A arte contemporânea chinesa ganha visibilidade progressiva no ocidente ao longo do novo século, e foi tema do artigo 20 artistas chineses emergentes que você deve conhecer, publicado por Frances Arnold no site Artsy. Dentre os nomes citados, a pintora Xinyi Cheng se destaca com imagens figurativas que ao mesmo tempo evidencia a individualidade e a comunhão através de cores e traços sutis e vibrantes. Ela nasceu em 1989, na cidade de Wuhan, cidade mais populosa do centro da China. Cresceu em Pequim, e no início da década ganhou uma bolsa para estudar nos Estados Unidos. Atualmente, mora em Amsterdã, na Holanda, vem ganhando espaço nas galerias com uma estética recorrente, baseada em cenas que definem a fluidez dos momentos na atualidade.
Cici Wu, colaboradora do site da galeria parisiense Belice Hertling, sede de uma exposição de Xinyi Cheng em julho deste ano, descreve o conteúdo presente nas telas da pintora como um misto de vários sentimentos, todos com materialidade efêmera, e comportamento volátil e ambíguo. “Ela produz pinturas baseadas em amor, confiança, honestidade, comunhão, amizade, sinceridade, intuição, humor, impermanência, ineficiência, brevidade, multiplicidade, falta de jeito, emoções, fertilidade, mal entendido, incerteza, sutileza, harmonia, felicidade, e talvez mais valores que tem sido confundidos com o vento desaparecendo na noite.” Tudo isso ganha forma através de figuras masculinas que nada carregam de heróico.
“Ainda hoje, quando as pessoas me perguntam qual é o tema de minhas pinturas, respondo trata-se de pura fascinação”, conta Xinyi Cheng. No site da Academia Nacional de Belas Artes da Holanda (Rijksakademie), atual local de trabalho da pintora, os homens ilustrados por Cheng ganham um campo de intersecções: “Os objetos são, comumente, homens brancos, barbudos e andróginos, em vários graus de nudez em espaços anônimos, descansando, trocando olhares e, às vezes, encarando o espectador”. Esses homens, extensões dos modelos estudados pela pintora, têm suas maneiras e movimentos analisados por Cheng, que apesar de fantasiá-los de acordo com suas intenções, mantém neles uma emocionalidade ambivalente.
Cici Wu explica a forma como Cheng apropria-se do corpo masculino em suas telas, reproduzindo-os com sensibilidade e valores incomuns. “O céu e a Terra, ying-yang, o universo: o potencial não descoberto das sensibilidades femininas. Quando seu corpo é um dado, o que você pode explorar, ao invés de representar ou permanecer?” O impuro, e as formas adaptadas do ser, fazem parte da essência das obras. “Fremdschämen é uma palavra que descreve o sentimento de sentir-se envergonhado por algo que alguém tenha feito. Ego, tempo e espaço, eles se misturaram com água em nossos corpos. Existem coisas que nunca estiveram em suas formas puras, e talvez nunca haja formas puras para serem percebidas por humanos”, conclui Cici.
THERESA HAK KYUNG CHA
Para imergir o leitor ainda mais nas peculiaridades da obra de Cheg, Cici Wu cita em sua análise um fragmento do livro Dictée, de autoria da escritora americana de origem coreana Theresa Hak Kyung, que ficou conhecida pela maneira visual que conduz sua obra, através de justaposições e referências à mídia e às artes visuais:
“Você vê a cor e a nuance do mesmo jeito que vê o formato da forma, do mesmo jeito que vê o imutável e o inalterado, do mesmo jeito você cheira o filtrado editado através do progresso e da ocidentalização, do mesmo jeito você vê os numerais e inumeráveis colando-se através do mesmo, a fala, o mesmo. Você vê a respiração sem vontade, mas ainda vê a vontade. Desejo e desejo apenas expõem esta terra, este céu, este tempo, estas pessoas.”
“Vocês estão na mesma partícula. Você vai e volta para a concha deixada vazia todo esse tempo. Para reivindicar a recuperação, o espaço. Na boca a ferida, a entrada é reversa, e volta a cada elemento de rítmo da artéria do órgão, implantado, pele sobre pele, membrana, vaso, líquidos, barragens, dutos, canais, pontes.”