Angra dá pinta nesta quinta-feira, 12, no Bolshoi, a partir das 20h, com disco árido, em que canta o sertão nordestino, a infância roubada pela falta de água e a luta pela sobrevivência.
Volta-se aos temas brasileiros. Tem sido a grande descoberta da banda. Aliás, é a grande descoberta do Angra e do Sepultura — grupo mineiro de thrash metal que chegou ao estrelato driblando a política das gravadoras brasileiras entre os anos 1980 e 1990.
A turma era radical: heavy metal e black metal instrumentalizando ideias pesadas. O guitarrista Andreas Kisser esteve no Rock in Rio naquele sábado, 19 de janeiro de 1985, vendo Scorpions, AC/DC e Ozzy Osbourne. Ao jornalista Ricardo Alexandre, no livro “Dias de Luta”, afirma que a falta de shows e festivais gerou certa exclusão da cultura metaleira.
Lá fora, compara Kisser, Black Sabbath criou seu público em convivência com outros grupos de rock. “Só fomos aprender que essa separação não existia quando começamos a viajar, a tocar com Peter Gabriel ou Sting, especialmente em festivais europeus”, relata o músico.
O metal brasileiro é fortíssimo no exterior desde os anos 1980. Nem por isso deixa de impressionar: Sepultura duas posições à frente do New Order na tradicional parada da revista britânica “New Music Express”, considerada bíblia do rock moderno, em 1987? Pois é, jamais o movimento BRock conseguiu algo sequer parecido com esse feito.
Assim como o Sepultura, celebridade em certos ambientes, o Angra explodiu a ponto de os músicos darem nomes falsos em hotel japonês para despistar fãs nos anos 1990. Seus ingressos para entrevistas costumavam ser disputados e, não raro, eram sorteados.
Ganharam disco de ouro no país oriental, venderam cem mil cópias do álbum “Angels Cry” (1993) e cem mil de “Holy Land” (1996). Os números se repetem, talvez oscilando para cima ou para baixo, no mercado europeu. Já no Brasil, onde a banda ainda não tinha a mesma popularidade vista no Japão e na Europa, acumulava “pífias” 55 mil cópias até 1996.
De lá pra cá, o Angra lançou outros sete discos e excursionou mundo afora. Mas acabou sendo nocauteado pelo destino em 8 de junho de 2019, quando o cantor André Matos morreu. Ele tinha 47 anos e, conforme a família, o artista sofreu uma parada cardíaca.
Desde os anos 2000, o músico estava fora da banda. O sonho de reunir a formação original também se foi junto. Esse momento de dor acabou abordado pelo guitarrista Rafael Bittencourt, fundador do Angra e remanescente da formação original, em texto enviado à imprensa na ocasião em que o disco “Cycles of Pain” chegou ao streaming, no ano passado.
Segundo Bittencourt, os últimos cinco anos provocaram dor, desafios, frustrações, glórias e sucessos “em montanha-russa de emoções que se tornou um caldeirão de temas e inspirações”. O músico lidou, em pouco tempo, com as mortes do pai e do parceiro André Mattos, vocalista e instrumentista com quem criara o Angra no início dos anos 1990.
Experiência da dor
“Cycles of Pain”, afirma Bittencourt, exibe densidade e experiência da dor. E exibe também a voz pernambucana do cantor Lenine na faixa “Vida Seca”, a mais distinta do disco, com letra bilíngue que versa a respeito das crises hídrica e humanitária do Nordeste. Essa aparição inusitada cria o momento mais singular do disco, destoante totalmente das outras 11 faixas.
Além de tudo, o álbum fortalece a terceira geração do Angra, iniciada na década passada com o ingresso do vocalista Fabio Lione. O baterista Marcelo Barbosa entrou no grupo em 2015. A formação se viu consolidada pelas linhas do baixista Felipe Andreoli, aquele que, depois de Rafael Bittencourt, está há mais tempo: desde 2001, digamos, é metaleiro full time.
Sob a produção de Dennis Ward, “Cycles of Pain” veio ao mundo de parto heavy metal em estúdios de três cidades brasileiras. Bittencourt escrevinhou o repertório em parceria com Andreoli. À procura de novas paisagens criativas, o Angra peregrinou pelo Brasil.
De Nova Lima (MG), onde as gravações começaram no Monastério Studio, seguiram viagem para Elephant Office Studio, em Florianópolis (SC). “Cycles of Pain” foi finalizado no Greenhouse Studios. Se o disco apresenta jornada de dor e autoconhecimento, a sonoridade atinge seu auge no thrash metal Ride Into The Storm”, progressivo gótico Dead Man On Display, power metal “Generation Warriors e de heavy metal Gods Of The Word”.
Para o show no Bolshoi, o resistente e atualizado Angra celebrará as duas décadas do disco “Temple of Shadows”. A banda promete reviver a intensidade musical desse período que a inseriu no circuito internacional. E, claro, os músicos estão felizes com o lançamento de CD e DVD ao vivo acústico, no qual demonstram versatilidade e evolução artística. Os ingressos estão disponível no Sympla a partir de R$ 180. Já é o terceiro lote.
ANGRA NO BOLSHOI
Quinta, 12, às 20h
Bolshoi Pub
A partir de R$ 180
Sympla