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Ex-mulher de Raul Seixas abre o jogo sobre vida íntima com artista baiano

Conhecido pela verve debochada, cantor e compositor foi nome essencial para a evolução do rock cantado em língua portuguesa

Paixão tórrida: Raul Seixas beija Tania Barreto em algum dia dos anos 70 - Fotos Arquivo Pessoal Paixão tórrida: Raul Seixas beija Tania Barreto em algum dia dos anos 70 - Fotos Arquivo Pessoal

No banco traseiro, Tania Menna Barreto arqueia a sobrancelha. O som do táxi lhe mostra música feita por um tipo novo na cena: Raul Seixas. Meio Bob Dylan, esse cara. Talvez um pouco Elvis Presley. Jorra nos ouvidos de Tania e do chofer ironia, sarcasmo e deboche.

Tania, conectada à música, se excita. Sente o tesão lhe subindo pela espinha. “Macaco, praia, carro, jornal, tobogã/ eu acho tudo isso um saco”, vocaliza Raul, enquanto a fã de 25 anos se locomove, feliz, pelo Rio de Janeiro. “É você olhar no espelho/ se sentir um grandessíssimo idiota/ saber que é humano, ridículo, limitado/ que só usa 10% de sua cabeça animal.”

Assim abre o livro “Pagando Brabo: Raul Seixas na Minha Vida de Amor e Loucuras” (Ibis Libris Editora). Com texto descomplicado, Tania revela como era se relacionar com o roqueiro baiano, que considera o grande amor de sua vida. Fala também da primeira vez que ficaram juntos. “Entre 1976 e 1979, tivemos um relacionamento de fato”, lembra.

Em seguida, já separados, encontravam-se de forma ocasional. “Raul teve cinco companheiras e, todas elas, sem exceção, ele abandonou, mesmo de forma disfarçada. Dois anos era, mais ou menos, o limite para que se criasse uma situação insuportável para quem convivia com ele”, diz a ex-mulher, que ultrapassou o limite estipulado pelo tempo.

Conforme Tania, a companheira prestes a ser abandonada jogava a toalha. Raul podia também sair da relação. Era, digamos, um iconoclasta. Tal característica se manifesta em suas composições, de visão existencial às vezes mística e noutras circunstâncias irônicas. Não rolava ter aquela velha opinião formada sobre tudo. Rolava metamorfosear-se.

Logo no início da nossa relação, Raul me deu o disco ‘Krig-há, Bandolo!’ Talvez seja o disco dele que eu mais gosto Tania Barreto, escritora

Em matéria conjugal, casou-se cinco vezes. Três ex-parceiras são mães de suas filhas Simone, Scarlet e Vivian. Com Tania, todavia, a ligação se estendeu à música, pois compuseram juntos a canção “Pagando Brabo”, gravada no disco “Mata Virgem”, de 1978. “Eu quero é ver você sorrir/ às quatro e meia da manhã/ com a cara linda de dormir/ se espreguiçando no divã/ olhando pra mim”, canta Raul, cuja voz é costurada por rabiscos sutis de guitarra.

Na obra, Tania narra suas aventuras londrinas no auge da contracultura. Mudou-se para a capital da Inglaterra no início dos anos 70, mas tomou um susto quando a viu do avião. Perguntou, então, a um inglês se o céu era sempre cinza. “Quase sempre”, respondeu-lhe. Foi o suficiente para arrepender-se de ter saído do Rio no impulso da porra-louquice juvenil.

Só que Londres era a cidade dos Stones. Andou por Portobello Road, rua de três quilômetros que vai até Notting Hill. Tania a define como “lugar de classe média”. Na música popular brasileira, a região é citada por Caetano em “Nine Out of Ten”, do disco “Transa”, publicado em 1972, e também por Gil em “Back in Bahia”, de “Expresso” 2222, lançado em 72.


		Ex-mulher de Raul Seixas abre o jogo sobre vida íntima com artista baiano
Raul e Tania: casal ficou junto entre 1976 e 1979. Marcus Vinícius Beck

Tania afirma que teve uma viagem transformadora no Hyde Park. “Vi vários duendes tomando chá, trabalhando, fazendo coisas. Olhei em volta e todos, incluindo os patos e cachorros, estavam juntos, aos pares. Comecei a escutar ‘All You Need Is Love’, dos Beatles, que encheu todo o parque. Foi belíssimo! Dias depois, voltei para ver os duendes de novo.”

“Também existia um lugar que frequentávamos bastante chamado Roundhouse, que antes servira a muitos propósitos. Foi construído como estaleiro, foi uma destiladora de gin e depósito. Começou a funcionar como um centro cultural em 1964, chamado Centre 42 e lá tocou Jimi Hendrix, The Who, Sex Pistols, The Doors, Pink Floyd e Led Zeppelin”, diz Tania.

Lá, prossegue, viu “grandes bandas de rock” e teve “muita loucura”. Logo depois, passou uma temporada na Alemanha, já que havia sido convidada pelo governo do Reino Unido a se retirar do país. Um amigo, que morava na terra de Goethe, foi lhe visitar em Londres.

“Eu estava enorme de gorda, com os cabelos vermelhos, pintados de henna, cheios, muito branca e muito louca” Tania Barreto, escritora

Como precisava sair da capital inglesa, acompanhou-o até Düsseldorf, no oeste germânico. Tania se viu, ali, em apuros. Sem falar inglês e muito menos alemão, estava sem dinheiro e amigos. Tomou um LSD e, durante a experiência psicodélica, sentiu-se dentro de um cano. “Eu só sabia que teria que sair daquele cano de alguma maneira”, relata Tania.

Raul

De volta ao Brasil, a família se surpreendeu com sua aparência. “Eu estava enorme de gorda, com os cabelos vermelhos, pintados de henna, cheios, muito branca e muito louca”, escreve. Filha de pai burguês, credita à boa educação a que teve acesso (mundo das artes, atividade física e disciplina) o fato de não ter sucumbido ao peso do lema sexo, drogas e rock’n’roll.

“Logo no início da nossa relação, Raul me deu o disco ‘Krig-há, Bandolo!’ Talvez seja o disco dele que eu mais gosto. Foi por aí que comecei a conhecer a musicalidade e os pensamentos de Raul, mas, até hoje, ele me surpreende”, revive Tania, apaixonada, em “Pagando Brado”.

Raul entrou em sua vida após jornada hippie pela Europa. Paixão tórrida, entendiam-se — e muito bem — falando a linguagem do sexo. Assistiram duas vezes ao filme “Dona Flor e Seus Dois Maridos”, baseado no livro do escritor Jorge Amado. De mãos dadas, sorridentes e em sintonia um com o outro, andavam pelos bares e restaurantes do Rio de Janeiro.

“Ele adorava ficar em hotéis, sempre nas suítes presidenciais ou reais. Chegava sem avisar e me levava. Ficávamos, por dias, tocando Beatles, Elvis, especialmente um gospel, ‘Working on the Building’, que, mais tarde, ele fez uma versão, sem título”, recorda-se Tania. “Pagando Brabo: Raul Seixas na Minha Vida de Amor e Loucuras” é uma boa leitura.

PAGANDO BRABO

Autora: Tania Barreto

Gênero: Memórias

Páginas: 280

Editora: Ibis Libris

Preço: R$ 65,00

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