Cultura

Leoni: “Não acho que o compositor tenha muitos desafios”

DM Redação

Publicado em 29 de abril de 2025 às 17:21 | Atualizado há 4 horas

Leoni, 64, anuncia novo trabalho fonográfico para o próximo mês de junho - Foto: Divulgação
Leoni, 64, anuncia novo trabalho fonográfico para o próximo mês de junho - Foto: Divulgação

Por Marcus Vinícius Beck

Como noite e dia se completam, o hitmaker Leoni manda ver seus sucessos em Pirenópolis, neste sábado, 3, num show que deve começar por volta das 23h. Ele se apresenta no Luau Piri, cuja estrutura será erguida próxima à ponte de madeira vermelha, no Centro Histórico. 

O cantor e compositor afirma ao repórter que se mexe “muito” nos shows. De fato, vai pra lá e pra cá, muda arranjos, troca canções, imagina um conceito que costure o repertório, como um fio conectando dois pontos distantes. Afinal, são quatro décadas na estrada.

“É sempre uma ótima oportunidade de mostrar para o público o que está me interessando naquele momento, além de ser uma chance de me desafiar, de aprender, de melhorar como artista de palco. Essa busca, para mim, é incessante e me deixa realmente feliz”, revela. 

Horas antes, a Blitz, companheira de geração, abre a noite de sábado. Na sexta-feira, todavia, o cantor Paulo Ricardo traz ao Luau Piri sucessos que explodiram nos anos 1980, quando o cantor esteve à frente do RPM. O grupo, aliás, é representante do synthpop no Brasil. 

Três artistas, três shows — e dezenas de hits. Em seu concerto, Leoni está acompanhado pela banda Outro Futuro, formada pelo filho Antonio Leoni (guitarra, teclado e vocais), Calor Mathias (baixo e vocais), Gustavo Corsi (guitarra) e Lourenço Monteiro (bateria e vocais).

Ao escrever a orelha do livro “Letra, Música e Outras Conversas” (Corsário-Satã), Caetano Veloso afirmara, em 2021, que Leoni se sagrara artista brilhante do BRock. Para o baiano, as composições eram boas a ponto de revelar “observador sereno e lúcido” do que acontecia. 

Ou seja, para Caetano, o carioca se mostra nome fundamental daquele período em que o rock deu um cavalo de pau na MPB. Sim, não havia mais aquela sensação de continuidade, muito menos a dita linha evolutiva do cancioneiro brasileiro se mostrando em novos-velhos artistas, ou coisa do tipo. Então, você pensa, encontra-se aí um certo desapego às tradições.

Arguto e sutil, Leoni explica que o rock, salvo raras exceções, foi sempre música ligada ao hedonismo, à libertação individual e, em certa medida, à transgressão comportamental. “Não é por acaso que se trata de um estilo criado e exportado pelos EUA e pela Inglaterra”, elucida o ex-Kid Abelha, autor de hits como “Pintura Íntima” e “Como Eu Quero”.

“Durante o período da ditadura militar, estávamos todos do mesmo lado no Brasil, mas, com a democratização, apareceu uma pluralidade de posicionamentos políticos, desde uma postura mais à direita – como a do Roger –, até posicionamentos mais francamente de esquerda – como o meu”, diz o artista, que se desencantou com a luta política nas redes.

Ainda assim, Leoni acha que a saída para a classe trabalhadora vem da mobilização coletiva. Sobre o rock brasileiro, afirma que a maioria de sua geração se situa num campo liberal que, entre a direita e a esquerda, se associa à primeira em momentos eleitorais. Já nos EUA, compara, o rock tem grande massa de seguidores numa classe média conservadora.

Há de se ressaltar, aqui e ali, bandas de viés progressista — caso sobretudo do The Clash. Leoni, inclusive, formou seu primeiro grupo quando o Clash e seu punk rock explodiam mundo afora, nos anos 1970. Só que, nesse período, ao contrário do que rolava lá fora, ainda imperava no Brasil o rock progressivo hermético de Yes e Emerson, Lake & Palmer. 

Entre as dezenas de grupos enlouquecidos por essa música pretensiosa, estava o carioca Chrisma, do qual Leoni era integrante. Algum tempo depois, já estudante de Letras na PUC, juntou-se ao saxofonista George Israel, acadêmico de Engenharia na mesma instituição. Paula Toller foi a um ensaio, se arriscou a cantarolar e, de repente, se agregou à banda. 

Além de baixista

Indo além da condição de baixista, Leoni assina todas as canções dos elepês “Seu Espião”, de 1984, e “Educação Sentimental”, lançado em 1985. No ano seguinte, já fora do Kid Abelha após confusão e desentendimentos generalizados, o músico saiu da banda da qual fora fundador. Passaria, então, a comandar o Heróis da Resistência e gravaria três discos. 

Nessa época, o produtor Ezequiel Neves costurou parceria entre Leoni e seu pupilo Cazuza, que lançava seu primeiro disco solo, “Exagerado”, e precisava de um single para chamar atenção do público. “O Zeca me chamava de hitmaker, por isso, achou que eu seria o parceiro ideal nesse caso”, lembra o compositor, acrescentando que os recebeu em sua casa. 

“Ele e Cazuza foram na minha casa com um poema longo que tive que editar para que se transformasse em letra de música. No livro recentemente lançado dos poemas e letras do Cazuza [“Meu Lance é Poesia”], dá para conferir as duas versões de ‘Exagerado’.” A canção, um rock exageradamente irresistível, é o maior sucesso de Cazuza nas plataformas digitais. 

Além de Cazuza, Leoni tem músicas com Frejat, Herbert Vianna, Marcos Valle, Xande de Pilares, Zeca Baleiro e Zélia Duncan, com quem fez “Quem nos Dera”. Desde novembro do ano passado, tem lançado singles, que serão reunidos num EP nomeado “Baladas Sortidas”, com previsão de sair em junho. Esse trabalho conta com produção de Antonio Leoni. 

O artista não vê, porém, muitos desafios no ofício de compositor. “Não acho que o compositor tenha muitos desafios. Acho que o maior problema é para os artistas. A concorrência é imensa. Hoje lança-se, por dia, mais músicas do que se lançava, por ano, na década de 1980. Como chamar a atenção do público com tal avalanche de lançamentos?”.

Para o artista, “o tal do algoritmo” atenderia ao interesse das big techs. “Quem deseja ter alguma visibilidade tem que lançar cada vez mais canções, cada vez menores. Essa obrigação não tem nada a ver com o tempo da criação e da maturação da arte. Mas se você não leva essas ‘leis’ em consideração, é punido com o ‘esquecimento’ por parte do algoritmo. E eu nem falei da forma indecente com que os artistas são remunerados pelas plataformas.”


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