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Obituário

John Mayall capitaneou boom do blues elétrico nos anos 60

Fundador dos Bluesbreakers (banda essencial do blues britânico), músico teve auge criativo entre 65 e 69, período em que tocara com estrelas da música

Saúde impediu nos últimos anos John Mayall de seguir se apresentando ao vivo - Foto: Divulgação Saúde impediu nos últimos anos John Mayall de seguir se apresentando ao vivo - Foto: Divulgação

Foi-se a lenda, o mestre — se é que as lendas e os mestres se vão algum dia. John Mayall, o pai do blues britânico que colocou no mundo roqueiro durante os anos 60 uma porção de gênios, morreu aos 90 anos em sua casa na Califórnia, nos Estados Unidos. A notícia foi confirmada pela família do músico em comunicado divulgado nas redes sociais.

Conforme o texto, a fragilidade física levou Mayall a abandonar os palcos, em 2022. “Os problemas de saúde que forçaram John a encerrar sua épica carreira em turnês finalmente levaram a paz para um dos maiores guerreiros da estrada do mundo. John Mayall nos deu noventa anos de esforços incansáveis ​​para educar, inspirar e entreter”, diz informe.

Para Mayall, o blues era uma “honestidade crua” com a qual manifestamos nossas experiências de vida. Tocava piano, órgão, violão, gaita e guitarra. Embora exibisse nas bandas que fundara um canto situado na região tenor, ganhou reputação como “o padrinho do blues britânico” por outro motivo: simplesmente escolhia como ninguém guitarristas.

Mayall veio ao mundo em Macclesfield, Inglaterra, em 29 de novembro de 33. O pai, Murray, tocava violão em pubs e colecionava discos. A mãe, Beryl, tal qual old man, apoiava o interesse do filho pela música, porém o jovem tratou de formar-se designer gráfico no Manchester College of Art. E ainda serviu na Coreia, onde compraria primeira guitarra.

Logo, Mayall não era novo quando decidiu chutar tudo pro alto: tinha 30 anos. Mudou-se, então, para Londres. Na capital inglesa, conheceu o músico Alexis Korner, já figurinha carimbada no metiê blueseiro da cidade, e Cyril Davis, que não viveu para curtir a glória do reconhecimento, pois viria a morrer aos 32 anos, em 1964, em decorrência de endocardite.

Só que os shows, nesse início, costumavam ter poucas pessoas. No máximo, umas duas ou três dezenas. A partir de 66, todavia, a coisa começou a ganhar nova forma, com músicos, jornalistas e fãs percebendo a qualidade do disco “Blues Breakers”, gravado com a guitarra acelerada mas sentimental de Clapton. Mayall, agora, tinha agenda nos EUA e Europa.

Na Europa, no entanto – não apenas na Inglaterra –, o blues começou a ser ouvido por um público que não os escutava na América John Mayall, músico

“A cena na América era racialmente segregada – por lá, os dois nunca se encontrariam”, disse o músico ao jornal inglês “The Guardian”, em 2014. “Na Europa, no entanto – e não apenas na Inglaterra –, o blues começou a ser ouvido por um público que não os escutava na América. Descobrimos Elmore James, Freddie King e JB Lenoir. Eles falaram sobre nossos sentimentos, nossas histórias de vida e foi isso. Acabamos fisgados por isso.”

Entre 65 e 69, tocou com Eric Clapton, um dos maiores da história. Em 66, Clapton deixou os Bluesbreakers para formar o Cream. Conheceu ali o baixista Jack Bruce. Outro com passagem pela banda é Peter Green e, assim como Clapton e Bruce, saiu de lá para fundar seu grupo, o Fleetwood Mac. Mick Taylor, por sua vez, ficou até ser arrancado pelos Stones.

Clapton afirma que tocar nos Bluesbreakers era uma escola musical exigente. Ele se juntou a Mayall após se descontentar com os rumos artísticos adotados pela direção do Yardbirds, supergrupo de blues britânico popular nos anos 60. “Eu ficava sentado nesta sala ouvindo discos e tocando junto com eles, aprimorando minha arte”, diz, em sua autobiografia.

Quando o disco “John Mayall´s Blues Breakers With Eric Clapton” saiu, em 66, apareceram por Londres pichações dizendo que Clapton era “Deus”. No estúdio, o baixista John McVie e o baterista Hughie Flint queriam reproduzir a energia fibrilante que a banda imprimia ao vivo. Esse alto impacto sonoro se ouve logo na primeira faixa do elepê, “All Your Love”.

A guitarra de Clapton sussurra frases dissonantes na sensualíssima versão para canção de Otis Rush. Tocado por Mayall, o Hammond derrama pelas notas timbre excitante. O arranjo é copiado por centenas de bandas mundo afora — até hoje. Alucinante e agressivo, esse som ainda se manifestaria nas próximas releituras, que envolvem criações de Robert Johnson, Freddie King e Ray Charles — santíssima trindade da música afro-americana.

Deixaria a cena bluesy britânica de queixo caído com “A Hard Road”, com Peter Green na guitarra, e “The Diary of a Band”, álbum duplo gravado ao vivo na Europa. Mick Taylor assume os riffs e solos dos Bluesbreakers. Logo depois, contudo, Mick Jagger e Keith Richards o convidam para integrar os Rolling Stones, dando início ao auge do grupo.


		John Mayall capitaneou boom do blues elétrico nos anos 60
Mayall rompeu barreiras da música nos anos 70. Foto: Divulgação

Nos anos 70, Mayall rompeu barreiras musicais. Voltou-se ao jazz-fusion com o experimental “Jazz Blues Fusion”, publicado em 72. “O final dos anos 70 e o início dos anos 80 foram uma época muito difícil, não apenas para mim, mas para muitos músicos de blues que conseguiram contratos de gravação”, disse, em entrevista. Ainda assim, entre 75 e 79, lançou nove discos — e reformulou os Bluesbreakers para mais uma turnê mundial.

Ao todo, o artista colocou nas lojas 70 discos. O mais recente deles é “ The Sun Is Shining Down”, de 2022, com a mesma sonoridade expressiva que o consagrou nos anos 60. John Mayall jamais abandonou o blues. Vez ou outra, nos últimos anos, o velho camarada Eric Clapton se juntava a ele — lembrando daqueles tempos em que todos eram uma família.

“Todos nós sentíamos que fazíamos parte da mesma família e que realmente estávamos nos conectando com pessoas, uma nova geração de pessoas, e também nos divertindo muito tocando. Você simplesmente tocava continuamente; não valia a pena voltar para casa”, conta o artista, sobre a cena londrina de blues. Mayall foi introduzido no Hall da Fama do Blues, em 2016, e depois o puseram no Hall da Fama do Rock and Roll.

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