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Valdivino de Oliveira “Essa reforma é um tiro no escuro”

Auditor fiscal aposentado da Prefeitura de Goiânia e professor universitário, o ex-secretário estadual da Fazenda de Goiás

Valdivino de Oliveira: reforma tributária não pode trazer prejuízos aos estados e municípios Valdivino de Oliveira: reforma tributária não pode trazer prejuízos aos estados e municípios

Muita estimativa e pouca simulação. Este é o problema inicial apontado pelo economista Valdivino de Oliveira, em relação à reforma tributária, que foi aprovada pela Câmara dos Deputados e está em tramitação no Senado, em Brasília. “Tudo é estimativa, neste projeto. Não tem simulação. Isso é um tiro no escuro”, aponta o ex-secretário da Fazenda de Goiás e Distrito Federal, Valdivino de Oliveira.

Na opinião do economista, a proposta amplia as desigualdades e vai concentrar os impostos nas regiões Sul e Sudeste, que já são as mais desenvolvidas. “Tirando a autonomia de estados e municípios, coloca ainda o pacto federativo em xeque”.

Mais ricos

Segundo Valdivino, as populosas regiões Sul e Sudeste concentram metade da população brasileira e cerca de 70% do PIB nacional. “Com alíquota única e a cobrança no destino, o imposto fica onde o produto é consumido”, lembra.

O economista cita uma conversa que teve com um grande empresário de Goiás, recentemente. A empresa, que estava no centro da conversa, vende apenas 16% da sua produção na Região Centro-Oeste. Com o imposto cobrado na ponta, essa empresa vai concentrar a produção em outras plantas, mais próximas do mercado consumidor. “Pra que gastar mais com frete, por exemplo? Vai reduzir a produção aqui e, reduzindo a produção, reduz também o número de empregos por aqui”, sinaliza.

Neste caso, a conta acaba fechando, na visão de Valdivino, em favor dos mais ricos. Quem consome mais, vai arrecadar mais, quebrando um ciclo de crescimento vivido pelo Norte, Nordeste e Centro-Oeste, já que acabam os incentivos fiscais. Aliás, este é o motivo de quebra da resistência histórica que São Paulo e Rio de Janeiro demonstraram em relação à reforma. “Uma empresa só tem interesse em produzir em Goiás se tiver preço competitivo, obtido através dos incentivos fiscais”, lembra Valdivino.

No prejuízo

A perspectiva com a proposta não é nada animadora para Goiás, na análise do economista. Ele lembra que, de 2000 a 2020, a participação do Estado no PIB nacional subiu de 1,8% para 2,9%. Foram os anos em que se consolidaram e se sucederam os programas de incentivos fiscais, apontados como modelo em todo o país, por conseguir organizar cadeias produtivas e atrair investimentos, empregos e renda para o território goiano.

Valdivino ressalta que, historicamente, os incentivos à implantação desses empreendimentos se dão através do financiamento de construções e maquinário, com juros baixos, como os do FCO e do BNDES. E, principalmente, pela redução nos impostos cobrados pelo Estado.

Como a autonomia de Estados e municípios é retirada, não será mais possível a política de alíquotas menores para produtos da cesta básica ou para empresas que mantém contratos de incentivos fiscais.

Mais problemas

Sem a autonomia, Estados e municípios vão depender dos repasses do que é arrecadado pela União. “Não há critério definido para a distribuição dos recursos, que podem ser retidos de acordo com outros fatores”, diz ele.

O comitê gestor dos tributos, previsto na reforma tributária, também não tem regras definidas. “Já se fala em compensação, mas até hoje estados e municípios sofrem com o que perderam com a redução do ICMS e energia”, lembra Valdivino.

Há ainda um verdadeiro exército de auditores fiscais, selecionados e preparados por estados e municípios em todo o país, justamente para garantir que funcione as arrecadações estaduais e municipais. “O que fazer com esses profissionais”, questiona Valdivino.

Mesmo lembrando que a reforma tributária é necessária, Valdivino de Oliveira aponta mais perdas do que ganhos com o modelo proposto. O posicionamento de governadores e prefeitos tem chamado a atenção para esses problemas. Evitar a concentração de tributos, reverter a quebra do pacto federativo e garantir que as regiões mais pobres continuem tendo investimentos incentivados são desafios que devem permear as discussões. Mesmo que avance na Câmara, esse debate deve estar muito maia amadurecido quando chegar ao Senado. A reforma é urgente. Mas a discussão parece estar apenas começando.

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