O artista visual Dalton Paula, 42, tem conquistado cada vez mais reconhecimento. Dessa vez, ele está com seu trabalho exposto na Bienal de Veneza, badalado evento que movimenta o circuito mundial das artes plásticas, na Itália. A 60ª Exposição Internacional de Arte – La Biennale di Venezia, curada por Adriano Pedrosa, se inicia neste sábado, 20, e se estende até 24 de novembro de 2024, nos espaços Arsenale e Giardini, na cidade das águas.
Dalton, que é representado pela Cerrado Galeria, situada no Setor Sul, recebe um jantar com a finalidade de homenageá-lo. A solenidade ocorre no Chiostro dell’Abbazia della Misericordia, antigo edifício religioso que, há anos, passou a ser utilizado para acolher artistas da bienal. O evento, realizado em parceria com James Fuentes, Galeria Jaqueline Martins e Sé Galeria, ainda condecora Jota Mombaça e Manauara Clandestina.
A Bienal destaca, neste ano, pessoas que são, vamos dizer assim, outsiders no universo da arte. Dessa vez, a curadoria é liderada por um brasileiro, o diretor do Museu de Arte de São Paulo (Masp), Adriano Pedrosa. Ele, aliás, faz história por ser o primeiro curador latino-americano a comandar da exposição. O evento tem como foco a produção de artistas de diversas origens, gerando visibilidade a grupos que antes eram marginalizados.
Dalton se destaca com pinturas que promovem a visibilidade de personalidades negras até então não representadas pela história visual. Para a 60ª edição da Bienal, o artista expõe as obras “Chico Rei”, “Nã Agotimé”, “Pacífico Licutan”, “Tereza de Benguela” e “Ganga Zumba”, personagens já retratados anteriormente pelo artista entre os anos de 2020 e 2022, que retornam em pinturas de grandes formatos com os personagens em corpo inteiro.
Brasiliense radicado em Goiânia, onde está à frente do ateliê e escola de artes Sertão Negro, Dalton ultrapassou as fronteiras brasileiras. Ele está com obras em coleções importantes, como as do Museum of Modern Art (MoMA) de Nova York, da Pinacoteca de São Paulo e do Masp. Decolonial e antirracista, as obras criadas por ele recebem elogios lá fora.
Com o Sertão Negro, o artista se saiu premiado com o Soros Arts Fellowship, que é concedido pela Open Society Foundation. O ateliê fica na região Norte de Goiânia, num bosque. Moldado pela natureza, de imediato, olha-se os viveiros de plantas. Poucos passos à frente já se entra no quintal, onde é possível ver um espaço pequeno aberto: é ali que rolam os almoços e lanches coletivos. Até chegar ao ateliê propriamente dito, há muitas árvores.
Foi nesse espaço que Dalton criou parte considerável dos quadros expostos no Masp, em São Paulo, no ano de 2022. “Retratos Brasileiros” teve 30 pinturas, técnica que conta com vasta tradição nas artes ocidentais, ou seja, vinculada às elites. Ele retratou artistas ou intelectuais negros, caso de Machado de Assis ou Lima Barreto, cuja tela ilustrou o livro “Triste visionário”, da imortal da Academia Brasileira de Letras (ABL) Lilia Schwarcz.
Segundo o artista, num texto publicado no site do Masp, as imagens foram construídas pela ficção. Se num primeiro instante o que lhe guiava era a necessidade em dar rosto aos personagens, na sequência, Paulo quis encontrar inspiração nos rostos de “pessoas quilombolas, mais velhas, benzedeiros, raizeiras, lideranças, jovens, mestres griôs, como se estivesse tentando alcançar uma raiz mais profunda”. Foi reverenciado pela crítica.
Dalton parte, em suas criações artísticas, por uma leitura emancipatória da sociedade brasileira. Como um antropólogo, compreende a relevância de diferentes povos para a formação da identidade nacional, a exemplo dos terreiros, quilombos, subúrbios e festejos tradicionais. Isso tudo descamba para o quilombo-escola do artista, no qual há ações artístico-educativas para fortalecer o senso comunitário – num espaço de emancipação.
Nas obras expostas no Masp, que podem ser consultadas no site do museu ou visitadas no acervo de lá, os cabelos eram pintados com folhas de ouro. Pensando na tradição ocidental da pintura, é uma sinalização para se distinguir os santos daqueles que são meramente mortais. Hoje, para se ter ideia, cada retrato dele não sai por menos de 20 mil dólares.
Em Goiânia, o artista é representado pela Cerrado Galeria e, recentemente, foi agraciado com o prêmio Chanel para as artes. “Ganhá-lo é uma validação do meu trabalho”, diz o artista, que trabalhava 12 anos como bombeiro e, nas horas vagas, dedicava-se a estudar arte.