Ira! pluga sucessos em show no Jardim América, em Goiânia
Marcus Vinícius Beck
Publicado em 18 de outubro de 2023 às 18:05 | Atualizado há 4 meses
A banda Ira! pluga clássicos da carreira para apresentar em praça pública de Goiânia, nesta quinta-feira, 19, quando os paulistas voltam à Capital menos de dois meses depois da última vez. Será um show especial por dois motivos plausíveis: o primeiro deles é que essa vai ser chance de assistir boas músicas em versão rock’n roll, numa energia lá nas alturas, e depois porque se comemora 90 anos da metrópole goiana. E o show, se você não sabe, sai na faixa.
São quatro décadas nos palcos, nos palcos e nos estúdios, pra falar a verdade. O grupo prestou relevantes serviços ao rock nacional. Bagunçou qualquer noção de ordem, vocalizou sentimentos da juventude sufocada pela censura ditatorial e tocou acordes aos que ansiavam em segurar um instrumento. Nem sempre a música é destinada aos virtuosos, essa é a verdade – fosse assim, por exemplo, não existiria Sex Pistols, Clash e Ramones, tríade lembrada, sem tanto esforço, como bandas para introduzir alguém ao universo punk.
As artérias do Ira! pulsam a partir dos arranjos construídos por Edgard Scandurra. Canhoto como Jimi Hendrix (seu ídolo é o deus do blues-rock), o músico exibe nos palcos brasileiros um estilo único: não inverte as cordas de sua Fender Stratocaster verde/branca, cria riffs capazes de grudar em nossos ouvidos e constrói solos que você deve lembrar de cabeça. Mas o forte dele é cimentar o chão da música, com power chords vigorosos e um timbre incapaz de passar despercebido, seja nas apresentações ao vivo ou na sagacidade do estúdio.
Figura essencial: Nasi é um dos responsáveis pelo Ira! ser o que é. Foto: Divulgação
Nasi também é o cara responsável pelo Ira! ser o que é. A própria existência dele no território do rock nacional desequilibra qualquer ideia pré-fabricada, como mais ou menos escreveu sobre ele o jornalista Julio Maria. É certo que sem esse sujeito reinaria o marasmo no império sacana da mesmice. Marcos Valadão Rodolfo nos fez um favor: meteu o pé na porta. Quando esbarrou com Scandurra no colégio, como num rápido plano-sequência dirigido por Truffaut, subiu a outro patamar, um patamar muito mais interessante.
No início, à base da vontade, apresentaram-se na PUC e, sem o ponto de exclamação, formaram o Ira. Gostavam dos mesmos sons, como a banda escocesa The Sensational Alex Harvey Band e as inglesas Who e Clash. Só queriam levar uma música, com sonhos modestos, sem grana no bolso e cheios de amor no coração (e revolta). “O Ira! criou uma história não só de grandes canções, mas de grandes performances ao vivo”, disse Nasi, quando esteve em Goiânia ao lado de Scandurra apresentando repertório folk de sua banda.
Carreira
Esse show ocorreu no estacionamento do Shopping Flamboyant, em agosto deste ano, num lugar barulhento. Nasi e Scandurra apresentaram arranjos para clássicos como “Dias de Luta” numa roupagem que fazia lembrar o som folk do cantor Cat Stevens e do supergrupo Crosby, Stills, Nash & Young. Agora, para o show em comemoração aos 90 anos de Goiânia, o rock quarentão da banda volta a ser eletrificado na maior voltagem possível – como os fãs goianienses, aliás, merecem ouvi-lo. Ora, é assim que gostaríamos de ver o grupo amanhã.
Assim tem sido desde 81, ano em que surgiram na metrópole paulistana. O que a banda faz, a partir de então, é falar sobre os “Dias de Luta”, dizer que “Envelhece na Cidade” e que o “Núcleo Base” do alistamento obrigatório é um pé no saco. De fato, o Ira! construiu discografia que possui discos importantes ao que chamamos de rock brasileiro, como “Psicoacústica” (1988), um remédio anti-monotonia. Neste álbum, os paulistanos apostaram em sons neo-psicodélicos. O organismo guitarra, baixo, bateria e voz foi bem, obrigado.
Pelo menos outros dois discos gravados pelo grupo precisam figurar dentre os melhores: “Mudança de Comportamento” (1985) e “Vivendo e Não Aprendendo” (1986). Pensando bem, vale incluir aí o elepê “Clandestino”, gestado durante o Plano Collor. As letras, aos olhos de hoje, se revelam crônicas em sintonia com as pautas mais urgentes das cidades. “O forte do disco são os arranjos enxutos alimentados pela cachoeira de ideias musicais que brota da guitarra de Edgard Scandurra, em grande forma, autor de todas as faixas”, resumiu a revista “Veja”, na resenha do disco, publicada em 1990.
Mesmo tendo tamanha relevância ao rock brasileiro, Nasi mantém o espírito contestatório da juventude. “A gente não precisa tocar no ‘Caldeirão do Huck’. Não precisa, entendeu? Não precisa mais estar bombando nas redes de FMs comerciais. Somos o que somos. E somos admirados por isso.” Pois é, os garotos sempre irão achá-los, não importa onde estiverem, pois o barulho de uma guitarra ainda é capaz de tirar o sono daqueles que devem.
Ira em Gyn
Quinta-feira, 19
A partir das 19h
Pra C-232, próximo ao Ginásio de Esportes do Jardim América, na AV T-9
Entrada Franca