Cultura

É ato de misericórdia a eutanásia animal?

Redação

Publicado em 1 de julho de 2015 às 02:27 | Atualizado há 10 anos

“Quando te encontres diante de alguém que a morte parece nimbar de sombra, recorda que a vida prossegue, além da grande renovação. Não de creias autorizado a desferir o golpe supremo naqueles que a agonia emudece, a pretexto de consolação e de amor, porque, muita vezes, por trás dos olhos baços e das mãos desfalecentes, que parecem deitar o último adeus, apenas repontam avisos e advertências para que o erro seja sustado ou para que a senda se reajuste amanhã. Lembra-te de que, valorizando a existência na Terra, o próprio Cristo arrancou Lázaro às trevas do sepulcro, para que o amigo dileto conseguisse dispor de mais tempo para completar o tempo necessário à própria sublimação”.

Este ensinamento é de Emmanuel e Francisco Cândido Xavier, no livro de ambos Religião dos Espíritos.

Mas será lícito matar um animal para lhe abreviar o sofrimento? “Morte sem sofrimento, prática pela qual se procura abreviar sem dor ou sofrimento a vida de um doente reconhecidamente incurável”, segundo o dicionário, a eutanásia é um tema polêmico mesmo quando aplicada em irmãos inferiores do homem.

Geraldo Lemos Neto, no site da Editora Vinha de Luz, de Belo Horizonte, por ele fundada, destacou em maio último interessante entrevista, em perguntas e repostas de Richard Simonetti, um dos principais autores espíritas da atualidade, sobre eutanásia em animal. Ao gentil leitor, oferecemos, a seguir, um condensado de suas palavras.

A razão rejeita a eutanásia

Um animal de estimação, um cão por exemplo, em avançada idade e enfrentando limitações e dores, deve ser morto?

– Devemos tratá-lo como o faríamos e um familiar muito querido: com carinho e atenção, melhorando sua condição de vida e amenizando seus padecimentos.

Não seria mais razoável praticar a eutanásia?

– Se a razão rejeita a eutanásia, em se tratando de familiares queridos em idêntica situação, por que fazê-lo com os animais? A principal objeção à eutanásia humana é o fato de que ela coloca a morte a serviço do homem, não de Deus.

Doenças e dores que afetam os seres humanos envolvem dívidas cármicas, o que não ocorre com os animais. Por que deixá-los sofrer se nada devem?

– Nem sempre a dor é problema cármico. A mulher que dá a luz não está cumprindo um carma. As dores do parto abrem as portas para a sublime experiência da maternidade. A velhice, com suas limitações e dores, longe de representar um carma, prepara o espírito para o retorno ao Além, ajudando-o a superar vícios e paixões que dificultam a readaptação à vida espiritual depois da reencarnação.

E quanto ao animal?

– As dores, que venha a enfrentar, agitam sua consciência embrionária, agilizando o trânsito da animalidade instintiva para o exercício da razão, favorecendo sua promoção a ser pensante, o espírito. Todos viemos de lá e certamente fomos trabalhados pelas dores do mundo, ao longo de múltiplas reencarnações.

Quando o cão é portador de leishmaniose, as autoridades sanitárias impõem a eutanásia, por medidas preventivas, evitando que outros animais ou seres humanos sejam contaminados por esse terrível mal. Não é medida razoável e justa?

– E quando o mal atinge um ser humano? Impõe-se a eutanásia? Obviamente, não. O paciente será isolado e tratado, objetivando-se a recuperação. O mesmo poderia ser feito com os animais contaminados. Ocorre que as autoridades agem de forma simplista. É mais fácil e barato eliminá-los do que isolá-los e tratá-los. Afinal – considera-se equivocadamente –, são apenas animais.

 

A Natureza deve seguir seu curso

Praticar a eutanásia animal não seria um ato de misericórdia, como recomendou Jesus, lembrando o profeta Oseias: “Misericórdia quero, não sacrifício” (Mateus, 9: 13)?

– É preciso cuidado com a interpretação dos textos evangélicos. A aplicação correta desse princípio tem sentido inverso. Praticar a misericórdia com os animais seria amenizar suas dores, não os sacrificar.

André Luís diz que alguém que desencarna submetido à eutanásia pode ter problemas de readaptação à vida espiritual. O mesmo acontece com os animais?

– Não sei se teriam problemas de readaptação, já que seu trânsito pela espiritualidade é breve, logo reencarnando, conforme está na questão 600 de O Livro dos Espíritos: “A consciência de si mesmo é o que constitui o principal atributo do espírito. O do animal, depois da morte, é classificado pelos espíritos superiores a quem incumbe essa tarefa e utilizado quase imediatamente. Não lhe é dado tempo de entrar em relação com outras criaturas”. Assim, com a eutanásia, perdem a oportunidade de agilizar seu desenvolvimento com a dor-evolução.

Fala-se hoje em ortotanásia (morte correta, no seu processo natural). Seria aplicável aos animais?

– Perfeitamente. Seria o comportamento ideal diante de um animal de estimação, em fase terminal. Cuidar bem dele, evitando que sofra, mediante a aplicação de medicamentos específicos, mas não fazer nada para lhe prolongar a existência. Oportuno deixar a Natureza seguir seu curso, sob a égide de Deus.

(Jávier Godinho, jornalista)

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