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Brian Jones chutou pro alto caretice da classe média britânica no pós-guerra

Stones morria há 55 anos, aos 27. Até hoje, episódio é envolto em mistério. Sem ele, talvez rock não fosse como conhecemos

Brian Jones, fundador dos Stones: músico escolheu nome da banda Brian Jones, fundador dos Stones: músico escolheu nome da banda

Só mesmo Brian Jones, o brilhante guitarrista inglês falecido há 55 anos, aos 27, para chutar pro alto a caretice da classe média no marasmo pós-guerra. É anátema junkie-roqueiro, o Brian. Daí você se dá conta de que sem esse cara não existiria Rolling Stones. Thanks, man!

Antes de existirem astros do rock como iríamos conhecê-los – movidos pela música, em primeiríssimo lugar, e sedentos por substâncias aditivas ou etílicas –, Brian já existia. Aos 20, era pai de três crianças com diferentes mulheres. Com todas elas, veja só, houve o mesmo desfecho grosseiro: nem casava-se com a mãe nem assumia as responsabilidades paternas.

Nascido em 28 de fevereiro de 1942, Brian se formou na escola com notas altas. Poderia ter entrado em qualquer universidade, porém achou melhor perambular de escritório em escritório. Equilibrando-se entre a incerteza do subemprego e a energia da banda Ramrods (era saxofonista), conheceu Alexis Korner, que o ajudou a se livrar da última mãe grávida.

Autodidata e virtuoso, aprendeu em poucos dias a tocar guitarra no estilo slide – com tamanho esmero que passara a ser considerado um dos melhores em Londres, no início dos anos 60. Logo depois, foi convocado por Korner para tocar nas bandas Blues Incorporated e Ealing Club. Fazia a temperatura dos pubs atingir níveis inconcebíveis dedilhando alucinadamente licks de blues, como se estivesse ele próprio plugado no amplificador.

Conforme o biógrafo Philip Norman, Brian era só um pouco mais velho que Mick e Keith Richards, mas parecia ser mais “maduro e sofisticado” quando conversaram sobre Elmore James. De imediato, ligou-se a Keith, que também tocava guitarra. “Mas Mick também ficou impressionado com sua voz macia e boa dicção”, escreve Norman, em “Mick Jagger”.

Não havia um rodízio oficial para usar as duas camas e os poucos colchões. Mas isso não tinha muita importância, pois em geral nós três acordávamos no chão, onde a gente tinha radiograma enorme, que Brian trouxera com ele, um aparelho fantástico, dos anos 50 Keith Richards, guitarrista

“Mick também se impressionou com suas roupas e o cabelo, seu conhecimento de música em todo o espectro do pop e do jazz, sua surpreendente articulação, seus conhecimentos literários e perverso senso de humor e, acima de tudo, sua determinação em não permitir que sua caótica vida particular o impedisse de se tornar uma estrela”, afirma o biógrafo.

Se Keith e Mick eram a mente e o corpo dos Stones, Brian Jones era a alma. Preenchia os espaços nas músicas com qualquer instrumento que lhe chegasse às mãos, caso da cítara – ouvida na vitoriana “Lady Jane”, gravada no elepê “Aftermath”, de 66, e no hit-macabro-fodão “Paint It Black”, publicado na edição americana do mesmo disco.

Até “Aftermath”, melhor álbum da banda na primeira fase, os Stones atravessaram tempestades. Keith afirma que passaram o primeiro ano migrando de um lugar a outro, “afanando comida e ensaiando”. “Estávamos pagando para ser os Stones”, rememora, na autobiografia “Vida”. A precariedade ainda se estendia ao apartamento em que ele, Mick e Brian moravam à época. Era – no mínimo – asqueroso, dadas as condições do lugar.


