Cererê se torna galeria a céu aberto com grafites
Marcus Vinícius Beck
Publicado em 21 de janeiro de 2024 às 22:21 | Atualizado há 1 ano
O Martim Cererê, point tradicional para a cena alternativa goianiense localizado no Setor Sul, acaba de ganhar cores e formas que o tornam uma galeria a céu aberto. Ao todo, a Secretaria de Estado da Cultura (Secult) informa que 12 artistas locais têm trabalhos expostos no Cererê, dando cara nova aos muros, bar e outros ambientes do espaço.
Por meio de comunicado à imprensa, a pasta afirma que as intervenções artísticas somam 40 metros quadrados. De acordo com a Secult, a ideia é que as bilheterias e as cúpulas dos teatros recebam em breve obras de arte. O Cererê se junta a outros espaços da Capital goiana conhecidos pela permanente exposição de arte urbana, como o Beco da Codorna, situado no Centro – um rolê por lá é suficiente para notar obras espalhadas por todo lado.
No Cererê, um dos artistas com trabalhos expostos é Danilo Itty, autor de painel que possui pelo menos oito metros de comprimento. Ele revela que sua criação representa as vivências que teve no centro cultural ao longo da vida. “Além disso, busquei unir música e arte representando meu estilo”, conta Danilo, sobre a obra grafitada em apenas dois dias.
Além dele, o espaço tem murais assinados pelos artistas Plant (Karlla Janaína), Anametista (Ana Paula Ferreira), Buias (João Victor Santos), Leoua (Thaís Silva), Tisha (Letícia de Sá), Mury (Jéssica Muriel), Vant (Victor Leonardo Carvalho), Ferds (Fernando Ribeiro), Kabelin (Eleandro Guilherme) e Naik (Thiago Fernando Pereira). A inspiração para as obras que cobrem mais de 40 metros quadrados é o hip-hop, surgido nos EUA, na década de 70.
Hip-hop
Surgida há 50 anos, essa expressão artística tem o grafite como um de seus pilares (junto com o break e o DJ) e vê o spray como importante ferramenta antirracista. Olhemos só para o precursor do grafite: Jean Michel Basquiat não tinha galeria, de modo que o metrô, as paredes ao lado da Soho e a própria Manhattan eram suas galerias, no seio de Nova Iorque. Basquiat ajudou a popularizar a arte de rua e também foi catalisador do hip-hop.
Nascido em dezembro de 1960, no Brooklyn, em Nova Iorque, Basquiat acreditava que a arte não deveria ser restrita a espaços destinados aos privilegiados. Para ele, a manifestação artística deveria ser percebida em todos os lados, sobretudo nas ruas: era a cidade como um organismo em constante transformação. Como um rockstar, desnudou os preconceitos sociais e ousou criar uma arte democrática: queria algo que fosse direcionado para todos.
Do dia para noite, transformou-se em amigo de Andy Warhol e colecionou namoradas, dentre as quais uma jovem Madonna. Mas foi tudo muito rápido: Basquiat sofreu overdose de speedball, um perigoso coquetel de cocaína e heroína, aos 27 anos. Hoje em dia, ninguém ousa dizer que ele não é um mestre do pincel. Um mestre que virou, com o passar das décadas, um ídolo pop – chegou até a formar uma banda com o ator Vincent Gallo.
Tendo como referência as ideias do artista norte-americano, o Martim Cererê recebeu ilustrações de Paulo Paiva, com colaboração de Benjamin Garcia, outro nome emergente no cenário local. Paulo lembra que lá são realizadas apresentações culturais, como lançamentos de livros, declamações de poemas e discotecagem, entre outras atividades. “A ideia do painel surgiu da necessidade de resgatar as nossas raízes, trazendo elementos caipiras para um lugar que respira a nossa cultura e abre espaço para a música alternativa goiana”, detalha.
Diversidade cultural
Segundo a secretária Yara Nunes, titular da Secult, unir a diversidade cultural própria do Martim Cererê com murais em grafite é uma forma de evidenciar a força da arte goiana. “O Centro Cultural Martim Cererê recebe shows, peças teatrais e feiras diversas, então estamos sempre abertos às possibilidades que a arte e os nossos fazedores de arte apresentam”, afirma Yara. A pasta diz que os murais ficarão expostos por tempo indeterminado.
Tradicional nas ruas de Goiânia, o gratifi remonta a uma tragédia: o acidente com o Césio 137, nos anos 1980. Foi nesse contexto, em que os goianienses passaram a ser vistos com apreensão pelo resto do Brasil, que o galerista PX Silveira colocou em pé o projeto Galeria Aberta, que começou em 1987 e seguiu até 1989. “Telas foram reproduzidas em grandes proporções nas paredes de edifícios no Setor Central, região mais atingida pela radiação”, diz a pesquisadora Jordana Falcão Tavares, em estudo disponível no repositório da UFG.
Como chegar ao Cererê
Tv. Bezerra de Menezes – St. Sul
Segunda a sexta
Das 7h30 às 21h