Daniel Silveira
Houve um tempo na televisão brasileira, nas décadas de 1980 e 90, em que a faixa de horário logo após a novela das 20h nas noites de terça-feira da Globo eram chamadas de Terça Nobre, que coube a muitos humorísticos do canal. Ontem, a emissora voltou a exibir mais uma série de comédia na conhecida faixa de horário: a segunda temporada de “Cine Holliúdy”, uma série em que a TV é a grande inimiga do mocinho Francisgleydisson, vivido por Edmilson Filho. A produção, derivada dos filmes de mesmo nome de Halder Gomes, mostra a luta de Francis e seu cinema contra o entretenimento gratuito da televisão.
“Acho que a gente pode esperar que, de novo, seja uma série para a gente gostar do Brasil novamente”, comenta o ator Matheus Nachtergaele. “Isso permanece muito forte e agora mais que nunca. A gente está homenageando o Brasil de um jeito brincante”, continua.
A série lança mão de paródias de filmes clássicos, como “Casablanca” e “Star Wars”. E faz isso, segundo Matheus, usando referências do que melhor já foi produzido no humor brasileiro televisivo. “Tem uma dependência de nossas comédias mais queridas, como ‘O Bem Amado’, ‘Os Trapalhões’, ‘Viva o Gordo’… Acho que é meio que um mexidão disso tudo”, diz o ator, que interpreta Olégário, agora ex-prefeito da fictícia Pitombas.
Na nova temporada, Olegário é apenas o marido da prefeita. Sim, a prefeitura da cidade mudou de mão e quem assumiu a cadeira foi a mulher dele, Socorro, personagem de Heloísa Périssé. “"Para o horror dele”, afirma Matheus. “O machismo dele é à flor da pele, ele tem que enganar Corrinha (apelido de Socorro) para conseguir agir por baixo dos panos, alguém que mora na mesma casa que ele, que ele ama. Ela que está no comando, tendo que lutar contra o machismo da época, do nordeste e do marido”, conta.
Muita coisa mudou e, além de enfrentar essa “inversão de papéis” em sua casa, Olegário vai ter que encarar as ideias inovadoras de sua filha feminista Francisca, interpretada por Luisa Arraes. “Socorro é prefeita, Marily (Leticia Colin) vai embora, chega a filha de Olegário, Lindoso (Carri Costa) e Belinha (Solange Teixeira) seguem na oposição, cada vez mais radicais"” descreve Heloísa, sobre os novos rumos de sua personagem.
É importante lembrar que a história da temporada se passa em 1974 e algumas ideias comuns aos nossos dias podem parecer modernas demais na cidade de Pitombas. Sem, no entanto, esquecer de nosso tempo, como faz questão de pontuar Patrícia Pedrosa, a diretora artística da série. “A gente tenta ser o mais fiel possível à época em que a série se passa. Mas, como qualquer conteúdo de época, há dois tempos que devem ser contemplados: o passado e o presente. Sempre haverá ajustes, impulsionados pelas evoluções do comportamento e do pensamento da sociedade, que precisam ser levados em conta”, declara.
Hiato
Entre a primeira temporada de “Cine Holliúdy”, exibida em 2019, e a segunda, foram três anos de hiato, provocado pela pandemia de covid-19, que atrasou a produção. “A gente já estava começando (a gravar) a segunda e tivemos que parar”, lembra Heloísa.
“Foi um baque para todo mundo em todos os sentidos, que causou na gente um desejo muito grande de realizar algo, de viver algo muito legal, muito bem feito, acho que Cine chega com essa força, de mostrar uma comédia diferenciada”, revela Heloísa. “Esperamos exatamente um ano para retomar, nosso plantio foi sofrido e eu espero que a colheita seja alegre”, complementa seu parceiro de cena.
“Cine Holliúdy” é baseada no filme homônimo de Halder Gomes, lançado em 2013, que ganhou uma sequência em 2018. A primeira temporada foi gravada em Areias, no interior de São Paulo. A ideia era recriar uma ambiência de cidade do interior do Ceará. Desta vez, no entanto, a série foi totalmente gravada nos Estúdios Globo, onde foi construída uma cidade cenográfica para as cenas de Pitombas.
Além da direção de Halder, a série conta com outros nomes vindos diretamente do Ceará, como os atores Edmilson Filho (Fransis), Carri Costa (Lindoso), Solange Teixeira (Belinha) e Haroldo Guimarães (Munízio), se tornando uma pequena amostra dos talentos vindos da região Nordeste, da criação à atuação. “Eu acho que existe um clamor por um cinema autóctone de cada região, a origem da série é o sucesso disso”, diz Matheus.
"Eu me achava engraçada até contracenar com o povo do Ceará, virou, mexeu e eu estou assistindo a eles" Heloísa Périssé, atriz
“Acho que em Cine acontece uma conjunção de vários talentos, desde os criadores, a direção, a produção, que rege uma direção de arte, figurinos, maquiagem, são notas bastantes harmônicas juntas, que gera uma energia”, comenta Heloísa. “Eu me achava engraçada até contracenar com o povo do Ceará, virou, mexeu e eu estou assistindo a eles”, continua ela, deixando claro que a diversão que se vê na tela é muito verdadeira.
A sensação é compartilhada por Patrícia. “Me enche de prazer dividir os dias com profissionais extremamente dedicados, com um elenco que agrega, que cria junto, que briga por uma boa ideia até o fim”, conta.”"A alegria impressa na tela é o reflexo do que vivemos dentro e fora do set, Cine Holliúdy é mesmo um tesouro”, afirma.
A série é escrita por Adriana Falcão, Juca Filho, Chico Soares e César Amorim. Ricardo Spencer também assina a direção ao lado de Halder. A produção é de Erika da Matta e a direção de gênero é de José Luiz Villamarim. A produção de 11 episódios, exibidos às terças, conta ainda com Frank Menezes, Caca Carvalho, Falcão Maia, Gustavo Falcão e Flávio Bauraqui no elenco, e participações especiais de Luiza Tomé, Gero Camilo, Lucas Veloso, Nanda Costa, Eduardo Sterblitch e Stepan Nercessian.