Por Mateus Fagundes e Guilherme Bianchini
O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, avaliou que o mercado financeiro no Brasil passou a ser menos receoso em caso de mudança de governo como resultado da eleição de outubro. A declaração foi dada ao programa "GloboNews Míriam Leitão", gravado na tarde desta segunda-feira, 14, e exibido no final da noite.
O comentário foi feito em resposta a uma pergunta da jornalista sobre o favoritismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na corrida eleitoral para o Planalto.
"Nos preços de mercado, o que tem acontecido mais recentemente é uma eliminação de vários preços que mostram o risco da passagem de um governo para outro. Mais recentemente, a gente vê, quando olha esses preços, que eles atenuaram. Caíram um pouco. Significa que o mercado passou a ser menos receoso da passagem de um governo para o outro", afirmou. "Isso é o que a gente pode interpretar. Porque provavelmente um governo que representava um risco de cauda de medidas mais extremas está se movendo para o centro. Essa é a nossa interpretação do que a gente captura nos preços de mercado."
Campos Neto ponderou, contudo, que "muitas coisas vão acontecer ao longo do ano eleitoral" e que a autarquia está preparada para um eventual cenário de volatilidade nos ativos brasileiros em razão desse processo. "Faz parte do BC discutir isso", disse.
O presidente do BC comentou ainda que, a despeito das incertezas eleitorais, há recursos estrangeiros entrando no Brasil e que, por isso, o real tem hoje a melhor performance no cômputo em 12 meses.
Ao comentar sobre a autonomia do BC, Campos Neto reforçou que foi um ganho da atual gestão do País que perdurará pelos próximos governos. "O Banco Central ganhou a posição de autonomia exatamente para ter independência entre o ciclo político e os ciclos de política monetária. Não cabe fazer comentários sobre o que seria cada candidato (à Presidência)", afirmou. "É importante reconhecer que foi feito ganho institucional neste governo."
Campos Neto afirmou também que ficará até o fim do mandato de presidente do BC, que vai até 31 de dezembro de 2024.
Combustíveis
O presidente do Banco Central reforçou a mensagem da autarquia de que uma proposta que baixe os impostos de combustíveis sem contrapartida arrecadatória pode levar a uma piora do cenário estrutural, mesmo tendo um efeito de curto prazo de baixa da inflação.
"Algumas pessoas estavam aventando a hipótese de que o Banco Central pode se comportar diferente porque vai ter uma PEC que vai fazer o preço da gasolina cair no curto prazo", disse. "Não, não é assim. Nós olhamos muito mais o cenário estrutural do que o de curto prazo (...) Então o que a gente quis dizer é nestes movimentos de quedas de preço de curto prazo por incentivo fiscal, quando a gente pega todas as variáveis, tudo que entra como fator determinante, a gente quis dizer que na média isso piora o cenário da inflação estruturalmente falando." A declaração reforça o teor da ata do Copom.
Combate à inflação
O presidente do BC reforçou que o combate à inflação é a principal missão da autarquia e que a política monetária restritiva é o melhor caminho para atingir esse objetivo. "Se a inflação sai do controle e desancora, todo o resto das variáveis macroeconômicas se desorganizam muito rápido. E como o Brasil tem uma memória inflacionária muito viva, a desorganização é muito mais acelerada", afirmou. "Entendemos que tem uma janela de atuação (contra inflação), e vamos atuar. Temos adotado uma linguagem forte nesse sentido. Entendemos que o instrumento que nós temos é eficiente e vamos usá-lo."
Campos Neto atribuiu parte do momento atual ao cenário de forte injeção global de recursos como reação à pandemia. Na ocasião, esperava-se uma grande depressão, mas o que veio foi uma recessão. Dessa forma, segundo o presidente do BC, a política monetária frouxa causou um consumo de bens muito maior que o esperado, elevou a pressão sobre a demanda por energia em meio a um cenário de transição verde e pressionou a inflação.
"No Brasil, identificamos que (a inflação) era um problema muito mais de demanda que de oferta. Atuamos da forma mais rápida possível. Quando olhamos hoje o que precisa para combater a inflação, precisa ter uma taxa de juros restritiva", disse. "Quando a gente estima a taxa de juros neutra em vários países e vê o que o Brasil e os outros fizeram até agora, obviamente o Brasil está em campo mais restritivo, o que significa que largou na frente nesse processo."
Investidores e crescimento
O temor sobre o equilíbrio fiscal de longo prazo está associado a dúvidas dos investidores sobre o poder de crescimento do Brasil no longo prazo, disse Campos Neto no programa "GloboNews Miriam Leitão".
"A pergunta que precisa ser respondida é como fazer o Brasil voltar a crescer estruturalmente. O crescimento vem de investimento, que está ligado à própria percepção do crescimento", analisou Campos Neto. "O País precisa de um programa que convença investidores de que vai levar o Brasil de volta ao crescimento. Esse é o fator fundamental, e é isso que está por trás da ansiedade em relação ao equilíbrio fiscal de longo prazo."
Segundo Campos Neto, os investidores esperavam, no passado, que o crescimento estrutural do Brasil seria muito maior do que é hoje. "Curiosamente, lá atrás, parte das razões identificadas como detratoras do crescimento tem sido endereçadas nos últimos anos, como Previdência, volume de crédito subsidiado, reforma trabalhista e parte muito importante do Saneamento."
Meio ambiente
Na entrevista ao programa "GloboNews Míriam Leitão", Roberto Campos Neto, exaltou a agenda da autarquia na área ambiental. Na avaliação dele, o conjunto de medidas está na vanguarda do que está sendo feito no mundo.
"A gente tem feito uma agenda verde que tem sido inclusive premiada. A gente tem olhado para o financiamento sustentável a partir dos balanços dos bancos", disse. "Queremos fazer um mercado de carbono no Brasil. A gente acha que o Brasil precisa ter uma taxonomia brasileira, que é um conjunto de regras. E a gente acha que a gente pode contribuir muito na precificação desses ativos climáticos e que o Brasil tem muito a ganhar com isso."
Pix
Sobre os recentes vazamentos do Pix, Campos Neto disse que o BC optou por uma linha de "transparência total" dos problemas. "Então vamos avisar sempre que tiver qualquer tipo de vazamento, mesmo que o vazamento seja pequeno e q os dados não sejam relevantes", afirmou. "Não queremos banalizar vazamento de dados, vamos aperfeiçoar o sistema para que não haja vazamentos".
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