		Brian Jones chutou pro alto caretice da classe média britânica no pós-guerra
Brian Jones no "Rock and Roll Circus", em1968: não haveria Stones sem ele. Marcus Vinícius Beck


“Mudamos para lá no verão de 1962 e ficamos por um ano, aturando o inverno mais frio desde 1740, e as moedinhas que usávamos para ligar o aquecedor, ter eletricidade e gás não eram fáceis de arrumar. Tínhamos colchões e zero mobília, só um tapete velho. Não havia um rodízio oficial para usar as duas camas e os poucos colchões. Mas isso não tinha muita importância, pois em geral nós três acordávamos no chão, onde a gente tinha radiograma enorme, que Brian trouxera com ele, um aparelho fantástico, dos anos 50”, lembra Keith.

Não haveria Stones sem Brian. Conforme livros e documentários, o guitarrista divulgou anúncio em que convidava músicos para tocar no pub Bricklayer's Arm. A ideia dele era formar uma banda de blues. Mick viu o comunicado, respondeu-o e, ao dizer que apareceria por lá, decidiu levar Keith. A partir daí, tornaram-se conhecidos na noite londrina.

Em estúdio, os Stones estrearam em 1964, quando lançaram o disco “The Rolling Stones”. Contudo, já tinham emplacado nas paradas britânicas os hits “Come On”, composição de Chuck Berry, e “I Wanna Be Your Man”, esta assinada, como sabemos, por Lennon e McCartney. Há certa vulgaridade sedutora capaz de provocar terremoto no pop da época, o que é materializado em canções como “Stupid Girl” e “Under My Thumb”, de “Aftermath”.

“Ele formou os Rolling Stones. Escolheu todos os integrantes, fez com que o shows acontecessem” Barbara Marion, filha de Brian Jones

Como Mick e Keith se descobriram parceiros (“Satisfaction” foi o primeiro hit deles), Brian começou a acreditar que estava sendo preterido na banda. Pior: banda da qual era o fundador. Ademais, discordava do material produzido ali. “Muito pop”, reprovava, decepcionado. O clima fechou ainda mais com a entrada do empresário-fanfarrão Andrew Loog Oldham, que conseguiu – goste-se ou não dele – formatar os Stones para a eternidade.

Declínio

De forma modesta, ouve-se Brian Jones nos discos “Between the Buttons” (1967), “Their Satanic Majesties Request” (1967), “Beggars Banquet” (1968) e “Let It Bleed” (1969). Brian viajava sozinho para os shows. Só encontrava os colegas em gravações. Ou durante ensaios. Distanciando-se cada vez mais do grupo, não participava das tomadas de decisões.

Para agravar a situação, a atriz e modelo Anita Pallenberg, então namorada de Brian, terminou relacionamento com o violento músico (sim, ele a agredia) para ficar com Keith, em uma viagem que os três fizeram ao Marrocos, em 1967. O guitarrista, além de tudo, andava se drogando bastante. Quando tomava LSD, ficava paranoico e, doidão, perdia o controle.

Embora tocasse qualquer instrumento, Keith acha que Brian Jones não conseguia se unir à banda. “Como ele está morto, posso dizer: 'Oh, Brian era um músico fantástico', mas não era verdade. Brian não era um grande músico. Ele tinha uma certa sensibilidade para certas coisas, mas todos na banda também têm isso para certas coisas. E houve uma boa química ali por um tempo que infelizmente não ficou”, disse, após a morte do instrumentista.

Expulso dos Stones, Brian morreu no dia 3 de julho de 1969. Até hoje, as circunstâncias em que se afogou são misteriosas. Dias depois, a antiga banda o homenageou num concerto histórico no Hyde Park, em Londres. Mick recitou para 250 mil pessoas versos do poeta P. B. Shelley: “Paz, paz!/ Ele não está morto, ele não dorme”. Foi muito emocionante.

Para a filha de Brian Jones, Barbara Marion, o pai evitou que Mick “fosse contador em algum lugar”. “Ele formou os Stones. Escolheu todos os integrantes, fez com que o shows acontecessem”, afirmou, em 2019, à "Sky News". Barbara acredita que Brian foi assassinado.

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