
Nos últimos dias, os preços de energia no mercado livre registraram um aumento expressivo, impulsionado pela previsão de chuvas abaixo da média em várias regiões do Brasil. Esse cenário tem diminuído o otimismo sobre as condições hidrológicas e, caso persista, pode impactar as tarifas cobradas dos consumidores.
Esse movimento ocorre após a energia elétrica ter sido um fator relevante no aumento da inflação de fevereiro, um tema que tem gerado preocupações no governo. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de fevereiro atingiu 1,31%, com a eletricidade subindo 16,8%.
A expectativa de chuvas menores tem afetado diretamente a média semanal do Preço de Liquidação de Diferença (PLD). Na região Sul, o preço aumentou quase seis vezes, passando de R$ 58,6 por megawatt-hora (MWh) no início do ano para R$ 343,24 na semana mais recente, que terminou em 14 de março. No subsistema Sudeste/Centro-Oeste, o valor mais que quintuplicou, de R$ 58,6 para R$ 335,55. Nas regiões Norte e Nordeste, os preços permanecem próximos aos patamares mínimos do ano.
O PLD influencia negociações de curto prazo entre grandes empresas e fornecedoras de energia e, se os preços continuarem elevados, pode refletir em um aumento nas tarifas das contas de luz. O PLD é um indicador essencial para o cálculo da bandeira tarifária, que é definida mensalmente pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Em setembro de 2024, por exemplo, quando o PLD ultrapassou R$ 251 por MWh no Sudeste, foi aplicada a bandeira vermelha patamar 1, o segundo nível mais alto da escala.
Com a expectativa de menos chuvas, o custo de geração de energia fica mais pressionado, elevando o PLD. O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) divulgou um relatório que indica que a previsão para março é de afluências abaixo da média histórica nos subsistemas Sudeste/Centro-Oeste, Sul e Nordeste.
O diretor de Energia Elétrica da Associação dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres (Abrace), Victor Iocca, explicou que, desde o início deste ano, o PLD passou a adotar uma nova metodologia que antecipa cenários mais críticos. “Infelizmente, as chuvas estão vindo muito abaixo das médias históricas. Por mais que os reservatórios estejam bem, o modelo está mais conservador. Então, quando começa a chover pouco, o sistema já se antecipa e o preço sobe”, afirmou.
De acordo com Iocca, o aumento do PLD torna o custo de operação mais alto, principalmente com o acionamento das termelétricas. “Em vez de ligar o parque termelétrico lá na frente, é mais eficiente ligá-lo agora, mesmo com a previsão de chuvas fracas”, disse.
O Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), formado por representantes do Ministério de Minas e Energia, da Aneel e de outros órgãos, afirmou que, no cenário mais otimista, março de 2025 será o 13º pior março em termos de condições de afluência. No cenário mais grave, será o 3º pior. Além disso, há previsão de queda da energia natural afluente em três das quatro regiões do país até abril de 2025.
“O CMSE, na sua competência legal, continuará monitorando, de forma permanente, as condições de abastecimento e o atendimento ao mercado de energia elétrica do país, adotando as medidas necessárias para a garantia do suprimento de energia elétrica”, afirmou o comitê em nota sobre a reunião.
Marcelo Sá, analista de energia do Itaú BBA, destacou que as chuvas em março estão abaixo da média em todos os sistemas, exceto na região Norte, onde as chuvas têm mantido os reservatórios cheios, especialmente na região do Xingu. Ele também lembrou que a demanda de energia deve crescer 3,5% em 2025 em comparação com o ano anterior. “As projeções para os níveis dos reservatórios do Sistema Interligado Nacional (SIN) se deterioraram em cerca de 10 pontos percentuais”, afirmou Sá.
O diretor de operação do ONS, Christiano Vieira, havia declarado, há cerca de dois meses, que o quadro para 2025 seria positivo se as chuvas se estendessem até meados de abril. Na época, ele destacou que as condições de geração estavam iniciando o ano de forma favorável, embora não descartasse reavaliações. “Isso é acompanhado mês a mês, e devemos estar preparados para situações críticas”, disse.
Uma das razões para amenizar as preocupações é que o início do ano foi marcado por chuvas intensas nas regiões dos reservatórios. De acordo com o ONS e a CCEE, o Sistema Interligado Nacional apresenta atualmente um armazenamento correspondente a 70% do total disponível. No entanto, as projeções meteorológicas indicam que março poderá ter afluências de água inferiores a 60% da média histórica nas usinas da região Sudeste/Centro-Oeste. “Diante desse cenário, os modelos computacionais usados pelas organizações buscam poupar os níveis dos reservatórios, o que resulta em preços mais elevados”, afirmam.
O impacto da variação no custo da energia tem sido uma preocupação constante para o governo. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, já havia solicitado ao longo do ano passado que a Aneel mantivesse a bandeira tarifária verde, sem cobranças extras, devido aos impactos sobre a inflação. Neste ano, o governo também planeja repassar recursos da Itaipu Binacional para conter os custos da energia e criar uma conta de reserva para o amortecimento das tarifas.