas naquela noite foi um momento histórico. “Primeiro, pensei em ir vendendo poesia de cidade em cidade até chegar lá, saindo uns 20 dias antes. Como ainda faltava 30 dias para o show, pensei: ‘cara, são os Rolling Stones.’ Na praia de Copacabana, de graça, vou organizar uma excursão”, relata Cunha, um dos organizadores da Excursão da Galera, formada por estudantes da Universidade Federal de Goiás (UFG).

Ao desembarcar no Rio, o grupo percebeu que haviam pessoas acampadas há dias na praia e nas calçadas, em suas rodas, com violão na mão, um cartaz e uma bebida correndo de mão em mão. “Cada pessoa ali era uma atração e, cada qual do seu jeito, chamava atenção por alguma coisa”, recorda-se o historiador Gildete Junior.

“Consigo lembrar sensações como a brisa que fazia na hora que tocou “Satisfaction”. Pude entender o porquê de tanto sucesso, o porquê de tantos fãs pelo mundo, o motivo de tanto sacrifício que muitos fizeram para estarem alí. Quando ouvi Stones ao vivo entendi tudo isso, entendi as justificativas, sacrifícios e loucuras que cada uma das mais de 1,5 milhões de pessoas que ali estavam fizeram para vê-los”, lembra.

Além da recordação de assistir uma das bandas mais importantes do rock ao vivo, o historiador Paulo Vinícius Maskote guarda outra lembrança daquela excursão para o show dos Rolling Stones: “é uma lembra mais que especial, desde o romance com a pessoa que conheci no ônibus na ida, aquele romance relâmpago de viagem e excursão, risos, até a ida à praia, violão no ônibus, muita música. “Fizemos amizades que duram até hoje, e fortalecemos as amizades que já existiam.”

“Essa viagem foi muito importante para eu vencer minha timidez, pois já compunha (mas escondia minhas canções, me assumindo mais como baterista de algumas bandas underground de Senador Canedo). Com o clima alto astral da viagem, peguei um violão emprestado lá no ônibus e toquei algumas músicas dos Stones, dos Beatles, do Raul – e no meio do clima festivo comecei a apresentar minhas primeiras composições para galera”, arremata Diego de Moraes.

Sim, o show não se tornou histórico apenas pela quantidade de pessoas de Brasil, outros países da América Latina e até mesmo dos Estados Unidos que estavam em Copacabana em fevereiro de 2006, e sim pelo entrosamento de Jagger, Richards, Wood e Watts no palco: vê-los ali, sessentões, era como se fosse a metonímia sonora do descaralhamento dos sentidos, com uma energia capaz de pulverizar um país inteiro.

É preciso recordar que foi aqui, saudando o público num português singelamente britânico, que os Stones fizeram um de seus shows mais memoráveis. Parecia que os quatro estavam tocando nos pequenos pubs do começa da carreira. Entendiam-se tão bem que o 1,5 milhão de pessoa não os intimidaram. Era o ápice, como o momento do gozo numa transa, da música rebelde, transgressora e suja, porém libertária.

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