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Oscar chega à sua 94ª edição em busca da audiência perdida

O Oscar está diante de uma encruzilhada inédita desde que o tapete vermelho foi estendido pela primeira vez em 1926. Importante festa para coroar os filmes mais badalados do momento, a festa chega à sua nonagésima quarta edição precisando lidar com acusações espinhosas sobre falta de diversidade. Também preocupa a audiência. Em queda livre nos últimos anos, a de 2021 em comparação com 2020 despencou 58%. Que, por sua vez, havia sido 20% menor do que a de 2019. São números ruins para um espetáculo que chega a 225 países. Mas, bem à sua maneira, a Academia procura entender os novos tempos.

Queiramos ou não, tem sido consistente a tentativa de aumentar a diversidade dos votantes, trazendo para o tapete vermelho pessoas negras e de outras nacionalidades. Neste domingo, 27, o Oscar buscará passar uma borracha na cerimônia passada, limitada por restrições sanitárias, numa final sem sal nem açúcar e com um saldo abaixo do esperado para um evento televisionado. Agora, ao menos, a festa do cinema retorna para sua casa, o Dolby Theatre de Los Angeles, e será transmitida ao vivo pela ABC a partir das 20h, horário da costa leste dos Estados Unidos. Por aqui, o público poderá acompanhar a entrega das estatuetas pela TNT, Globoplay e E!.

Bong Joon Ho
O cineasta sul-coreano Bong Joon Ho surpreendeu ao sair como o grande vencedor do Oscar em 2020 - Foto: Divulgação

Por que o Oscar virou ainda mais difícil de prever? Artigo publicado na Hollywood Reporter deu pistas e apresentou as nuances da renovação pela qual a Academia de Ciências e Artes Cinematográficas passa no momento. Até a eclosão do movimento #OscarsSoWhite, responsável por jogar lenha na fogueira ao apontar o dedo para a falta de diversidade entre os indicados em 2016, a Academia achava que não precisava mais do que 300 pessoas aptas a votar. Nos anos seguintes, foram 774, 928, 842 e 819. Houve uma queda, justificável, em 2021, por cauda do coronavírus. No entanto, o resultado é: mais de 4 mil integrantes não faziam parte do grupo anos atrás.

Meio óbvio, as mudanças reviraram o metiê que costumava contemplar filmes que tinham “a cara do Oscar”. Com “Parasita” dominando a edição de 2020, em cujo elenco os atores falavam coreano e era estrelado por atores e atrizes do país asiático, Bong Joon Ho trouxe o público norte-americano - pouco dado a assistir filmes que não sejam em inglês e, quando faz esforço, precisa ser dublado - para refletir sobre pautas pertinentes ao capitalismo contemporâneo e suas ramificações na sociedade, isto é, estamos falando de um filme político. Quer um atestado maior de mudança?

No ano passado, apesar das mudanças provocadas pela pandemia, reinou a diversidade, ou melhor, o aspecto improvável. Embora não seja radical como “Parasita”, a Academia decidiu que deveria dar o prêmio principal para “Nomadland”, uma obra que explora a convergência entre o gênero cinematográfico documentário e a ficção. Tem como foco o lado obscuro do sonho americano, com trabalhadores morando em trailers, sem família, desprovido de dinheiro e sem fazer a mínima noção de como seguir em frente numa sociedade que os massacra.

Será que as mudanças continuaram? Provável que sim. Podem haver, aqui e ali, surpresas. O mais indicado é “Ataque aos Cães”, filme épico, ambientado no velho oeste americano, mas dirigido por uma neozelandesa, Jane Campion. Concorre em nada menos que 12 categorias. Caso coloque as mãos na estatueta, e leve para casa também a de melhor direção, Jane terá sido apenas a terceira mulher na história. Deve-se levar em consideração também que, mesmo sendo de um país cujo idioma é o inglês, não estamos falando de uma cineasta nascida nos Estados Unidos.

De longe, neste Oscar, a grande surpresa fica por conta de “Drive My Car”, do japonês Ryusuke Hamaguchi, que pode sair vencedor nas categorias de melhor filme, diretor, roteiro adaptado e filme internacional. Baseado em conto de mesmo nome escrito por Haruki Murakami, a película se serve da prosa refinada, com alta capacidade de abordar a solidão, para mergulhar na natureza humana. O enredo, costurado por imagens plásticas e diálogos certeiros, já conquistou nada menos que 60 prêmios, além da fama que o credencia como a obra fílmica que melhor trata das angústias adultas numa sociedade capitalista. Hamaguchi ama as palavras e a literatura.

Fora Hamaguchi, com nada menos que quatro indicações, os estrangeiros no Oscar ainda possuem uma atuação tímida: Javier Bardem, concorrente como melhor ator, e Penélope Cruz, indicada a melhor atriz, talvez não ganhem. O que, prontifico-me a dizer, será um erro. Sem exagero, a melhor atuação de uma mulher na corrida pela estatueta foi de Penélope, num filme com pano de fundo político, “Mães Paralelas”, do mestre do cinema moderno espanhol Pedro Almodóvar. Na fita, Cruz dá vida a uma fotógrafa que abre as valas escondidas pelo ditador Francisco Franco. O filme também está no páreo em melhor trilha sonora, com Alberto Iglesias.

'Onde Eu Moro', representante do Brasil no Oscar, pode fazer história de ganhar estatueta - Foto: Netflix/ Reprodução

Até o Brasil, país que bateu na trave com Fernanda Montenegro pela sua atuação em “Central do Brasil", pode sair-se vencedor do Oscar. Com “Onde Eu Moro”, Pedro Kos figura com alguma chance numa categoria que não tem tanto apelo midiático, melhor documentário em curta-metragem: o filme, com olhar humano, mostra uma realidade quase distópica na qual estamos submersos. É como se estivéssemos achando que assistimos um filme de ficção-científica, mas trata-se de um filme realista.

Com um histórico cheio de bolas mandadas para fora, como deixar de conceder demorar para conceder o Oscar honorário a Jean-Luc Godard (com a justificativa errônea de que o autor de “Acossado” era antissemita) e Federico Fellini (sem razões aparentes, a não ser a falta de sensibilidade da academia), o tapete vermelho - embora tenha premiado D.W. Griffith, um notório racista - ainda segue um termômetro importante sobre o cinema mundial. É certo que houveram surpresas, como “O Artista” (um filme mudo) ganhar na categoria melhor filme em 2012. Mas ainda há muito a se percorrer até que se tenha de fato diversidade. Vamos até logo mais.

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