William tRAPo se transformou quando um primo lhe apresentara Racionais MC´s nos anos 90. “Abriu minha cabeça e daí nela começou a brotar e circular muita coisa”, afirma o poeta, na epígrafe da obra “Temporais”, título que lança hoje no Espaço Rensga (Rua 72, 672).
William assume um compromisso: criar poesia anárquica. Um leitor atento identifica, ou é tentado a isso, certa semelhança com Chacal, Jorge Salomão e Allen Ginsberg. Nasceu das ruas, infiltrou-se nos espaços e ocupou brechas – me atrevo a dizer que é o mais importante.
Em termos estéticos, é poesia contemporânea – como se observa pelos autores citados –, mas também se deixa influenciar pela urgência discursiva do rap e pelos rabiscos democráticos da arte urbana, inspirando sentimentos e condições capazes de produzir reflexões sobre a vida em sociedade e os dilemas do capitalismo. A poesia – antes de tudo – deve afrontar.
“Capitalismo, catolicismo, eurocentrismo/ ditaduras antiamor/ é foda eu sei”, lamenta. “Mas o mundo continuará uma merda/ nós vivos ou não/ então vem, pula, se joga/ que a gente espalha o amor anarquista onde der/ Vamos ficar pelados no centro histórico de Lisboa”.
Muita coisa urgente está em “Temporais”: racismo, desigualdade social, cidade, afetos e relações humanas estão entre os pilares que amparam a construção das cinco partes que compõem o livro. “A concepção do livro começou em 2018 e passou por um processo de amadurecimento artístico e pessoal”, afirma o autor, em material de divulgação.
Michel Yakini-Iman, escritor, editor e arte-educador, diz que William é grafiteiro. Também faz pixo. E, no entanto, a semelhança de sua poesia com os elementos do hip-hop vai além disso. O autor saca a poesia dos muros e a coloca na página, também traz as letras de tag do muro pro livro, construindo a possibilidade do território”, reflete, no posfácio.
Na perspectiva visual, a dupla William e Grace se esforçou para conceber imagens que se relacionassem com os poemas de maneira independente. Para tanto, embriagaram-se nas fontes ancestrais e contemporâneas. Referenciaram, por exemplo, a estética da pichação e os adinkras, bem como o conjunto de símbolos criados na África Ocidental.
Co-fundador do coletivo Zé Ninguém, William tRAPo é lido. Ou, se for caso, ouvido. “Temporais” sai a 40,00 (livro + encartes).
TEMPORAIS
William tRAPo
Dia 6, quinta-feira
19 horas
Espaço Rensga,
Rua 72, 672, Centro, Goiânia
R$ 40,00