Luiz Carlos Merten
Quem anda pela Hollywood Boulevard, em Los Angeles, encontra, na altura do 6801, a estrela da fama de Harrison Ford. As voltas que o mundo dá. Há 50 anos, ele chegou a desistir da carreira de ator, decepcionado com a situação dos papéis. Em Zabriskie Point, de Michelangelo Antonioni, não foi mais que uma ponta. Com mulher e dois filhos para sustentar, Harrison abandonou a carreira. Filho de pai irlandês e mãe judia russa, estudou Inglês e Filosofia. Poderia, quem sabe, lecionar. Preferiu tornar-se carpinteiro. Um de seus clientes tinha conexões com o cinema, sugeriu o nome dele para um amigo, um tal de George Lucas, que em 1972 estava formando o elenco de American Graffitti/Loucuras de Verão.
Harrison Ford não era protagonista, mas o estrondoso sucesso do filme teve repercussão imediata em sua vida, e futuro. O próprio Lucas começou a trabalhar em seguida num projeto que demorou para emplacar. Ninguém botava muita fé numa tal de saga intergaláctica que ele chamava de Star Wars. Finalmente, a Fox resolveu bancar o filme, mas com orçamento inferior ao que ele esperava. Lucas lembrou-se de Harrison e chamou-o para fazer Han Solo. O resto é história. O filme virou fenômeno de bilheteria em 1977, a saga prossegue até hoje com seus derivados. No começo dos anos 1980, um inesperado golpe de sorte. Lucas, de novo, e Steven Spielberg, que se convertera no jovem Midas de Hollywood, graças ao sucesso de Tubarão e Encontros Imediatos de Terceiro Grau, resolveram fazer um filme para recuperar o espírito aventureiro das matinês da infância de ambos.
Criaram o personagem de Indiana Jones, no roteiro que intitularam Os Caçadores da Arca Perdida. Para o papel, tinham um ator em vista, Tom Selleck, mas ele preferiu fazer a série Magnum, na TV. "E se a gente usasse o Harrison?" Foi assim, numa conversa casual entre produtor e diretor, que Harrison teve a chance de interpretar outro personagem emblemático. É bom lembrar tudo isso nesta quarta, 13, quando ele completa 80 anos - nasceu em Chicago, em 1942. Em 1982, aos 40 anos, fechou um círculo ao interpretar o Deckard do cultuado Blade Runner, O Caçador de Androides, de Ridley Scott. A carpintaria virou hobby, e o problema é que Harrison Ford passou a ter cada vez menos tempo para exercer a função.
Em compensação, disparou na carreira e, de ator, virou astro. Passou a acumular recordes - segundo o Guinness Book, nenhum outro ator, nem Tom Cruise, gerou tanto lucro de bilheteria. Possui o maior número de filmes que ultrapassaram US$ 100 milhões de renda. Han Solo e Indiana Jones viraram personagens de séries. Money, Money, Money. Harrison foi até indicado para o Oscar de melhor ator, por um filme magnífico de Peter Weir - A Testemunha, de 1986. Indiana Jones - e O Templo da Perdição, A Última Cruzada, O Reino da Caveira de Cristal. A história não terminou e um novo filme está sendo produzido, só que, dessa vez, Spielberg não é mais o diretor. Han Solo reapareceu em O Império Contra-Ataca, O Retorno do Jedi, O Despertar da Força e A Ascensão Skywalker. Deckard voltou em Blade Runner 2049.
A ficção científica fez muito por ele, na tela como na vida. Sua segunda mulher foi Melissa Mathison, a roteirista de E.T., do amigo Spielberg. Desde 2010 está casado com Calista Flockhart. Deu-se muito bem em filmes policiais e de espionagem - Acima de Qualquer Suspeita, Jogos Patrióticos e Perigo Real e Imediato. Nos dois últimos foi o agente Jack Ryan, criado pelo escritor Tom Clancy. Ressuscitou, na tela grande, a série de TV O Fugitivo, e foi o presidente dos EUA em Força Aérea Um. Satirizou-se em Cowboys e Aliens, Os Mercenários 3 e em A Vida Secreta dos Bichos, quando deu a voz ao Galo. Ganhou um Globo de Ouro Honorário, o Cecil B. de Mille Award, e um César, o Oscar francês, especial. Na quarta, ao ingressar nos 80, Harrison Ford poderá pensar nas reviravoltas que a vida dá - que a vida dele deu. Uma trajetória e tanto para quem um dia ouviu de um executivo que buscasse outra carreira, porque para ator não servia.
Melhores filmes
Loucuras de Verão (American Graffiti), de George Lucas, 1972. O papel ainda é pequeno, mas o filme é muito bom. As loucuras de jovens norte-americanos, numa noite de verão, às vésperas de embarcar para o Vietnã, onde alguns morrerão.
Star Wars/Guerra nas Estrelas, de George Lucas, 1977. O primeiro Han Solo a gente não esquece.