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Fagner revisita meio século de carreira em turnê que passa por Goiânia

Artista acaba de lançar disco de inéditas após anos publicando regravações ou tributos

Fagner, cantor e compositor - Foto: Jorge Bispo/ Divulgação Fagner, cantor e compositor - Foto: Jorge Bispo/ Divulgação

Nas borbulhas de amor divididas entre esperança e razão, é hora e vez de assistirmos ao cearense Raimundo Fagner, 74, que fará show amanhã no Centro de Convenções da PUC. Veremos 50 anos de sons revisitados por esse artista controverso — na arte e fora dela.

Ninguém é alucinado para rebater importância à nossa música que tem esse cantor de voz áspera. Integrante da “turma do Ceará”, o artista situa-se no contexto estético-sonoro pós-tropicalista. Não só ele, sabemos, como seus bons amigos Belchior e Ednardo.

A sonoridade fagneriana revela pedaços de influências tão diferentes quanto curiosas: Luiz Gonzaga e Jovem Guarda. É, você pensa, essas são óbvias. Mas e os sambas sofridos e as fossas sentimentais? Ou, me diz, e a poesia do Patativa do Assaré e o rock’n’roll dos Beatles?

Sim, Fagner soa eclético. Foi porta-voz daquela geração agreste, mas logo se fez, diria o crítico Pedro Alexandre Sanchez, porta-voz de brigas intermináveis com tropicalistas. Em decibéis discordantes e textos jornalísticos questionáveis, bateu-boca com Caetano Veloso na imprensa durante os anos 70. Era luta total por um lugar à luz na evidência musical.

Aliás, Fagner nunca quis surfar na onda cool da bossa nova. Para ele, cantar é coisa emocionante. Dilacera corações machucados. Leva-os às lembranças dos beijos demorados, às memórias das carícias amorosas e aos lençóis suados após peripécias da espécie.

Há quem até ache plausível interpretar as coisas pelo seguinte viés: Fagner foi refém de seu temperamento irascível, no que, se você também pensa assim, tem lá alguma razão. Mas o artista, de canto expressionista, coloca-se na linha nobre da música brasileira, o que não lhe torna imune à crítica pelo romantismo desvairado nem evita repúdio pela suposta breguice.

Os primeiros contatos do artista com a música ocorrem no ambiente familiar. Depois, rapaz crescido, mudou-se a Brasília para estudar na Universidade de Brasília (UnB). Fagner, ora, é produto sonoro da vida universitária, mas também da boêmia fortalezense, dos festivais e da televisão. Foi aí que o cantor dera forma a lirismo marinado na madrugada apaixonada.

Em seguida, encorajaram-lhe a ir para o Sudeste. Desenvolve versos que se emolduram em melodias cativantes sintonizadas com anseios da população cearense. “Só deixo meu Cariri/ No último pau-de-arara/ Só deixo meu Cariri/ No último pau-de-arara”, vocaliza, costurado por acordes metálicos. Dessa forma, inicia-se o disco “Manera Fru Fru, Manera”, de 73.

Por vezes, Fagner aposta em tons psicodélicos, como na faixa “Nasci Para Chorar”. Aqui, ao fundo do compasso, escutamos guitarra sussurrando comentários sutis ao estilo Hendrix. Raimundo Fagner, claro, sabia o que se passava lá fora. Coisa de gente bem informada.


		Fagner revisita meio século de carreira em turnê que passa por Goiânia
Fagner: hits memoráveis - Foto: Jorge Bispo/ Divulgação. Marcus Vinícius Beck

Mantendo-se distante dos tropicalistas (crê que Caetano fizera disco nessa época por mera estética, já que muitos fracassaram em matéria comercial), teve parceria sacramentada com cânone da música popular brasileira, como Elis Regina, Nara Leão e Chico Buarque. Fagner — volto a citar Pedro Alexandre — (des)equilibrou-se entre extremos dramáticos.

O cantor queria juntar-se aos seus, isto é, gostaria de ver seus conterrâneos devidamente inseridos na indústria fonográfica. Quando produtor, diretor e autor dos nordestinos na Sony, acusaram-lhe de coronelismo, porém havia generosidade: reverenciava o Nordeste.

Experimentações

Em termos discográficos, o músico cearense radicalizou a porra toda com suas experimentações nordestinamente psicodélicas. Criou obras obras-primas, caso de “Ave Noturna”, lançada em 75, e “Orós”, de 77, parceria com Hermeto Pascoal. No mesmo ano, conquistou seguidores, ao passo que interpretações de Cartola (“As Rosas Não Falam”, de 78) e Paulinho da Viola (“Sinal Fechado”, dois anos antes) receberam críticas dos puritanos.

A partir de 78, todavia, Fagner deu um cavalo de pau em sua música, virando-se para composições comerciais — caso dos ótimos hits “Revelação”, de 78, “Noturno”, de 79, e “Eternas Ondas”, de 80. Mesmo que grudentas e vocacionadas à histeria radiofônica, exibiam altas e acachapantes doses de poesia enquadrada em arranjos de qualidade.

Se interpretara textos densos de Cecília Meireles (um deles lhe valeu processo por plágio) e Ferreira Gullar, cantou durante os anos 80 o amor. Fez com o disco “Romance no Deserto” trilha sonora ideal para quando estamos na fossa bebendo uísque vagabundo. “E é só assim que eu perdoo os teus deslizes/ E é assim o nosso jeito de viver/ Em outros braços tu resolves tuas crises/Em outras bocas não consigo te esquecer”, vocaliza, em “Deslizes”.

“Canteiros”, voltemos ao problema do plágio, registra dois versos adaptados de poema escrito pela autora, sem quaisquer créditos. O processo impediu elepê de ser reeditado. Por isso, não está no streaming. Controverso (como falo no início deste texto), o artista passou as décadas seguintes produzindo obras medianas, mas um hit matador: “Borbulhas de Amor”.

Agora, volta às inéditas com disco “Além Desse Futuro”, já disponível nas plataformas digitais. É certo que haverá no show dado pelo artista no teatro da PUC novas canções, além dos hits "Canteiros", "Fanatismo", "Revelação", "Quem Me Levará Sou Eu", "Mucuripe", "Asa Partida", "Espumas ao Vento", "Romance no Deserto", "Guerreiro Menino". Bom rolê.

FAGNER 50 ANOS

Amanhã, às 21h30

Centro de Convenções da PUC

Av. Engler, 507, Jardim Mariliza

A partir de R$ 110

Ingressosa.com/fagner-50-anos

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