Após retomar aos últimos anos da vida do revolucionário Leon Trotsky em “O Homem Que Amava Os Cachorros” (2015, Boitempo), o escritor Leonardo Padura decidiu celebrar a cultura cubana em seu mais novo livro. Lançado neste mês pela Boitempo, “Água Por Todos Os Lados” (já disponível para venda) mostra ao leitor inspirações que sempre marcaram sua vida, como literatura, beisebol, cultura local e, em geral, a terra onde nasceu e cresceu. “Sou um escritor cubano que vive e escreve em Cuba porque não posso e não quero ser outra coisa, porque (e sempre posso dizer que apesar dos mais diversos pesares) preciso de Cuba para viver e escrever”, diz Padura.
Mesmo sendo um dos nomes mais importantes da literatura da latino-americana e um cara que nunca deixou de tornar público sua devoção pelo país natal, Padura jamais se furtou em criticar as intempéries do regime que impera na ilha caribenha desde 1959, quando os rebeldes capitaneados por Fidel Castro derrubaram a dinastia de Fulgêncio Batista. Diante dessa relação, então, convém perguntar: Mas o que tem em Cuba, o que é Cuba? Simples, veja o que escreve Padura: “Quando me fazem essas perguntas costumo repetir que Cuba é um país maior que a geografia da ilha”.
Em “Água Por Todos Os Lados” somos apresentados a um lado pessoal do processo criativo do escritor, relatando locais e tramas onde seus personagens ganham vida e onde certas descrições (especialmente aquelas que povoam “O Romance da Minha Vida”, obra também publicada pela Boitempo) de fato se passaram. E ali, bem ali, a um palmo de nossa cara, à medida que vamos folheando as páginas, seus instrumentos de trabalho e o que lhe inspira saltam à vista, alimentando nossos corações com o poder da arte literária impressa com as tintas da lembrança.
Estamos, convenhamos, cara a cara com um relato sobre a maneira com que o escritor transforma em material aquilo que a princípio se mostra só um ponto de luz em sua cabeça. Por isso, “Água Por Todos Os Lados” ora é meio ensaio, ora é meio literatura, mas é saboroso. “Talvez meu caso seja excessivamente exemplar quanto a essa defesa da permanência, porque milito, aos sessenta anos, na rara espécie de indivíduo moderno que ainda mora onde nasceu, em um bairro da periferia havanesa, o mesmo bairro de Havana em que nasceram meu pai, meu avô e meu bisavô”, anota.
Além de suas memórias ancestrais, o escritor fala sobre um dos pontos que mais estampam capas de revistas de turismo. “O Malecón de Havana é um parapeito de blocos de cimento e concreto armado que corre pela margem norte da cidade, de frente para a corrente quente do golfo do México, e estende sua sólida estrutura desde os territórios da baía protetora, onde se fundou a vila, em 1519, até o fim do outrora aristocrático bairro El Vedado, a oeste, justamente onde a cidade terminava quando nasceu o século XX e se iniciou a construção da barreira marinha”.
Lá pelas tantas, Padura diz que "um escritor é um armazém de memórias". Por quê? “Escreve-se vasculhando as próprias memórias e as memórias alheias, adquiridas pelas mais diversas estratégias de apropriação”, disserta. Para além dessas teorizações sobre o ofício da escrita, o cubano envereda ainda pelos últimos anos de Ramón Mercader, assassino de Leon Trotsky. “Ramón Mercader vivia em Cuba em condições de anonimato”. Como se percebe, “Água Por Todos Os Lados” – além de ser um grito de amor por Cuba – é um passeio por episódios que foram divisores de água no século 20. Padura, de fato, reforça o vínculo de pertencimento ao seu país.
Ficha Técnica
‘Água Por Todos Os Lados’
Autor: Leonardo Padura
Gênero: Não-ficção
Editora: Boitempo
Pág: 292
Preço: R$ 57,00